O FACEBOOK E O MAMILO DA ROSINHA

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O FACEBOOK E O MAMILO DA ROSINHA
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Escreve Pedro Tadeu no DN:
O mamilo da Rosinha devia ser permitido?
A propósito de um pequeno trabalho sobre propaganda no Estado Novo no início da guerra colonial (passaram esta semana 60 anos), resolvi contar episódios de alguns antecedentes de promoção pelo poder político do chamado “império português”, entre os quais a famosa Exposição Colonial no Porto, em 1934.
Como se sabe, nessa mostra foi montada a simulação de uma aldeia “indígena”, formada por uma série de palhotas onde foram enfiadas 324 pessoas trazidas de Macau, Goa, Timor, Moçambique, Angola e Guiné. Estas pessoas estiveram quatro meses no Palácio de Cristal como atrações de um autêntico zoo humano, exposto à curiosidade de meio milhão de visitantes.
A maior vedeta desse zoo humano foi a “Rainha das Colónias”, uma jovem da Guiné, eleita a mais bela entre 19 raparigas, a quem chamaram “Rosinha”. Ao ser fotografada em trajes tradicionais, mamas descobertas e pequeno saiote, a jovem motivou uma verdadeira correria ao evento para ver a “pretinha nua”.
No Facebook escrevi um texto alusivo a este assunto, uma incrível ação de educação popular para o racismo e para o imperialismo, e juntei a dita fotografia da “Rosinha”. Quando carreguei no botão “publicar”, saltou-me uma mensagem a dizer que a foto violava o código da rede social.
Não é novidade que o Facebook tem horror a mamilos. Lembro-me dos protestos de 2017 pela censura feita pela empresa de Mark Zuckerberg a uma historiadora que quis publicar a foto da estatueta de uma Vénus do paleolítico ou, ainda antes, salvo erro em 2014, por ter apagado e republicado e voltado a apagar posts com a célebre pintura, de 1486, O Nascimento de Vénus de Boticelli. Mães a amamentar filhos também são fotografias igualmente banidas há anos.
Dada a rapidez da deteção do mamilo da “Rosinha” deduzo que em vez de esperar por denúncias de pessoas escandalizadas, como no princípio fazia, o Facebook decidiu elaborar algoritmos capazes de detetar instantaneamente um mamilo.
Imagino as reuniões do pessoal do Facebook, para decidirem os parâmetros a levar em conta no código informático do algoritmo e as perguntas para as quais foi preciso encontrar resposta: Que tipos de mamilos há? Que cores podem ter os mamilos? Que tamanhos? Os mamilos de homens podem ser publicados? E mamilos que tenham pelos? Há mamilos politicamente corretos? Todos os mamilos são inadmissíveis? Um mamilo revelado por debaixo de uma camisola molhada deve ou não ser proibido? Quantas fotografias de mamilos teremos de introduzir no sistema de inteligência artificial para ele aprender a detetar, antecipadamente, todas as tentativas de publicação de mamilos pelos utilizadores do Facebook?… Enfim, o trabalho deve ter sido árduo.
A proibição de publicação dos mamilos no Facebook quase que me é indiferente a não ser por significar o prelúdio de algo muito mais grave: as sociedades, sejam democráticas ou sejam autoritárias, estão a aceitar pacificamente uma normalização da ética e da moral segundo critérios comerciais, ou seja, segundo raciocínios que favorecem o negócio do Facebook e de outros potentados internéticos.
Essa nova “ética social definida pelo lucro”, dada a penetração massiva, absoluta, que estas redes têm na vida quotidiana das populações, é obviamente legítima do ponto de vista de quem gere o negócio e até pode parecer, à primeira vista, bem intencionada; mas como não obedece a um escrutínio político e, muito menos, democrático, configura um abuso de poder porque obriga toda a gente a aderir a um “pensamento único” se quiser frequentar a rede social.
Este abuso, que na forma de organização atual da sociedade não pode ser impedido, irá escalar. Agora é o mamilo da Rosinha que está proibido, mas nada me garante que, um dia, o algoritmo dos mamilos acabe por proibir toda e qualquer fotografia e todo e qualquer texto sobre a Rosinha por o dono do Facebook achar que prejudica o negócio falar de imperialismo, de colonialismo, de fascismo ou de outro “ismo” qualquer.
Como, ao sedimentarem-se tais critérios nas redes sociais, a própria sociedade, que já não pode abandonar as redes sociais, terá tendência em tornar sua a “ética social definida pelo lucro”, a Rosinha pode até correr o risco de acabar banida dos livros de História… E o mais grave virá a seguir.
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Iracema Clara, Carlos Fino and 15 others
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  • Marxismo cultural é assim…

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    • Nuno Ribeiro

      O Facebook é marxista? Não sabia…

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