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Açoriano dedica grande parte do seu tempo à arte de trabalhar o ferro em Santa Maria
João Pimentel é natural da ilha Terceira mas, quis a história da sua família e as obrigações profissionais a que estava sujeita, que Santa Maria se tornasse a sua casa, tendo-se mudado para “a ilha do sol” quando contava apenas com alguns meses de idade. Esta transição, conforme conta o artista, músico e técnico de Informação e Comunicações Aeronáuticas (TICA) no Centro de Controlo Oceânico do Aeroporto de Santa Maria, foi motivada pelo facto de os pais iniciarem funções no Aeroporto de Santa Maria, seguindo as pisadas do avô. Aliás, grande parte da sua família tem uma ligação bastante vincada com o mundo da aeronáutica, uma vez que são vários os parentes que trabalham em aeroportos, seja em Santa Maria ou em São Miguel.
Durante a sua infância e juventude, João Pimentel recorda que, quer os seus pais como os seus avós, estiveram ligados a direcções de vários clubes e associações responsáveis pela organização de vários eventos, o que, de certa forma, acabaria por inspirá-lo também a participar activamente em vários projectos, sobretudo ligados à música, tendo sido vocalista de uma banda de rock com temas originais, actividade que iniciou em 1988, e tendo feito também parte da direcção do Festival Internacional Maré de Agosto, realizado anualmente em Santa Maria.
De momento, para além da sua ocupação principal no Aeroporto de Santa Maria, continua a fazer parte de uma banda de covers que se reúne para tocar em bares, e é também o artista por detrás do projecto IRONART, através do qual já criou inúmeras peças de estilo industrial feitas à mão, com recurso a uma máquina de solda, comprometendo-se assim a dar uma nova vida a peças que, de outra forma, acabariam nas sucatas ou seriam derretidas.
Tudo começou no início dos anos 2000, depois de concluir a construção da sua casa, conta, uma vez que havia então a necessidade de decorar os espaços da casa da família: “Como também tenho um fraquinho por arquitectura e decoração, e como a sala tinha ficado grande, optei por fazer umas peças grandes para a decoração e queria algo grande e feito em ferro. Fui falar com amigos meus que trabalham em oficinas de reparação de automóveis, arranjei os ferros, pedi-lhes para os soldarem e fiz algumas peças para a casa”, conta.
À medida que foi recebendo visitas, começou também a receber perguntas relativamente às peças diferentes que tinha em ‘exposição’, o que, por seu turno, despertou a curiosidade de familiares e amigos que o incentivaram a continuar o trabalho, levando assim a que fizesse mais peças para pessoas próximas. Pouco tempo depois, acabaria por investir na sua própria máquina de solda, o que lhe permitiu aprender mais sobre este tipo de trabalhos e que adoptasse a sua garagem como oficina e local de criação destas peças de decoração únicas, feitas com os materiais disponíveis encontrados em sucateiros e que variam conforme os excedentes das oficinas locais e doações de pessoas anónimas que, de alguma forma, desejam colaborar com o projecto.
Seria apenas uma questão de tempo até que João Pimentel começasse a participar em eventos onde poderia expor os seus trabalhos, começando por aceitar o convite estendido pela Câmara Municipal de Vila do Porto, aquando da abertura da biblioteca local, onde pôde colocar alguns artigos em exposição, originando mais encomendas.
Entretanto, participou também na Feira Internacional de Lisboa (FIL), participando ainda numa feira em Setúbal onde os seus artigos fizeram sucesso, evento para o qual fez também os troféus para dois dos prémios que havia para atribuir aos participantes. Nos Açores, participou também em feiras de artesanato, nomeadamente nas Portas do Mar.
No total, feitas as contas, são já 20 anos a trabalhar ferro, habilidade esta que J foi aprimorando com o passar do tempo, começando por fazer “castiçais para velas e artigos mais simples”, sendo depois impulsionado pelos exemplos que encontrava nas suas pesquisas na internet para fazer “as suas próprias versões” de peças mais elaboradas, que podem hoje ser encontradas em todos os tipos de espaços em Santa Maria, desde restaurantes, hotéis, outros espaços dedicados ao comércio e moradias de particulares.
“Tive colegas que me pediram para fazer balcões de venda e armários, bem como secretárias para os seus negócios. Comecei a fazer algumas peças de mobiliário e também os hotéis me pediram para fazer peças para os seus átrios de entrada. Já um hotel, em Vila do Porto, pediu-me para decorar uma ala inteira, o que resultou em cinco suites com o tema da música. Apesar de não ter acabado o projecto como queria, acabei por fazer mesinhas de cabeceira, mesas de café, os encaixes para as toalhas na casa de banho, tudo a partir de instrumentos musicais que se mandou buscar”, explica, referindo que estas peças funcionam como um “cartão-de-visita” que o levam, várias vezes, aos hotéis para falar mais sobre o seu projecto com os hóspedes que, muitas vezes, se tornam clientes.
Para além deste hotel, também o restaurante DuFogo, em Vila do Porto, conta com uma decoração especial, tendo sido pensada por inteiro por João Pimentel, incluindo logotipo e ementas, aspectos estes mencionados nos comentários deixados pelos clientes através de plataformas como o Tripadvisor, o que denota que estas são peças que não passam despercebidas.
Tendo em conta o sucesso deste projecto, chegou ainda a ser entrevistado em conjunto com outros artesãos marienses, no ano passado, por uma revista alemã, com o propósito de dar a conhecer os vários trabalhos artesanais que são originais de Santa Maria, e, de momento, tem entre mãos um projecto para conceber um balcão de vendas para uma barbearia que abriu recentemente na ilha, encontrando-se ainda a fazer um candeeiro para um cliente particular.
Para além das peças decorativas, dedicou também algum do seu tempo à execução de várias esculturas: “Também já fiz muitas esculturas, muitos peixes e muitas coisas relacionadas com o mar, pois há muita gente que tem barcos e que gosta do mar. Já fiz uma pequena exposição no Clube Naval, havia muita gente a entrar e a sair que viam as peças, e há alguns anos decorei o restaurante do Clube Naval, embora a decoração que lá está agora não seja minha”.
“A maior escultura que fiz”, prossegue, “foi uma que foi pedida pela actual Direcção do Festival Maré de Agosto, que é uma onda quase do meu tamanho que está actualmente à entrada da Praia Formosa, mas em vez de estarem a sair respingos de água estão a sair notas musicais”, adianta.
Fez também sucesso num encontro promovido pela marca de motociclos Harley-Davidson, onde conseguiu vender a totalidade dos suportes para capacetes que fez, concebidos de forma a armazenar correctamente um capacete e de forma a que este possa ser também uma peça de decoração, caso pretendido.
Embora não tenha intenção de sair de Santa Maria de forma permanente, João Pimentel está consciente das limitações existentes na ilha, mesmo que tenha já vendido peças feitas por si para outras ilhas do arquipélago e para clientes de países como a Alemanha e a França que se encontravam de férias nos Açores e que se cruzaram com o seu artesanato do qual “ora se gosta, ora não se gosta”, sem meio-termo, uma vez que é o aspecto industrial e sem modificações que “conta a história” de cada objecto.
“Tenho a perfeita noção de que as minhas peças não são para qualquer tipo de casa e gosto de pensar que, depois de comprada, a peça continua a ter vida e continua a dar motivo de conversa à pessoa que a tem em casa e, portanto, tem que estar no lugar certo”, refere ainda.
Para o futuro, está também a trabalhar na criação do seu próprio site, sendo esta uma forma de expor o seu trabalho perante compradores que se encontrem noutros locais do mundo, para além dos Açores, e também uma forma de valorizar o seu próprio trabalho, tendo em conta que o mesmo género de peças artesanais podem ser vendidas por milhares de dólares nos Estados Unidos da América, por exemplo. Em acréscimo, o artista espera que, com a aproximação da idade da reforma, lhe seja possível aumentar o número de exposições e eventos em que participa anualmente, contando também aumentar a área da sua actual oficina, refere.
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