Views: 0
tcSph6nmonsored
NÓS E ELES
Nós somos os que moramos cá, nas ilhas. “Eles” são os turistas, e está na hora de os olharmos como parte da nossa vida e não como gente do planeta Marte, que nos vem tirar do nosso descanso ou da felicidade de viver num “cantinho do Céu”.
Se é bem verdade que, tendo em conta o que se passa por esse mundo fora, vivemos numa colecção de nove lugares privilegiados e livres de muitas das maleitas desse mesmo mundo, há que perceber, de uma vez por todas, que “eles”, os turistas, também têm preocupações, também têm filhos, também juntam dinheiro para visitar outras terras, também têm pais, também gostam de certas coisas e não gostam de outras… em resumo são GENTE, como nós somos.
Venho a terreiro porque li, nas redes sociais – essa doença de agora – algumas frases que merecem comentário público.
Uma, tinha a ver com a questão das quarentenas e análises. Claro que nós e eles devemos respeitar a quarentena e as análises! Sem sombra de dúvida! Nem nós queremos ter o novo corona vírus por aí, aos saltos, nem “eles”, os turistas, querem vir para cá imaginando que podem ficar doentes, depois de se terem safado do diacho do Corona, meses a fio.
Eles vêm para ver, conhecer e descansar. Querem, tanto como nós, relaxar um bocadinho, mesmo com mascarilhas e gel.
Se estão lembrados da famosa Zona Verde, no Iraque, onde é possível relaxar alguns degraus abaixo do susto permanente, a ideia, aqui, é mais ou menos a mesma: Criar condições para todos nos sentirmos bem! Nós, que moramos aqui e “eles”, os turistas.
A segunda frase que li perguntava quando é que se acabava com isto da valorização turística de certos locais, pois nós também temos direito e estão a fazer quase tudo para “eles”, os turistas, seja miradoiros, seja zonas de banhos, seja espaços para petiscar à sombra de árvores, sejam monumentos, museus ou outros espaços culturais.
Sabendo que me repito, recordo uma pergunta de pessoa amiga, acontecida há uns anos, em plena Praça Velha de Angra do Heroísmo, quando lhe disse que tinha ido ver baleias com uma das empresas marítimo-turísticas da ilha. Perguntou essa pessoa: “Mas isso não é para turistas?”, e fê-lo com sinceridade. Claro que respondi que não, que não era barato, mas que todas essas coisas existiam para toda a gente e que não havia nenhuma linha a separar o nós do “eles”, os turistas. Quem quisesse podia ir e era bem bonito. Aliás, ver a ilha de fora e do mar, mesmo sem baleias, golfinhos, jamantas, tartarugas ou peixes voadores, é algo que todo o ilhéu devia ser obrigado a ver!
Regressemos, porém, à questão de fundo. Com estes exemplos é fácil verificar que nós é que temos de mudar de maneira de ver e de agir. A valorização turística de um local, o gastar dinheiro na revisão da programação de um museu, mais um bocadinho de natureza, ou mais um monumento para ver são coisas que se fazem tanto para “eles”, os turistas, como para nós! Se nós não usamos, o problema é nosso.
Talvez valha a pena recordar a todos que os Açores, com uma história de mais de 500 anos, são um dos mais interessantes lugares de síntese e de encontro, do Mundo!
(texto originalmente publca em foram impressa no Diário Insular e no Açoriano Oriental de Sábado, dia 15 de Agosto de 2020)