TAP, Meu doce amor e feijoada à transmontana!

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“Por que não marca noutra companhia? Existem dez voos para Paris e todos mais baratos do que o da TAP.
Só os distraídos não percebem que a TAP é o grande amor das nossas vidas. Que seríamos de nós sem a TAP e sem o Antonoaldo?”

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Francisco Moita Flores

TAP, Meu doce amor e feijoada à transmontana!

O senhor que manda na TAP, julgo chamar-se Antonoaldo, é o gestor brasileiro que sucedeu a Fernando Pinto, outro brasileiro, foi à Assembleia da República , defender que o Estado tinha a obrigação de injectar mil e quinhentos milhões de euros na empresa porque…O povo português ama a TAP!
1 – Ao ouvir tal proclamação debulhei-me em lágrimas. O homem é um pastor de almas!. Só os distraídos não percebem que a TAP é o grande amor das nossas vidas. Que seríamos de nós sem a TAP e sem o Antonoaldo? O que seria da TAP se o nosso tão profundo e generoso amor não lhe metesse no cockpit milhões e milhões de escudos, de euros, ao longo de décadas de existência?
2 – Diz a deputada Catarina Martins – e com toda a razão do Mundo – que a TAP significa o regresso a casa. É verdade. Mas eu que adoro a TAP vou mais longe: Também significa o abandono do País por centenas de milhares de portugueses que, na sua terra, ficaram sem condições para amar a TAP. Diz o nosso primeiro que nunca poderemos deixar falir uma companhia de bandeira, isto é, o grande amor da nossa vida, a TAP. Logo agora que tem um sócio privado que declara solenemente que não mete um tostão na coisa. O nosso amor, tão sublinhado por Antonoaldo salvará qualquer das nossas bandeiras. Incluindo os prémios milionários que todos os administradores recebem anualmente, por mais que sejam os milhões de prejuízo. É por amor, só amor que vai até à paixão de empochar carcanhóis a eito. Diz Antonoaldo, no seu discurso sobre o amor, que até aceitam um gestor do Estado na direcção executiva da TAP, se lhe dermos o produto da caixa das esmolas com mil e quinhentos milhões euros como prova de amor profundo.
3 – Sabe-se que a paixão cega. É o meu caso. Quando entro num restaurante e dizem: o prato do dia é feijoada à transmontana, já não quero saber de trabalho, nem de preocupações, apenas quero, apenas desejo, abotoar-me com a feijoada inventada por deuses transmontanos. Terminada a gloriosa refeição, sonolento, fraquejando das pernas por comer um dos amores da minha vida, chega o tempo da incómoda lucidez: ‘Amanhã vou dar aulas a Paris, preciso de marcar um voo de ida, e para dar razão a deputada Catarina Martins, também de regresso a casa. Consulto o site enquanto o empregado se aproxima para levantar o prato e me pergunta: Então, estava boa?, ao que respondo: Comi-a toda. Não tivesse que ir a Paris, comia-a outra vez.
4 – De repente, o prazer dá lugar à azia. Não há voo da TAP para Paris! Está cancelado. Como é possível o nosso grande amor ser assim traído? Grito por Antonoaldo. Pelo Miguel Frasquilho, pelo amigo íntimo do nosso primeiro, gente que está aos comandos da TAP. Não há voo? Não há voo.
5 – Na mesa ao lado está um beirão, que soube depois que era emigrante. Perante a minha aflição de não poder entrar pela frente ou por trás no grande amor das nossas vidas, sugeriu: Por que não marca noutra companhia? Existem dez voos para Paris e todos mais baratos do que o da TAP. Ainda tentei replicar que as outras companhias eram de transporte de passageiros. Eram uma indiferença. Uma espécie de autocarro com asas. Nada comparada com a TAP, o amor do País inteiro, mesmo daqueles que nunca puseram o pé dentro de um avião e dos infiéis, como o meu companheiro de orgia (que eu bem vi que também se abotoou com a feijoada) qualquer voo lhe dava jeito e, ainda por cima, mais barato.
6 – Consumido pelo desprazer marquei na Air France. É verdade que são menos oitenta euros por bilhete, mas retira o prazer de comer aquela sandes de alface com atum, tão genuinamente portuguesa, tão nossa, tão da TAP, que se tornou uma viagem triste.
7 – Enfim! Vamos lá entregar mil e quinhentos milhões de euros ao Antonoaldo e seus compinchas para alimentar o nosso amor pela TAP. E já agora, para que os infelizes, abocanhem prémios de gestão pela ruína que produzem. Devemos ser o único país do mundo onde entregamos prémios de centenas de milhares a quem arruina os amores das nossas vidas.
8 – Ah! E a feijoada à transmontana ficou por oito eurinhos. Com a quantidade e qualidade que me serviram atirei para os quinze euros. Poupei 7 euros. Que vou guardar para entregar à TAP. Em nome do amor de todos os portugueses.
Boa saúde para todos!