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Em entrevista à Lusa, numa livraria de Lisboa, onde há dias lançou o seu último livro, “Do Monte Cara vê-se o mundo” (Caminho), Germano Almeida defendeu que é preciso “mais atividades” e “bolsas” e “empréstimos” para escritores e artistas cabo-verdianos.
“Não me satisfaz de forma alguma”, afirmou, referindo-se à política cultural de Cabo Verde. “Não temos grandes eventos literários, porque a cultura, infelizmente, ainda não é alguma coisa que os governos sentem a obrigação de subsidiar, porque é considerada uma despesa, ainda não entenderam que investir na cultura é investimento”, lamentou.
O escritor reconhece que o atual ministro da Cultura, o músico Mário Lúcio, “começou a fazer mais coisas”, mas ainda é preciso deixar de ver a cultura como “o parente pobre”.
Cabo Verde “mudou muito”, mas “para pior”, desde que ganhou o estatuto de país de desenvolvimento médio, considera o escritor.
Se, por um lado, a subida de degrau resultou da “boa gestão” das ajudas externas, por outro, esses apoios diminuíram depois “drasticamente”, quando Cabo Verde ainda não tinha “substrato” suficiente para seguir caminho sozinho, observa Germano Almeida.
“Sem dúvida que houve retrocesso no aspeto económico, no aspeto social, desemprego, falta de investimentos, porque (…) ainda não tínhamos chegado aos suportes necessários para nos organizarmos como país de desenvolvimento médio”, analisa.
O escritor tem estado envolvido em polémica sobre a língua que deve ser falada em Cabo Verde, o que até já lhe granjeou o epíteto de “traidor”. Destacando que a defesa do crioulo não está, “de forma nenhuma”, em causa, sublinha: “Se há coisa que faz parte de Cabo Verde é o crioulo. Nós nascemos em crioulo, vivemos em crioulo, morremos em crioulo. Agora, a língua que nos põe em contacto com o mundo é o português.”
Insistindo que “qualquer pessoa de bom senso” sabe que o português é uma língua “mais internacional”, Germano Almeida não afasta a hipótese de, “num futuro longínquo”, o crioulo ser ensinado nas universidades. Mas, recorda, Cabo Verde ainda depende de “ajuda” externa para ter manuais escolares. “Nós não podemos pedir ajuda a Portugal para nos fazer livros em crioulo, é absurdo”, diz, assumindo “uma atitude pragmática”.
Nos seus livros, o escritor já adotou o Acordo Ortográfico e acha que “a discussão” em torno do assunto “é um disparate” e não modificará a decisão. “É importante haver (…) uma certa uniformização da língua, para não nos perdermos uns dos outros”, sustenta.
Germano Almeida adiantou que a Academia de Ciências e Humanidades, projeto que um conjunto de figuras está a tentar lançar no Mindelo, na ilha de São Vicente, deve sair do papel até final do ano, com o objetivo de “juntar os cérebros cabo-verdianos espalhados pelo mundo” e também descentralizar, já que, “neste momento, há muito mais vida intelectual na Praia”, capital do país e da ilha de Santiago.
A cidade do Mindelo está no centro da narrativa da obra “Do Monte Cara vê-se o mundo”, como terra de “pessoas abertas, que mantêm a tradição de convívio”, com “prática de hábitos de cultura”, descreve Germano Almeida.
“A grande vantagem de São Vicente sobre as demais ilhas” é “uma capacidade de absorção das pessoas”, frisa o escritor, originário da ilha da Boavista.