ananás dos açores

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Só falta darem-lhes nome. Um ananás demora ano e meio até ser fruto
Há sol todo o ano (quando há sol, evidentemente) na Fajã de Baixo. É aqui que se concentram as estufas de ananás dos Açores. A Augusto Arruda, fundada em 1919, dedica-se a mostrar esta cultura, com que os açorianos acudiram ao fim (catastrófico) do ciclo da laranja no final do século XIX. É um museu do ananás.
O portão está aberto e a entrada é livre. O visitante apenas é travado pelo sorriso de um funcionário, que lhe estende um folheto. No papel está o apoio à visita. Aprende-se sobre a história da Augusto Arruda, empresa familiar fundada em 1919, e sobre a cultura deste fruto nos Açores. É seguir o ziguezague das estufas.
Toda a visita está preparada para mostrar cada fase da vida do fruto. Somos guiadas por Nelson Antunes, que vai ajudando a interpretar o que se passa em cada um destes triângulos de vidro e madeira. “É muito laborioso, daí o ananás ser caro”, aponta. Antes do fim da visita já lhe estamos a dar razão.
Começa com a plantação das “tocas”, os bolbos das plantas que já deram fruto. Cada uma há de dar até seis rebentos que serão depois transplantados, com 50 centímetros de intervalo. Esta tropa vai então crescer em conjunto dentro das estufas, regadas pelo sol indireto (coado pelos vidros caiados daí o aspeto esbranquiçado) e pela água que escorre das vidraças e é retida numa cisterna. Toda a monda, bem como a colheita, é manual.
Este ecossistema está instalado na Fajã de Baixo há 104 anos. As estufas alinham-se no terreno, ao lado da belíssima casa da família onde habita uma neta do fundador. Estufa a estufa mostra-se a evolução do ananás, como uma câmara lenta – mas sem qualquer tecnologia. O método de cultivo mantém-se o tradicional: plantar as tocas, transplantar, aguardar pelo crescimento durante ano e meio. E fazer uma operação conhecida como fumo, que consiste em fazer uma queima de folhas de bananeira dentro de baldes na estufa, para obrigar os ananases a florir todos os mesmo tempo.
A A. Arruda faz questão de manter esta estrutura: “é uma homenagem à ingenuidade do açoriano que se tentou desenvencilhar quando a [cultura da] laranja terminou”, diz o guia. E é também uma aposta no turismo feita por um dos visionários insulares: “Augusto Arruda cedo percebeu que os Açores tinham um potencial turístico”. Fundador da SATA ou da Sociedade Terra Nostra, fez por atrair a São Miguel os viajantes que, em meados do século XX, passavam pelo aeroporto de Santa Maria em escalas intercontinentais. Em Santa Maria não havia “nada” para ver. Em São Miguel, para além das lagoas, foi nascendo outra oferta turística.
Atualmente a A. Arruda praticamente não comercializa ananases. Os frutos que aqui crescem, devagar, destinam-se a proporcionar a fruição da sua história. São transformados em produtos como compotas ou licor, vendidos na loja. Na primeira metade do século XX, esta empresa familiar foi um dos maiores exportadores de ananases para o mundo e foi depois da II Guerra Mundial que se virou para o turismo.
O ananás chega aos Açores no final do século XIX graças ao trabalho de José do Canto, nome incontornável quando se fala na agricultura açoriana. Foi este apaixonado pela natureza quem trabalhou na introdução de novas culturas nas ilhas depois do fim do chamado ciclo da laranja, que os Açores exportavam para a Europa e EUA. Uma praga dizimou os laranjais e obrigou a encontrar alternativas. Este terreno agora repleto de estufas, já esteve cheio de laranjeiras no início do século.
Cada ananás demora ano e meio a estar apto para a colheita. Já vamos na terceira estufa quando surgem, pequeninos, alguns ainda com vestígios da flor que acabaram de ser. A seguir, já um pouco maiores. Crescem, devagar. De cada planta sai um fruto, que demora perto de dois anos a ficar apto para consumo. Aqui são bebés, ali jovens. Só falta darem-lhes nome. “Pois é”, acede Nelson.
(Texto: Marina Almeida – Fotos: Ana Baião – Expresso de 21.12.2023)
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