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Tiago Franco’s post
A VERGONHA EUROPEIA |
Nos invernos frios e longos da Escandinávia, uma das coisas que mais gosto de fazer é de me entregar ao silêncio de um duche, bem quente, enquanto penso na actualidade. Vapor por todo o lado e eu ali, quase a adormecer, embrulhado nas ideias.
Tenho, por vezes, a arrogância de achar que a idade me dá o direito de dizer que já vi tudo. Repito a mim próprio, enquanto a água vai cozendo a pele dos ombros, “pior do que isto, a situação X já não fica”.
Temos vivido tantos mínimos da condição humana que acredito mesmo, repetidamente, que não dá para baixar mais. Mas não cesso de me enganar. Dá sempre para um novo recorde olímpico do asco.
Quando Trump sugere que se transforme a faixa de Gaza numa riviera do mediterrâneo, e que Egipto e Jordânia aceitem 2 milhões de refugiados, eu não fico chocado. Trump é um racista primário, profundamente ignorante do mundo que circunda os EUA e que, em tudo, vê qual a melhor hipótese de negócio. Não tem um pingo de compaixão, decência ou humanidade. Como disse Miguel Sousa Tavares, o homem é de uma estupidez inconcebível.
Também não fico chocado quando Netanyahu sugere, em modo de piada, que se forme um novo estado da Palestina no território da Arábia Saudita dizendo que “espaço não falta”. Israel está em guerra com o Hamas, anda há um ano a dizimar a população de Gaza e portanto, acho normal, também, que o líder do governo faça este tipo de declarações. Especialmente agora que tem todo o apoio, mesmo à descarada e sem qualquer tabu, do sugar daddy americano.
O que me choca e até envergonha, é que o resto do mundo civilizado fique calado perante tamanho atentado ao direito internacional, aos acordos estabelecidos entre os países, à autodeterminação dos povos e à integridade territorial. No fundo…tudo aquilo que há 3 anos nos dizem que não podemos permitir aos russos.
75% dos países do mundo reconhecem o Estado da Palestina mas, aparentemente, isso tem valor zero quando apenas dois decidem o seu destino. A Turquia foi a única a fazer voz grossa avisando que os palestinianos não podem sair da sua terra. Egipto e Jordânia já estão ameaçados com taxas caso não aceitem os refugiados (esta merda das taxas é o “vou dizer ao teu pai” da administração Trump). China e Rússia, as outras potências imperialistas, estão caladas para ver se anexar passa a ser “cool” e se dá para uma perninha em Kiev e no Taiwan. A UE fez aquela habitual figura triste de fingir que não aconteceu nada e despachou mais umas quantas leis a propósito de tampinhas e impostos sobre impostos.
Guterres falou sozinho, como de costume, na sede da ONU e condenou o plano de Trump. Mas, como se sabe, ninguém quer saber das condenações veementes ou das opiniões de uma organização de 193 países, onde, na verdade, apenas 2 ou 3 contam para o totobola.
Ontem, julgo que no canal NOW, a Mariana da IL (não me lembro do segundo nome) dizia que a solução dos dois estados é boa mas que não há condições ainda para a sua realização. Hoje, ouvi nas “linhas vermelhas”, a Cecília Meireles a dizer essencialmente o mesmo. O Paulo Rangel, esse ministro de ideias firmes, foi ao médio oriente, quem adivinha, reproduzir a mesma ideia. Tudo bem com a solução dos dois estados mas ainda não há condições.
O curioso é que a solução dos dois estados começou a ser falada em 1948, quando se formou o estado de Israel e, de um lado ou de outro, ainda não se conseguiram reunir “as condições” para tornar aquilo habitável.
Portugal, que gosta de se manter irrelevante e submisso na cena internacional, escolhe ficar entre a minoria de países que não reconhecem a Palestina. Ao contrário de nuestros hermanos, por exemplo, que mostram outra dignidade neste tema.
77 anos depois, já palestinianos nasceram e morreram no cárcere e nunca chega o tal momento certo. E ironia das ironias, tanto se esperou que a solução encontrada foi genocídio e deslocação da população, com o alto patrocínio da maior potência do planeta, “land of the free, home of the brave”.
Já escrevi isto algumas vezes e repito. Não existem impérios bons e impérios maus. Apenas existem impérios. Mas o que acontece na Palestina, este inacreditável genocídio e expulsão de um povo da sua própria terra, à vista de todos, com governantes vergados, calados e mijados, explica-nos empiricamente que pior do que a existência do imperialismo, é a confirmação de um império sem rival.
Ps – leitores atentos corrigiram-me com as posições de condenação de Rússia e China. É bom mas não chega falar. É preciso garantir, por todos os meios, que o plano de Trump não acontece no terreno.
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Aníbal C. Pires
A China já manifestou a sua oposição à solução do Trump.
Abraço