A trumpulência vista por ONÉSIMO TEOTÓNIO ALMEIDA

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A trumpulência vista por ONÉSIMO TEOTÓNIO ALMEIDA, que conhece como ninguém os EUA, onde vive há 50 anos.
QUANDO SE ACORDA E AFINAL O PESADELO ERA REAL
Trump venceu as eleições norte-americanas. Pronto! Ao contrário do que aconteceu quando ele perdeu contra Biden em 2020 e se recusou a aceitar os resultados, muito embora tivesse sido informado pela sua equipa de que fora uma derrota legítima e nada havia a fazer (subsequentemente confirmado pelos tribunais), ele mobilizou as suas forças para a vergonhosa invasão ao Capitólio no insidioso 6 de Janeiro. Os factos estão mais do que estabelecidos nas declarações prestadas no tribunal. Centenas de invasores estão na prisão, todavia o seu chefe escapou, usando a estratégia de apelar indefinidamente para as instâncias superiores e agora acabou reeleito com a possibilidade de se auto-perdoar desse e de todos os outros seus crimes federais.
Mas a transição vai operar-se democraticamente, porque Biden segue as tradicionais regras de jogo e não desce ao nível de Trump. O eleitorado escolheu essa figura que desafia todos os códigos da moralidade e da decência (para muita gente justificado em nome da Bíblia e de Jesus – ao que chegámos!!!) e, portanto, tem agora direito a um mandato de quatro anos, mais imprevisível do que o tempo meteorológico nos Açores.
A situação é absolutamente nova. O Senado é Republicano, o Congresso está a caminho de o ser também. O Supremo Tribunal, que deveria ser apolítico, é maioritariamente Republicano. O Executivo, idem. Não me lembro nunca de alguma vez isso ter acontecido nos EUA (terei de confirmar com os historiadores, mas pelo menos nos últimos 50 anos não me recordo de ter presenciado tal cenário). No entanto, mesmo que tivesse acontecido no passado, nunca os EUA tiveram à cabeça um Presidente que não respeita a Constituição (aliás, um Presidente que não respeita NINGUÉM que discorde com ele) e faz gala disso.
Perguntam-me como antevejo os próximos anos. Não sei. E suponho que ninguém sabe. Trump tem agora carta branca para, na Casa Branca, nadar no pântano escuro e turvo que ele prometeu secar, sem haver possibilidade de intervenção por parte dos poderes paralelos, estabelecidos pelos Founding Fathers a fim de ficar garantido um equilíbrio democrático. Os autores da Constituição Americana nunca previram uma situação destas. Basta ler os seus escritos para que esta afirmação fique justificada.
O perigo de uma ditadura é sério, precisamente por ter agora desaparecido esse tradicional equilíbrio dos Três Poderes, onde o bom senso acabava sempre por triunfar. Um Presidente com um cadastro criminoso registado nos tribunais, um indivíduo que deixou registos gravados de desrespeitar todas as regras que não se coadunam com o seu infantil egoísmo e a sua mais que demonstrada falta de sensibilidade aos problemas do país e do mundo, vai ser capaz de tudo.
Os americanos têm uma expressão: Brace yourselves! Amarrem os cintos de segurança, porque vamos atravessar uma zona de grande turbulência até aqui nunca experimentada.
Em tempos, o Vice-Presidente agora eleito, J. D. Vance, acusou Trump de ser um novo Hitler. Que se cuide e porte-se bem. Trump é famoso por nunca ter sido leal a nenhum dos seus colaboradores (tudo factualmente mais que demonstrado). Acautele-se, porque Trump pode um dia cortar-lhe a cabeça. Mas ao menos no seu caso ele pôs-se a jeito aceitando concorrer com a pessoa que tanto desprezara. O pior é que Trump ameaçou fazer isso a tantos outros que nunca aceitaram cerrar fileiras com ele.
Já não me recordo de qual foi o membro do seu Gabinete, no mandato entre 2016 e 2020, que disse Deus nos salve se este homem volta à Casa Branca! É o que sinto neste momento. E não por ser anti-republicano nem pró-democrata. Apenas porque cresci acreditando numa sociedade moderna criada baseada em princípios democráticos em que o respeito mútuo, mesmo nas discordâncias, era o mínimo dos mínimos requeridos para o funcionamento do todo. Acreditei na América como exemplo do pior dos regimes exceptuados todos os outros (estou a citar Churchil, está visto) e chego ao fim de meio-século de vida americana com este triste desfecho.
O resto do mundo que se prepare. Brace yourselves! Vamos entrar numa zona de grande Trumpulência.
Para um inveterado otimista como eu, só resta esperar. O futuro já não é o que era. Resta-nos esperar que seja melhor do que promete.
Hoje no DIÁRIO DOS AÇORES
(O texto em Word foi-me cedido pelo autor)
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Sobre CHRYS CHRYSTELLO

Chrys Chrystello jornalista, tradutor e presidente da direção da AICL
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