sanitizar língua e literatura o elogio da estupidez

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O ELOGIO DA ESTUPIDEZ
Fragmento do artigo de opinião «Limpar livros de pecados linguísticos, ou o elogio da estupidez», de Maria João Marques. A propósito da hieginização censória dos romances de Roald Dahl e de Ian Fleming, o criador de 007.
«(…) Sou do tempo em que se lia livros para aprender, conhecer vidas diferentes, espreitar a natureza humana, saber de culturas de sítios distantes, atormentarmo-nos com injustiças e prisões (metafóricas) que, pessoalmente, desconhecemos. No fundo, para ver o outro. Tanto assim é que ler ficção é um dos melhores treinos para desenvolver a empatia e o pensamento crítico.
Atualmente, presumo, deve ler-se livros para estupidificar. Os leitores não podem ser confrontados com o que é ofensivo e fora das lentes atuais. Não devem aprender que o mundo nem sempre foi como é agora, as circunstâncias políticas e sociais mudam, e o quadro de valores das comunidades evolui. Estão arredados do princípio fundamental da leitura: um texto é sempre construído, e só assim se percebe, dentro do seu contexto.
Ao invés, promovem-se criaturas que nem na literatura de ficção aguentam realidades ofensivas (mas que boa preparação para a vida). Se há pessoas incapazes de ler os livros como foram escritos, melhor que não os leiam e deixem os livros intactos para quem gosta de os ler. O problema não é a linguagem datada de muitos livros. É a vontade, apresentada em nome do bem, de apagar o que não nos agrada. Se não gostam do conteúdo por ser racista, antissemita, machista, colonialista ou com pecados do catecismo woke, há solução fácil: não comprar e não ler. Todas as livrarias têm oferta de livros sobre auras e anjos e parecidos. Com sorte até estão em promoção.»
Rui Bebiano
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Sobre CHRYS CHRYSTELLO

Chrys Chrystello jornalista, tradutor e presidente da direção da AICL
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