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511. na varanda 1 (à mikinhas, horta, estrela do atlântico, 12 agosto 2011)
partiste e deixaste
o travo amargo da tua boca
no ar evolava a memória
teu corpo
teus beijos
teu perfume
teus contornos delicados
ficaram suspensas as palavras
balões de banda desenhada
à espera do ósculo do artista
o quarto era um laboratório
de sentimentos
cheiros
cores
como a paleta de um pintor
que se levanta e vai
desenhar telas nas nuvens
na almofada a memória
dos teus cabelos
da tua cabeça
deixava antever os sonhos
no suor da tua camisa
e um leve cheiro a coco
era verão
fazia calor
lençóis caídos no chão
roupa esparramada nos cantos
a mala aberta
sabia que voltarias
e sentei-me na varanda
a escrever esta súplica
quero repetir o batismo dos corpos
escalar teus cumes
teus montes de diáfana vénus
da minha
fantasia
utopia
ilusão
puro idílio
512. na varanda 2 (à mikinhas, horta, estrela do atlântico, 12 agosto 2011)
os diáfanos véus
pendiam na janela
na porta
nas paredes
translúcidos e transparentes
com eles vesti teu corpo nu
saías das 1001 noites
e era ainda dia
motivos indianos em volta
hieróglifos nas tuas palavras
teu corpo jovem e bronzeado
teu rosto trigueiro
tuas ancas tisnadas
eram o passaporte para o lado de lá
sem aduanas nem salvo-condutos
teu corpo de menina catita
era a fronteira do desejo
irreprimido
irreprimível
mantinhas o cheiro a maresia
nas ondas dos teus cabelos
tinhas algas nos dedos
sargaços de mil enleios
tentáculos de quentes beijos
tuas mãos desenhavam a minha geografia
e as unhas imitavam nova caligrafia
traçavas o meu mapa mundi
munchinhundi
mundo profundo
ignoto e ignaro
adormeci ao teu colo
sonhei no teu quente regaço
embalei-me nas ondas de teus seios
também tu eras mar
assim,
fui cidadão do teu mundo
nele fiquei para sempre
órfão de todas as pátrias
refém de toda a tua volúpia.