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O Dr Simas Santos deu uma entrevista ao jornal Correio dos Açores de ontem. Entre os vários assuntos abordados surge o inevitável tema da saúde no Pico.
“Acho que temos uma saúde a dois tempos:
as ilhas com hospital e as outras. Naturalmente
que ninguém de bom senso defende a ideia de
que deveriam existir em todas ilhas hospitais se-
melhantes aos que existem nas que os têm. Mas
sempre foi um princípio de equidade que se man-
tém de pé e que por razoes desconhecidas nunca
foi implementado.
Pequenos hospitais que deveriam manter
verdadeiras urgências e não os presentes SAP´s
(Serviço de Atendimento Permanente), eufe-
místicamente designados de “urgências”. Tere-
mos que ter um verdadeiro serviço de urgência
de ilha com tudo o que isso implica em meios
técnicos e humanos. O que implica cirurgia de
primeiro tempo, cuidados intensivos, sangue,
imagiologia e medicina interna dado que uma
urgência corresponde à situação onde existe risco
de falência de funções vitais bem como acesso
a cuidados de urgência, implica a capacidade de
resposta adequada ao local da ocorrência e esta-
bilização durante o transporte.
Entendendo-se por emergência médica um
quadro grave, clínico ou cirúrgico ou misto, de
aparecimento ou agravamento súbito e imprevis-
to, causando risco de vida ou grande sofrimento
ao paciente e necessitando de solução imediata, a
fim de evitar mal irreversível ou morte. E por ur-
gência medica um quadro grave, clínico ou cirúr-
gico ou misto, de aparecimento ou agravamento
rápido, mas não necessariamente imprevisto.
No caso concreto da grande proximidade das
Ilhas do Faial e Pico faz todo o sentido que seja
criado o Centro Hospitalar Faial-Pico tendo como
base o Hospital da Horta e sendo criado no Pico
um Pólo Hospitalar a ser implementado no novo
Centro de Saúde da Madalena, um investimento
que rondou os 12 milhões de euros e que, com
algumas adaptações/ampliações, poderia desem-
penhar na perfeição essas funções, aproveitando
uma economia de escala, possibilitando obvias
sinergias e permitindo uma utilização cabal dos
actuais recursos humanos.
A Ilha do Pico é um caso peculiar no con-
texto regional porque sendo a segunda ilha em
tamanho, só suplantada por São Miguel, tem uma
população diminuta e extremamente dispersa
com distâncias muito significativas que chegam
atingir os 50 quilómetros como é o caso entre a
Piedade e Madalena, dois extremos da ilha no
sentido longitudinal. Embora com uma boa rede
de estradas não tem, contudo, vias rápidas que en-
curtem essas deslocações para tempos aceitáveis
como são os necessários para emergências médi-
cas. Situação mitigada pela presença de uma SIV
mas que funciona em parte time e é insuficiente
para uma ilha tão extensa.
Sendo ridículo que ainda hoje as grávidas do
Pico tenham que permanecer semanas na Horta
para um parto inteiramente normal quando em
países bem mais desenvolvidos se incrementa o
parto domiciliário.
Os próprios Serviços e Atendimento Per-
manente do Pico são assegurados por tarefeiros
muito condicionados nas suas opções médicas
e inteiramente tutelados pelo Hospital da Horta
que centraliza totalmente as deslocações dos do-
entes do Pico, numa prática que eleva custos e
que se traduz num claro retrocesso em relação ao
passado. Trabalhar hoje nos serviços de saúde do
Pico é uma actividade com imensas frustrações e
condicionalismos.
E os Centros de Saúde são, essencialmente,
postos de consultas não cumprindo os objectivos
para que foram criados e que deveriam ser forte-
mente dirigidos para a prática de medicina comu-
nitária focada na prevenção e na educação para
a saúde. Situação, de resto, transversal a toda a
Região.
Muito há a fazer no sector da saúde no Pico e
que, ironicamente, muito tem a ver com questões
conceptuais e de boa gestão dos recursos e não
tanto com estes. Muito mais se poderia fazer com
as mesmas pessoas, os mesmos equipamentos e
as mesmas verbas. Teria que ser, isso sim, bem
repensado o actual modelo, sem preconceitos ou
condições prévias, sobretudo no que diz respeito
ao eixo Faial-Pico.”