Views: 0

UM ESTADO DE BEM NÃO FAZ O MAL
Não sei, nem quero saber, se o carro que no passado dia 18 de junho atropelou e matou um homem de 43 anos na A6, perto de Azaruja, circulava a 250, 220 ou 30 km/hora.
Nem sei, e também não quero saber, se o automóvel em causa, que perto do quilómetro 77 da referida auto-estrada abalroou e projetou para a vala, ferido de morte, o trabalhador que na beira da estrada fazia a manutenção da via, sofreu um despiste (parece que não), não teve tempo para se desviar (certamente que não), nem sequer viu o homem (provavelmente não).
Também não sei, e de momento não estou interessado em saber, se a viatura médica de emergência e reanimação activada chegou ao local mais de uma hora depois de sair de Évora, factos sobre o qual foi o INEM questionado e aos costumes nada disse.
E não sei, nem me interessa nada saber, se o ministro da administração interna ia a dormir ou acordado, se deu instruções para andar mais depressa ou mais devagar, se se apercebeu ou não da iminência do embate, se lia ou consultava o telemóvel. Não sei nem quero saber.
Sobre as circunstâncias do acidente foram já abertos inquéritos, o DIAP investiga e o INEM investiga e a comunicação social investiga (mais ou menos), pelo que o melhor é aguardar e, como sempre faço, conceder o benefício da dúvida a todos, motorista, ministro, Centro de orientação de doentes urgentes do INEM e até ao falecido, que o MAI e outras testemunhas dizem ter atravessado inopinada e descuidadamente a estrada. Acreditar na justiça é a primeira regra de um Estado de direito.
E, portanto, não sei nem quero saber, hoje por hoje (amanhã se verá), quem é culpado, quem acelerou e não devia, quem atravessou e não devia, quem se atrasou e não devia.
O que sei, e isso quero saber em nome do Estado que me representa – como a 10 milhões de portugueses –, é que o ministro da Administração Interna apresentou condolências à família. Mas também sei, e se calhar preferia não saber, que o Estado que me representa – e a mais 10 milhões de compatriotas –, não se deu sequer ao cuidado de estar presente no funeral do Nuno Santos.
Não sei, e talvez gostasse de saber, se foi um pedido da família, mas sei, e disso não tenho dúvidas, que a não ser essa a razão, o Estado, que matou um português – com ou sem culpas, não vem ao caso -, podia e devia ter estado presente, representado por alguém:
“O” ministro, um ministro (se “o” ministro não se sentisse confortável), um secretário de Estado (se nenhum ministro se sentisse confortável), um assessor qualquer (são centenas, algum devia estar disponível).
Alguém para dar a cara, e dizer, ou significar: o Estado português, pessoa de bem, lamenta. E vai ajudar.
E sei também e lamento e choro por dentro em nome da decência e da bondade, que o meu Estado – o que me representa e devia ter vergonha, porque eu tenho – ainda não garantiu publicamente e em voz alta, apoio sólido, total e incondicional à viúva e filhos do Nuno Santos, que o Estado, objetivamente, matou.
É o mínimo que um Estado de bem pode e deve fazer.
Porque a diferença entre o bem e o mal é ténue e isso também se aplica aos Estados.
Like
Comment
Share