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Vem aí a artilharia pesada da política
Desta vez não há desculpas: o PSD-Açores tem um líder eleito por esmagadora maioria, chamou para a sua equipa todas as tendências internas, recuperou a velha guarda, deu um sinal aos mais jovens, traçou as linhas essenciais em que se deve focar e arrumou o machado da táctica impiedosa, em que se tinha tornado o partido, no ataque desbragado contra o principal adversário.
Bolieiro esteve igual a si próprio, para quem segue a sua vida política há muitos anos.
Não galvanizou, não inflamou a plateia, não emitiu os ‘sound bits’ da política costumeira, não gesticulou, não atacou, não levantou a voz, numa só palavra… “foi o Bolieiro”.
É isto que o PSD e os Açores precisam?
Os habitantes do concelho de Ponta Delgada parecem gostar do homem que “não faz ondas” e vive num permanente estado de tranquilidade, equilíbrio e sobriedade na relação com os adversários.
Mas uma coisa é governar uma Câmara Municipal e outra é governar uma região.
E coisa ainda mais diferente é discursar enquanto detentor de um cargo autárquico e outra enquanto opositor e com ambição de destronar o PS do governo.
A postura de Bolieiro pode ser a correcta – a palavra “Confiança” foi bem conseguida para o Congresso -, mas um líder da oposição não pode a vida toda ignorar o principal adversário e não aparecer quando for caso para denunciar os erros da governação.
Alguém vai ter que fazer esse papel de denúncia, de crítica e de vigilância permanente aos erros que o Governo Regional vem cometendo.
O novo presidente do PSD, neste aspecto, prefere outra estratégia.
Escolheu para primeiro Vice-Presidente o rosto que terá esse desempenho.
Pedro Nascimento Cabral é muito mais acutilante e mordaz no discurso e nas apreciações críticas que faz da governação, pelo que estará, certamente, na linha da frente para o combate mais lutador.
Bolieiro vai resguardar-se para aparecer depois como o apaziguador, o homem do diálogo com todos, o bem educado. Lembram-se da “força tranquila” de Miterrand em 1981 e que Soares quis imitar?
O grande risco que Bolieiro vai enfrentar internamente é se não conseguir organizar e solidificar a sua equipa, onde estão representadas todas as tendências internas e gente fiel aos antigos líderes, como Freitas e Gaudêncio.
A equipa de Bolieiro é um “caldo” altamente explosivo se deixar de se focar naquilo que é essencial para o partido e mantiver o jogo preferido destes últimos anos, que é a intriga interna e a distribuição de lugares conforme a clientela e não o mérito.
Aliás, no mesmo dia em que o Congresso decorria no Pico, os militantes confirmavam os sinais de enorme desorientação interna, sinalizando para o público que gostam de ser masoquistas, ao votarem maioritariamente em Rui Rio, o tal que desprezou os votos dos militantes do PSD-Açores, dizendo que não valiam fortuna nenhuma, depois de já ter espezinhado a candidatura de Mota Amaral ao Parlamento Europeu.
Isto diz bem do estado em que se encontra o PSD açoriano internamente.
Neste aspecto deviam aprender com os colegas da Madeira. Por alguma razão são governo há 44 anos e, por cá, estão na oposição há quase 24!
Mais: em dado momento perpassou pelo Congresso uma espécie de mensagem, mais ou menos velada, de que Bolieiro não é para eleger já Presidente do Governo… talvez lá para 2024.
Em matéria de estratégia de motivação e de marketing político, não podia haver pior, mas o masoquismo político que se cultivou naquele partido, nas últimas duas décadas, tem destes deslizes.
Quanto à substância dos discursos, Bolieiro não divagou assim tanto. Escolheu bem os temas, avançou com algumas propostas (umas vagas, outras mais concretas) e avançou com aquele estereotipo das apostas para uma década, que é coisa que não galvaniza ninguém.
Levar um congresso da sociedade a todas as ilhas é uma boa ideia, mas se os sociais-democratas forem os primeiros a desmobilizar, sobretudo por falta de ideias (que é diferente de diagnósticos), não conseguirá recuperar a credibilidade perdida.
Abandonar a presidência da Câmara de Ponta Delgada para se dedicar ao partido é um bom começo e um sinal de desprendimento para o público eleitor, mas a decisão de concorrer sozinho a todos os círculos já parece mais arriscada, por parecer pouco humilde no contexto actual, dispensando o diálogo com outras correntes da oposição.
No cômputo geral, Bolieiro começou bem.
Desta vez não há desculpas.
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GOVERNAR POR CARTA – José Manuel Bolieiro não é político para que o PS se deixe de preocupar.
Os socialistas sabem como foram derrotados na Câmara de Ponta Delgada, mesmo avançando com ‘pesos-pesados’ do seu vasto leque de recursos.
O que vamos assistir nos próximos tempos, em termos de combate político, vai ser interessante e demolidor.
As sondagens que vão chegando às sedes partidárias e as mensagens de desagrado, nas reuniões internas, vão levar o PS a apostar as cartas todas.
O Governo Regional não vai ter descanso, mesmo sem muita obra ou dinheiro para derramar, mas sabe que vai contar com a artilharia pesada que vem de fora: chama-se António Costa.
Não se admirem que o Governo de António Costa, de repente, comece a olhar para os Açores de outra forma, apostando as fichas todas.
Fê-lo antes das eleições na Madeira (com fracos resultados) e prepara-se para o fazer novamente nos Açores.
Vai começar já em Abril, realizando em Ponta Delgada um Conselho de Ministros, de onde sairão as primeiras ajudas ao camarada Vasco.
Não é por acaso que depois da última reunião de Vasco Cordeiro com António Costa e alguns ministros, em Lisboa, vários secretários regionais também já se tenham deslocado à capital, reunindo assiduamente com ministros e secretários de Estado, para preparar o Conselho de Ministros aqui nos Açores.
É uma espécie de rolo compressor que querem trazer para a região dita autónoma.
Há muita coisa pendente com a República que está a desagradar a Vasco Cordeiro, com muita gente aflita face à atitude de alguns ministros, pelo que esperam pelo remedeio na reunião magna do Conselho, que está ser preparada com pinças.
O último descalabro foi a notícia de que o Governo da República abandonou o investimento no gás natural nos Açores, canalizando as verbas para a ferrovia.
A reacção nas hostes locais foi de espanto, porquanto, segundo rezam as mesmas notícias, a decisão já tinha sido tomada em 2016!
Muitos dirigentes socialistas locais ficaram paralisados e a reacção da Secretária dos Transportes (outra vez ela) é de cabo de esquadra: enviou uma carta ao seu homólogo em Lisboa a pedir explicações.
Estão a perceber a gravidade disto?
Governantes do mesmo partido, que já se reuniram várias vezes depois de 2016, onde é suposto haver uma relação aberta entre governos da mesma cor, já nem por telefone conseguem esclarecer este imbróglio.
Agora é por carta!
Rica Autonomia esta. Rico governo que é este. Desprezado pelos ministros de António Costa, que tomem decisões contra a região e nem se dignam informar os seus congéneres camaradas.
E nem pestanejam!
Depois da “Autonomia Subjugada”, evoluímos agora para a “Autonomia por Carta”.
Onde isto já vai, louvado.
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PACTOS – A quase nove meses das eleições regionais, em que os partidos vão estar envolvidos num combate eleitoral permanente, Vasco Cordeiro lembrou-se de propor um pacto para mais uma reforma, desta vez a do Poder Local.
Como é que um partido ou um governo, que não consegue há mais de três anos fazer uma reforma da Autonomia, que há mais de seis anos diz que quer mudar o sistema eleitoral e não passa do papel, agora vira-se para outra reforma?
É para criar mais uma CEVERA, entretendo vários deputados em comissões e subcomissões intermináveis, com enormes ajudas de custo, sem que se conheçam resultados?
Para quê mais uma reforma, quando se deixa apodrecer uma outra que há muito devia estar concluída?
E que tal um pacto para reformar a SATA? E outro pacto para reformar a pobreza? E uma reforma para investir mais na Educação? E uma outra para travar os desmandos nas empresas públicas e acabar com a trajectória ascendente do endividamento?
Tanta reforma e tanto papel.
É disso mesmo que os cidadãos contribuintes precisam, de cortinas de fumo para desviar as atenções dos problemas que nos afectam.
Deixem o Poder Local em paz e preocupem-se em governar melhor esta região.
Janeiro 2020
Osvaldo Cabral
(Diário dos Açores, Diário Insular, Multimédia RTP-A, Portuguese TImes EUA, LuisoPresse Montreal)
