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Faltam 5 dias para acabar a Consulta Pública da Proposta para o Miradouro da Lagoa do Fogo. Eu sou contra a construção de um edifício de 400m2 de betão em pleno Miradouro, que promove a aglomeração de pessoas e carros numa sensível Área Protegida de Habitats e Espécies, na fronteira com Reserva Natural e partilho o porquê. Sejam a favor ou contra, participem, escolhemos nós o que queremos para os Açores!
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Como criar um Centro de Interpretação da Paisagem sem Interpretar o Centro da Paisagem
A menos de uma semana para o fim da Consulta Pública para o Miradouro da Lagoa do Fogo, partilho preocupações sobre a proposta.
O mote original da intervenção é Ambiental: disciplinar e controlar a descida à Caldeira, reduzir o impacto ambiental daquela área devido à forte carga turística que se regista nos últimos anos, de modo a proteger a Fauna e Flora locais. Totalmente de acordo, é um dos preços a pagar em ter apostado na monocultura falível de Turismo de massas.
As propostas, quer na primeira quer nesta segunda versão, não respondem ao desafio! E não o fazem por:
– Insistirem num programa altamente questionável para aquele local e, pior do que isto, o modo de o conceber: um edifício enterrado em betão com 400m2, totalmente refém da primeira versão show-off que só ali poderia ocorrer, com um túnel a rasgar a Cadeira da Lagoa do Fogo (crime ambiental contra todas as boas práticas em Reservas Naturais).
– Falta de uma visão estratégica para todo o complexo da Lagoa do Fogo, faltou entender e tirar partido de todas as potencialidades e atrações e serem integradas como um todo: Lagoa do Fogo, Caldeira Velha, Salto do Cabrito, Pico da Barrosa, Lombadas, Janela do Inferno, etc. Não controla todas as possíveis entradas, apenas a do Miradouro.
– Não ser o edifício que controla o acesso à Caldeira, mas sim, e bem, uma vedação. Porque insistem no edifício “cego” naquela zona, como forma de concentração de pessoas/carros/poluição no local mais sensível? Um monumento natural como a Lagoa do Fogo precisa mesmo de Centro de Interpretação? Com 400m2 em betão?
– A meu ver, tudo não passa de um marcar de posição político, como se de um legitimar do assalto de hotéis e fabricas a que a Lagoa do Fogo tem sido sujeita nos últimos anos (alguns com os mesmos intervenientes envolvidos, incompatibilidades e processos altamente duvidosos), com a total e incompreensível corroboração de Governo e Autarquias, que até PDM suspendem para favorecer investidores. A confirmação vem quando a oposição reclama para si os créditos do projeto TCHARAM e não a real utilidade/viabilidade do mesmo.
– O descartar deliberadamente um Estudo de Impacte Ambiental para uma área tão delicada, que pela sua paisagem, por ser fronteira com uma Reserva Natural (em que o seu limite nunca deve ser entendido como uma simples linha no papel) e por ser Área de Proteção de Espécies e Habitats, teria obrigatoriamente que ser feito. Que impacto terão as escavações, as centenas de toneladas de betão e respetivo carbono incorporado, a qualidade dos reservatórios de água que ali correm e que abastecem boa parte da ilha, a perturbação de aves e flora que foram a desculpa para o controle na Caldeira, os problemas técnicos de fornecer eletricidade, água, esgotos, resíduos, etc.? Não é difícil saber em antemão o resultado do Estudo, daí ser descartado á partida.
– Perder a oportunidade de mudar o paradigma, nesta Era em que internacionalmente todos estão a desenvolver esforços em relação ao Ambiente, Alterações Climáticas e mesmo a nível Social, ao não promover políticas de Mobilidade Sustentável, Proteção Ambiental e de Ecossistemas ameaçados, a prática de exercício físico em contacto com a Natureza.
– Não resolve o problema do estacionamento abusivo no Miradouro que cada vez mais irá acontecer, continua a considerar apenas o carro em relação a alternativas que melhor respondem aos interesses coletivos e ambientais. Não promove uma proteção/distanciamento em relação ao ponto critico, bem pelo contrário, agrava-o com aglomeração.
– Ter ainda o apoio de uma Secretaria do “Ambiente e Alterações Climáticas”, quando a intervenção proposta ignora-os, com o desplante de conseguir apresentar um projeto desta ordem para o local mais sensível da ilha. Num país desenvolvido, eram demitidos na hora, para não mencionar o corte a qualquer financiamento inseridos num programa como a Rede Natura 2000 ou numa visão de Acordo de Paris. Qual é mesmo a utilidade desta Secretaria, que “tem como missão garantir a manutenção da qualidade ambiental, a conservação da natureza, a proteção dos ecossistemas, bem como a gestão dos recursos hídricos e um eficiente ordenamento do território” mas que atua em completa contradição com os seus desígnios? Curioso que nunca se fizeram tantos crimes lesa-pátria na área ambiental desde que foi criada, e mais projetos deste calibre estão em andamento para São Miguel e não só.
– O deliberado branqueamento de informação desde a primeira apresentação pública: na primeira versão foi omitido o enorme impacto visual da boca do Túnel para a Caldeira da Lagoa do Fogo e suavizado a brutalidade dos passadiços de betão em plena caldeira com a sua “pigmentação”. Nesta segunda proposta, são completamente omitidos os 13 lanternins – elementos de betão que afloram da cobertura para captar luz – das imagens fotorealistas. A ideia que é “apenas” a continuação da pendente natural e que não irá ter presença visual no local é puramente ficção, tanto que ocultaram o que já é bem percetível pelos desenhos técnicos. Estes lanternins, assim como os corredores de betão a anunciar a construção, são visíveis de qualquer ponto de vista do miradouro. É isto a que chamam promover um debate sério e construtivo? Uma consulta pública é unicamente uma etapa a queimar, depois de um projeto desta dimensão recusar continuamente as críticas evidentes e ser feito por adjudicação direta, aos mesmos que fazem hotéis para o local, em procedimentos pouco claros?
– Qual é o real valor da última unidade de Paisagem na ilha a resistir aos caprichos de se construir um qualquer Hotel ou Centro de Interpretação? Qual é mesmo a melhor (e talvez única) mais-valia dos Açores em relação ao restante mercado no sector do Turismo? Açores como destino de EcoTurismo? Não desta forma, certamente. Porque razão tem crescido imenso a procura de destinos como Flores, Pico, São Jorge (enquanto ainda não são também destruídos) em detrimentos das ilhas campeãs de hotéis e centros de interpretação? Sabem que intervenções como esta colocam de parte a denominação/nomeação da Região como destino e a prémios de Sustentabilidade, estes sim fundamentais para a sua promoção internacional?
– É estranho também observar o comportamento de algumas Associações financiadas, que mudam de opinião de uma versão para a outra quando os problemas que enumeraram mantêm-se, terão sido os diplomas a eles atribuídos por decreto e exclusividade na exploração turística do local a fazerem mudar de ideias? Ou os financiamentos das autarquias interessadas?
A minha ideia para o local, e da maioria das pessoas com quem partilhei as preocupações é clara. A proposta terá que ter:
– Controlo do acesso á Caldeira através de vedação, quer no Miradouro que foi muito bem alvo de uma reformulação, quer a Sul. O edifício e programa não têm qualquer necessidade de ali estar, ainda para mais não tendo qualquer ligação com a Paisagem.
– Repensar o Complexo como um todo, como se fez em Sintra, num exemplo mais próximo, e que tão bons resultados deram! Criar uma rede de transporte coletivo elétrica que interligava todos os pontos turísticos e ele próprio controla as afluências.
– Questionar a utilidade da antiga Estrada Regional, que atualmente é meramente de acesso aos monumentos naturais da Lagoa do Fogo (especialmente depois da abertura da variante Lagoa-Ribeira Grande). Porque não fechá-la ao trânsito comum e promover uma Ecovia com um transporte coletivo que apoiava quem não quisesse/pudesse ir de bicicleta, a pé, etc. desde as bolsas de estacionamento afastadas e com pequenos edifícios de apoio (WC, informação turística, aluguer de bicicletas/meios eléctricos). Retirar os carros/autocarros da paisagem, promover a redução de poluição ambiental, visual, sonora!
– Acima de tudo, manter a ESSÊNCIA da experiência Açores nestes pontos-chave, em que cada visitante se sente um explorador, com a mínima presença possivel de intervenção humana!
Não sou de todo contra o desenvolvimento, até faço dele vida. Sou sim totalmente contra estragar locais sagrados, em que o único protagonista deve ser o Património Natural, com programas altamente questionáveis, sem uma clara visão estratégica a longo prazo e que consequências terão este tipo de intervenções. Esta ideia de construir é sempre sinal de desenvolvimento não poderia ser mais barroca, traumas passados creio. A Natureza é definitivamente o Petróleo do século XXI !
Temos novamente uma oportunidade para mudar o paradigma, é nosso dever participar ativamente naquilo que NÓS queremos para os NOSSOS AÇORES, não o que meia dúzia de iluminados ambicionam para o seu umbigo com o dinheiro dos outros! O que ficam são os erros, muito caros de pagar e apagar. Deixem-se de ilusionismos, a MAGIA já lá está de origem e não estragá-la é a maior das homenagens!
Encontra-se aberta a consulta pública sobre o projeto até 15 de Setembro, participem!
P.S. Se este projeto for avante, aproveito já para propor um Centro de Observação de Aves e Hotéis da (outrora) Reserva da Lagoa do Fogo – o Lagoon Eye! Qualquer confusão com um modelo importado é mera coincidência. Sugiro a pintura em laranja, não vá alguma ave esbarrar-lhe e ainda a danificar.
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