um punhado se areia nas mãos diário II de maria joão ruivo

Sabendo embora da humildade e da insignificância das minhas palavras, fica aqui o meu testemunho sobre o Diário II – Um Punhado de Areia nas Mãos – da minha Amiga Professora Maria João Ruivo, com uma referência à homenagem prestada nos 70 anos de vida literária do grande poeta e escritor Eduíno de Jesus que muito estimo e respeito. Foram estas as minhas ” Leituras do Atlântico” desta semana:
Um punhado de areia nas mãos
Na passada segunda-feira, dia 3 de Outubro, na Biblioteca do velho Liceu, hoje Escola Secundária Antero de Quental, e no âmbito de mais uma edição dos Colóquios da Lusofonia que decorreram em São Miguel, foi prestada uma homenagem ao escritor e poeta Eduíno de Jesus, pelos seus 70 anos de actividade literária, cabendo a Vamberto Freitas a apresentação do homenageado, de quem disse: “Eduíno de Jesus é para a minha geração açoriana uma referência profunda, douradora e consequente. Não menciono neste momento os deuses que o precederam ou ainda viveram muitos anos na sua companhia literária. Por certo que não é o único que cultiva os vários géneros da literatura em língua portuguesa. No seu caso particular algo de absolutamente original acontece. Nos últimos anos tem desesperado alguns dos seus colegas e amigos por não trazer cá para fora em livro os escritos críticos e ensaístas que ele cultivou no início da sua carreira, que começa nos Açores e continua em Lisboa nos mais variados jornais e revistas, especialmente a crítica e ensaísmo ssobre as artes diversas que o comoviam e lhe chamavam a atenção, desde as artes plásticas ao teatro e a escrita em geral”.
Na mesma sessão coube-me a honra de dar o meu testemunho sobre o livro de Maria João Ruivo, “Um Punhado de Areia nas Mãos”, ao qual dedico esta edição de Leituras do Atlântico:
Não foi uma apresentação porque isto já tinha sido feito – e bem – pela Professora Leonor Sampaio da Silva, naquele mesmo espaço, no passado dia 8 de Setembro. Quis apenas deixar o meu testemunho pessoal sobre o quanto gostei de mais esta bem sucedida investida de Maria João Ruivo, na escrita diarística. E antes de mais, tenho de confessar que quando a leio, leio sempre mais alguém, ou melhor, tenho sempre mais alguém no meu espírito: Fernando Aires e Eduíno de Jesus que celebramos nas suas 70 primaveras literárias. Fernando Aires, para mim o grande, enorme e inesquecível mestre da literatura diarística nos Açores, a ombrear com o melhor que temos (ou tivemos) no País. E tenho comigo Eduíno de Jesus, o “Patriarca” da Literatura Açoriana. Do alto dos seus 94 Janeiros ele é conto, poema ensaio e teatro. Mas é, acima de tudo, um símbolo ilhéu da universalidade que mora em nós. E Maria João Ruivo é, a par do intimismo dos seus diários, uma alma de poeta que está presente em tudo o que escreve. Aqui, em “Um Punhado de Areia nas Mãos”, a poesia funde-se com a descrição memorial, com a inquietação existencial e com a veia afirmativa do ser e do estar em cada momento diferente de vida. “O mar aqui mesmo ao alcance daminha mão, para regalo do corpo e da alma, com este fundo de rocha tão clara que nem parece basalto… Mais uns palmos e a escuridão abissal da fossa Atlântica”. (7 de Agosto, de 2019).
Este volume II de “Um punhado de Areia nas Mãos”, edição Letras LAVAdas, que abrange entradas que vão desde 2016 até a este ainda corrente 2022, tal como o primeiro, é “um livro intimista que reúne memórias e reflexões que abrangem um longo período de tempo, embora, como a própria autora diz, com largas intermitências, porque a escrita de nós não é pacífica e, a par com o encantamento da descoberta, traz muitas dúvidas e angústias, por isso a adiamos tantas vezes”.
Neste Diário de Maria João Ruivo o leitor sente que há uma presença contínua dos acontecimentos, perfeitamente doseada de emoções e sensações próprias, porque (Maria João dixit, 26 Dezembro 2020) “um Diário é o registo inevitável de tudo quanto nos marca, nos comove, nos afecta, nos irrita ou, simplesmente nos suscita uma reflexão”.
Como com precisão e profundidade escreveu a Professora Rosa Maria Goulart no belíssimo prefácio deste livro, “ a dor e a alegria do mundo pontuam este Diário, porque nas mais comoventes páginas entram registos do que foi acontecendo à sua volta…” E um Diário, como se sabe, é algo de dinâmico e que não se esgota com o tempo.
Maria João Ruivo com estes dois volumes de “Um Punhado de Areia nas Mãos” não é uma continuadora. Ganhou uma identidade muito própria, um estilo muito peculiar e está a trilhar um caminho muito seu, marcado embora por eternos laços de afecto que vamos sentindo nas suas páginas.
Individual e colectivo, regional e universal, intimista e social, são dicotomias que me apaixonam na vida e na Literatura. “Este peso de ser ilhéu, apesar de tudo, ainda nos põe sombras nos olhos, de vez em quando. Não como noutro tempo, certamente, em que só se saía de barco e levava dias até que chegássemos ao destino. Todavia este mar em volta não deixa de oprimir, por vezes, sobretudo nos dias cinzentos da mágoa que envolve a Ilha toda”. A sede do universalismo e ao mesmo tempo o universo a caber na “ilha-toda” aqui bem patente nesta entrada de 29 de Junho de 2019…
Intimista e social também aqui se pode aquilatar pela forma como A mim, porém, há um outro aspecto que me cativa e detém, quando leio Maria João Ruivo. É a forma simples, despida de artifícios literários, como escreve. Um Português cadenciado, ritmado, gramaticalmente perfeito, sem aventureirismos estilísticos, como se a autora quisesse em tudo manter a condição de Professora e Educadora da Língua-Pátria, o que se vai tornando raro em muitos escritores que confundem e misturam irreverência e criatividade, com iconoclastia linguística.
Ler Maria João Ruivo é somar estas três vertentes que Rosa Maria Goulart especifica no prefácio: “beleza da escrita, solidez das ideias, domínio das convenções do género diarístico”. Melhor resumo seria difícil. E isto faz com que eu me repita, dizendo que ao ler este Um punhado de Areia nas Mãos senti a emoção de reviver Fernando Aires, mas senti mais ainda a sensação de que nele há um pássaro que se liberta do ninho e trilha caminhos próprios em voos para o desconhecido.
Multifacetadas são as nossas vivências quotidianas, autênticos caleidoscópios de movimento e cor, de tal modo que no filtro do tempo ficam apenas sombras e ecos daquilo a que chamamos vida.
Felizmente que de “Um Punhado de Areia nas Mãos” conseguimos fazer voar ao vento pedaços de alma e fiapos de amor. Como Maria João Ruivo, de forma tão genuína e bela, aqui consegue. Parabéns!
Santos Narciso
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2 comments
Most relevant

  • Raquel André Machado

    Sublime a sua Explanação, sublime o Diário II – Um Punhado de Areia nas Minhas Mãos.
    Os meus

    Parabéns

    !

    Beijinho