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O caso do barracão de cablagem
» (…) O Ministério Público fez uma investigação que aponta para irregularidades cometidas por membros do Governo, e entretanto um juiz considerou que as irregularidades são menos graves do que o MP pensava, ou não existem de todo, e ao mesmo tempo há uma polémica com o governador do Banco de Portugal, que pode ou não ter aceitado ocupar o cargo de primeiro-ministro até às eleições, o que levanta problemas complexos de independência, sem falar do facto de um ministro se ter demitido de um Governo demissionário, o que levanta problemas complexos de lógica.
Mas eu mantenho-me concentrado no seguinte: o que é, ao certo, um data center? Para que serve? Porque é que tem um nome em estrangeiro? Ao que pude apurar, um data center é, em traços gerais, um barracão que alberga uma grande quantidade de cablagem. A cablagem chega de vários pontos do globo, concentra-se no data center, e daí parte para vários outros pontos do globo.
O data center é, por isso, um interposto de transmissão de dados. Um coscuvilheiro cibernético que leva e traz informação. Mas é um barracão que, ao que parece, iria ser decisivo para Portugal. As importantes cablagens ocupariam, na imaginação nacional, o lugar que já foi das caravelas, das especiarias orientais, do ouro brasileiro, do dinheiro da União Europeia e do computador Magalhães.
Por isso, a designação “barracão de cablagens” seria indigna. Mesmo a expressão portuguesa “centro de dados” ficaria aquém, em termos de pompa, da importância do barracão. Por isso, optou-se por “data center”. Creio que ficámos a perder. É improvável que seja preciso contornar leis para construir um barracão.
Mas edificar um data center é uma actividade evidentemente complexa. Os barracões avançam sem dificuldade, como sabemos se dermos um passeio em várias zonas do país. Mas a construção de um data center decorre noutro plano de realidade, em que as coisas têm nomes de prestígio, em inglês, e por isso mesmo torna inevitável o recurso a connections. Creio que foi isso que deu shit.»
[Ricardo Araújo Pereira, “Expresso”, 17/2023]
IMAGES.IMPRESA.PT
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