JOSE GABRIEL AVILA FALAR VERDADE

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Falar Verdade
1. A minha previsão e crítica confirmaram-se: a vinda do Chefe do Estado aos Açores foi um fiasco e não atingiu, minimamente, os objetivos políticos da afirmação geoestratégica e ultraperiférica do arquipélago, nem contribuiu para reivindicar do Estado mais apoios financeiros para fazer face aos direitos constitucionais da saúde, educação e mobilidade dos açorianos.
Marcelo usou a sua magistratura de influência para lançar avisos ao Governo e à maioria de direita sobre a alteração às leis da imigração e sobre outros temas da política nacional visando manter espaço nos telejornais nacionais.
Diga-se, em abono da verdade, que também não foi questionado sobre os temas da ordem do dia que preenchem as agendas informativas regionais, nomeadamente: privatização da SATA, subsídio de mobilidade, transportes marítimos, finanças regionais, e utilização da Base das Lajes no conflito Israel-Palestina(Faixa de Gaza).
A programação da visita presidencial, em pré-campanha para as autárquicas, serviu, de bandeja, os intuitos do Governo Regional e da coligação. Provou-se bons vinhos, mas alguém questionou sobre o porquê dos atrasos na atribuição dos apoios financeiros, ou sobre as dificuldades de mão-de-obra dos vitivinicultores picoenses? Alguém abordou a questão da dívida da Região e das eventuais ajudas do Estado para ultrapassar a grave crise financeira? Perguntou-se ao Presidente do Governo quando é dado público conhecimento do estudo sobre a ampliação do Aeroporto do Pico? Ou sobre as questões permanentes dos cuidados de saúde que diariamente os picoenses enfrentam? Ou o que pensa o Presidente da República sobre o despovoamento das ilhas e que pode fazer o Estado, no seu todo, para estancar essa hemorragia?
Seriam esses os temas que os empresários jorgenses pretenderiam colocar a Marcelo se, como estava previsto, ali permanecesse o tempo suficiente para os discutir. Foi esse, certamente, o objetivo da Confraria do Queijo de São Jorge, concedendo ao Primeiro Magistrado da Nação a honra de integrar um organismo que representa um dos produtos, a par de outros, que melhor representam aquela ilha. Mas não.
A crítica foi merecida e deve ser tomada em conta na já anunciada visita de Marcelo às Flores e ao Corvo.
A vinda de Marcelo aos Açores devia ter constituído um momento para afirmar a açorianidade, a identidade e a diversidade cultural de cada uma das nove parcelas atlânticas, e as questões, problemas e dificuldades com que se defrontam. Para que o país e a União Europeia saibam que a ultraperiferia marítima tem vantagens e desvantagens e por isso, merecem especiais atenções e ajudas, devido à sua escassa dimensão.
Transformar o cargo de Presidente num promotor turístico é desvalorizar a função política e constitucional do órgão de soberania e isso desmerece a instituição democrática que todos nos representa.
É de boa-fé e sem acrimónia que emito estas considerações. Tenho a noção de que o destino Arquipélago dos Açores, se valer apenas numa perspetiva meramente turística, poderá transformar-se, facilmente, numa Cuba do Atlântico-Noroeste, com dupla face económica e social. Isso deve acautelar-se, desde já.
2. A população picoense (e refiro-me apenas ao Pico, embora saiba que as ilhas menos populosas padecem de insuficiências semelhantes) está farta de protestar em favor de cuidados de saúde satisfatórios. Este é um tema recorrente em todas as visitas estatutárias e faz parte das conversas do dia-a-dia, pelas mais diversas razões. Ou porque os Centros de saúde não oferecem localmente consultas de especialidade e exames complementares de diagnóstico, ou porque os utentes, em quaisquer circunstâncias e condições, têm de deslocar-se, por sistema, faça bom ou mau tempo, ao Hospital da Horta ou a outro, seja porque os equipamentos existentes não funcionam há meses, contra a vontade e pedidos do pessoal médico e de enfermagem. Seja por falta de especialidades, por dificuldades logísticas e de mobilidade, os utentes não são atendidos devidamente e as distâncias não facilitam um atendimento em tempo útil.
No Pico, morre-se à míngua, já o afirmei e reafirmo-o, novamente, sem receio de errar.
Esta afirmação vai, certamente, gerar controvérsia em setores ligados ao setor. No entanto, bastou-me uma simples queda e uma ferida exposta para comprovar que, de um momento para o outro, na Piedade, o serviço não responde, pelo que tive de fazer 20 kms para ser atendido, eficiente e amavelmente, no Centro de Saúde das Lajes. As suas instalações lembraram-me o Hospital de Carmona, onde tencionávamos que a minha primeira filha nascesse. Entrámos e saímos a sete pés. Mas isto foi em 1975. No CS das Lajes, a receção está num cubículo, outrora destinado ao material de limpeza. As outras instalações são uma adaptação de um edifício escolar que alguns governantes já conhecem, mas nada fazem porque são incompetentes e ineptos para o exercício do cargo. E não percebo porquê, pois a USIP, em 2024, teve um resultado positivo de 1,7 milhões de euros, montante suficiente para melhorar a prestação de cuidados aos utentes.
Tudo isto justifica o mau estado da saúde do Pico. E a panóplia de casos que o confirmam, como o daquela idosa deslocada no Hospital de Ponta Delgada que, após alta, teve de esperar alguns dias, internada, que a SATA lhe disponibilizasse lugar para regressar a casa…
Ao contrário do que afirmou esta semana o titular da Proteção Civil, as contrariedades que todos os picoenses vivenciam e sofrem, não abrangem as ilhas com hospital, pelo que deve-se ser cuidadoso e verdadeiro ao afirmar-se que “Açores são uma das Regiões da Europa com melhor desempenho em emergências médicas”, muito mais tratando-se de uma paragem cardiorrespiratória.
Como não há equipas de socorro na Piedade do Pico, a 56 Kms da Madalena e 20 das Lajes ou de São Roque, a deslocação de uma ambulância demoraria o tempo suficiente para o pior acontecer.
Esses estudos devem ser complementados com informações adequadas às diversas ilhas periféricas marítimas, onde os transportes aéreos e marítimos não estão disponíveis a todo o momento, as estradas são tortuosas e as localidades distantes.
Teria valido que os jornalistas, conhecedores da realidade insular, questionassem o titular da Proteção Civil sobre as imprecisões do estudo, em vez de apresentarem a informação com a vanglória de um feito inusitado…
Nos últimos dias vimos assistindo a uma série de informações políticas laudatórias, típicas do tempo pré-eleitoral.
Estejamos atentos pois algumas são “fake-news”.
Engrade, Pico, 05/08/2025
José Gabriel Ávila
Jornalista, c.p.239 A

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