LEMBREMOS DIAS DE MELO, JÁ LÁ VÃO 12 ANOS

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Fernando A. Pimentel

Faz hoje doze anos que o escritor Dias de Melo nos deixou e que um dia disse:
“Sou escritor. Português – porque sou cidadão do meu País, Portugal. Açoriano – porque sou cidadão dos Açores. Mas, mais restritamente e acima de tudo – sou um escritor do Pico. Da minha Ilha, da minha Terra. E, porque sou Povo – do Povo da minha, da nossa Ilha, da minha, da nossa Terra”
Dias de Melo nasceu na freguesia da Calheta de Nesquim, ilha do Pico a 8 de Abril de 1925 e faleceu na cidade de Ponta Delgada a 24 de Setembro de 2008. Iniciou o seu percurso literário nos anos 50 com um livro de poesia intitulado “Toadas do Mar e da Terra”. No entanto, foi com a sua obra “Pedras Negras” que ganhou maior destaque.
Quem privou mais de perto com ele, refere-o como um homem simples, bom conversador e extremamente culto.

NOTA DO EDITOR DESTE BLOGUE, o que escrevi na sua morte

12.6. DIAS DE MELO[1], CRÓNICA 56, 24 SETEMBRO 2008

pintura de Tomáz Borba Vieira (1974)

 

“a esperança num mundo melhor já não será para mim, talvez não será para nenhum de nós e eu revolto-me com aquilo que vejo à volta de mim” DIAS DE MELO

 

Hoje fiquei mais pobre. Até maio deste ano pouco sabia sobre Dias de Melo, presente como convidado no 3º Encontro Açoriano da Lusofonia juntamente com o amigo Daniel de Sá. Eram os dois representantes da literatura açoriana que quis dar a conhecer. Dias de Melo um operário, um agricultor, um pescador, um escultor que trabalha, ceifa, pesca e esculpe cada palavra, como se fosse um baleeiro do Pico, referência constante como o é Mestre José Faidoca, personagem presente nas histórias que também presenciou como homem do mar, pescador, marinheiro, mestre de lancha. Escreve como se da janela de casa, no Alto da Rocha na Calheta de Nesquim, vigiasse os botes e as lanchas da Calheta, baleando contra os Vilas e os Ribeiras. Andei meses na descoberta da sua obra (que ainda não estudei na totalidade). Foi uma paixão, pois a escrita flui e embrenha-se como o nevoeiro em que os baleeiros se debatiam na luta inglória e injusta para ganharem a vida. Se resumisse o autor a palavra seria Injustiça, a sua denúncia ao abordar a emigração, a vida no Pico, as realidades sociais e económicas, a repressão no Estado Novo, os dramas humanos na linguagem simples dos homens do povo. Dias de Melo ocupa lugar cimeiro e sinto-me extremamente honrado por ter trocado palavras com ele, durante o colóquio e no jantar do primeiro dia. Não o conhecia, mas lendo as obras fica-se com a sensação de o termos conhecido sempre, de pertencer à mesma família. Autor e compositor de música popular, Dias de Melo ficará inexoravelmente conhecido como o escritor da baleação e da condição humana. Coube-lhe a sorte de ter recebido algumas merecidas homenagens públicas nos últimos meses de vida quando viu a 2 de maio 2008 (véspera do Encontro Açoriano) reeditar algumas das suas obras. Cumpre-nos não deixar que a sua memória se esvaneça e porfiar para que os livros sejam lidos pelas novas gerações. Herman Melville na sua epopeia da Moby Dick na qual retrata alguns açorianos, não conseguiu resumir a essência dos baleeiros como Dias de Melo pois este era espetador atento da luta quotidiana. Disso vos trago testemunho com a saudade que a sua morte nos deixa hoje.

 

[1] Do autor: Toadas do Mar e da Terra (1950), “Crónicas do Alto da Rocha do canto da Baía, Das Velas de Lona às Asas de Alumínio” Lisboa, Salamandra. (1991), Aquém e Além-Canal. Lisboa, Salamandra. (1993), A Viagem do Medo Maior. Lisboa, Salamandra. (1994), Memória das gentes 6 vols. (Livro I, três volumes). Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura. (1990), Na Memória das Gentes (Livros II e III, três volumes). Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura. (1992), Cidade cinzenta, Mar Rubro (1958), Pedras Negras (1964 Lisboa, Portugália (3.ª ed., Salamandra, 2003; trad. inglesa, 1988; trad. japonesa, 2005). 4ª ed. VerAçor 2008) , Mar pela Proa (1976 Lisboa, Prelo Editora (2.ª ed., Vega, 1986). (1979), Vinde e Vede. Lisboa, Editorial Ilhas. (1983), Vida Vivida em Terras de Baleeiros. Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura. (1983, 1985), O Menino Deixou de Ser Menino. Lisboa, Salamandra. (1992), Pena Dela Saudades de Mim. Lisboa, Salamandra. (1996), Inverno sem primavera. Lisboa, Salamandra (2.ª ed., 1997).1999, Milhas Contadas. Lisboa, Salamandra. (2004), Poeira do Caminho. Porto, Campo das Letras. “Tempos últimos” , “O muro amarelo”, O Autógrafo. Lisboa, Salamandra. (2002), Poeira do Caminho (2005)