é muita fruta crónica de antónio bulcão

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É muita fruta
Uma notícia da semana passada que me chamou a atenção foi o leilão de uma chamada obra de arte, por seis milhões de euros.
O artista dá pelo nome de Maurizio Cattelan e apelidou de Comedian a sua criação. Trata-se de uma banana, colada com fita cola numa parede. E assim esteve exposta durante cinco anos num museu de Miami.
A minha primeira reacção foi de espanto. Como é possível? Está tudo doido? Mas depois fiquei atento ao resto da notícia. A obra vem acompanhada de certificado e manual de instruções, nomeadamente sobre o modo como deve proceder o novo proprietário da banana quando esta começar a dar sinais de que está a ficar podre. Em tal momento, o felizardo que tem aquilo em casa deve descolar cuidadosamente o fruto da parede e meter lá outra banana, para a obra estar sempre viçosa.
Faz assim todo o sentido o nome dado à obra: Comedian. Rico, apenas com a venda de uma banana, o tal Maurizio deve estar a rebolar-se no chão de tanto rir. E eu também não posso deixar de soltar uma gargalhada, imaginando a banana colada numa parede branca da sala do feliz dono desta chamada arte.
Sobretudo se tiver sentido de humor, mete ao lado uma fotografia do José Cid, nu, com um cacho de bananas a esconder-lhe o membro e o indicador da mão direita a tirar macacos do nariz. É como se dissesse, sem dizer, “como o macaco gosta de banana eu gosto de ti”, num sentido oculto que não será decifrável por todos, não podendo, no entanto, ninguém negar tratar-se de mensagem com enorme profundidade artística.
Desenganem-se, então, os que julgam que me vou pôr para aqui a discutir o que é Arte. Este episódio deu-me foi inspiração, a mim, que quase chumbei nas aulas de trabalhos manuais e que para pintar uma parede é o cabo dos trabalhos. Vou ser artista plástico e ficar rico. Acabou-se a procissão das terças e das sextas para jogar no Euromilhões. Esses euros, a partir de agora, são todos para comprar fruta e fita cola. E já comecei.
Peço perdão ao director deste jornal por fazer publicidade encapotada das minhas primeiras obras, mas acho que vale a pena partilhar as ideias fantásticas que tive, até para que ninguém me imite.
A primeira é um cacho de uva preta dos Biscoitos, devidamente colado na parede, que tem por título “África”.
A segunda é uma melancia, a qual se chama “Guerra”. Aqui já não será tão óbvia a mensagem, pelo que passo a explicar: o verde da casca simboliza o planeta, agora tão dilacerado por guerras em vários lugares; o vermelho é como se fosse o sangue das vítimas; e as pevides somos nós, seres humanos, cuspidos, rejeitados, carbonizados na borda do prato.
A terceira é um figo, e a obra chama-se “Chama-lhe um…”.
A quarta é um melão, e é uma homenagem a todos os sportinguistas, se Viktor Gyokeres sair realmente no mercado de inverno.
A quinta é uma pera, e a obra fica para sempre como Lenine.
A sexta é uma maçã, ao lado da qual escrevi “de Adão”.
E a sétima (sempre gostei de números cabalísticos) é um par de tomates, tendo por título “Fecundidade”.
Espero as vossas encomendas, agradecendo desde já a partilha no Facebook. Ajudem-me a vender a minha arte, por favor. Como estou a começar e ainda não tenho nome nas ilhas, muito menos em Miami, vou praticar preços mais em conta, na ordem dos 999 mil e 99 euros. Pagam só a fruta, a fita cola é um brinde…
António Bulcão
(publicada hoje no Diário Insular)
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