Banqueiros: Muitas suspeitas, poucas condenações, nenhuma prisão

O pior que aconteceu aos banqueiros envolvidos em casos criminais foi terem deixado de poder continuar a ser banqueiros. O DN recorda quem são e as suspeitas de que são alvo.

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Banqueiros: muitas suspeitas, poucas condenações, nenhuma prisão

O pior que aconteceu aos banqueiros envolvidos em casos criminais foi terem deixado de poder continuar a ser banqueiros. O DN recorda quem são e as suspeitas de que são alvo.

Bons advogados, com tudo o que o dinheiro pode pagar – e uma justiça lenta. Esta parece ser a chave que tem salvo da prisão todos os banqueiros portugueses suspeitos de crimes. Sentenças condenatórias já houve algumas. Mas nenhuma transitada em julgado. Os encargos dos contribuintes com o salvamento e a ajuda aos bancos ascendiam, no final de 2017, a 14,6 mil milhões de euros, cobrindo o período 2008-2016. O equivalente a 146 transferências de Ronaldo do Real Madrid para a Juventus.

Ricardo Salgado

O homem que em tempos foi cognominado de DDT (Dono Disto Tudo) está na mira de quatro processos-crime e cinco contraordenacionais por reguladores dos setores bancário e bolsista (Banco de Portugal e CMVM). Nos processos-crime, um único tem acusação, o da Operação Marquês. O antigo todo-poderoso patrão do Banco Espírito Santo está acusado de um crime de corrupção ativa de titular de cargo político, dois de corrupção ativa, nove de branqueamento de capitais, três de abuso de confiança, três de falsificação de documentos e outros três de fraude fiscal qualificada. É suspeito de ser o maior corruptor ativo do processo, com subornos de 17,4 milhões de euros, nomeadamente para manter o controlo da PT através do BES. Está a iniciar-se a fase de instrução. José Sócrates é o principal arguido.

De resto, Ricardo Salgado – que continua a viver com a família na sua casa em Cascais apesar de esta estar arrestada – está a ser investigado na Operação Monte Branco, caso EDP (por alegadamente ter subornado com 1,2 milhões de euros o ex-ministro Manuel Pinho) e Universo BES (a investigação das causas de gestão que estiveram na origem no colapso do banco e do respetivo grupo). Quanto aos processos contraordenacionais, são cinco – quatro do Banco de Portugal e um da CMVM. Todos têm acusação e nenhum decisão final. Em junho de 2016, Ricardo Salgado foi inibido pelo Banco de Portugal de exercer atividades no setor financeiro, condenação a que se somou uma multa de 3,7 milhões de euros. Tem sido defendido pelo advogado Francisco Proença de Carvalho, sócio da Uría Menendez-Proença de Carvalho, sociedade de advogados que tem o seu pai, Daniel Proença de Carvalho, como sócio-presidente. Daniel Proença de Carvalho é o chairman do grupo Global Media, ao qual pertence o DN.

Oliveira Costa

Em risco de colapsar, o Banco Português de Negócios (BPN) foi nacionalizado em novembro de 2008 (governo de Sócrates, sendo Teixeira dos Santos ministro das Finanças). E começaram então as investigações criminais – já lá vão, portanto, dez anos. O fundador e patrão do banco, José Oliveira Costa, antigo administrador do Banco de Portugal (com o pelouro da supervisão…) e antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (num governo de Cavaco Silva, que foi aliás um dos clientes VIP do BPN), é mais um exemplo dos banqueiros que passam pelo crivo da justiça mas nunca foram vistos na cadeia. No dossiê BPN constam vários processos e Oliveira Costa já fora sentenciado com uma pena de prisão de 14 anos (em recurso, claro). Na segunda-feira, no Juízo Central Criminal de Lisboa, Oliveira Costa foi condenado a 12 anos de prisão por dois crimes de burla. Está um recurso prometido, evidentemente. Há muito que o fundador do BPN está proibido de ter atividade no setor financeiro. O ex-banqueiro tem sido defendido pelo advogado Leonel Gaspar. Em junho de 2017, contas feitas pela Lusa diziam que a nacionalização do BPN já havia custado cerca de 366 euros a cada português. Em valores absolutos, cerca de 3,66 mil milhões de euros.

Jardim Gonçalves

Em 1985, Jardim Gonçalves fundou o BCP (Banco Comercial Português). Não foram precisos muitos anos para se tornar o maior banco privado português, maior mesmo do que o histórico BES. Católico empenhado e membro do Opus Dei, Jardim Gonçalves transferiu a liderança do banco em 2005 para outro “militante” desta congregação, Paulo Teixeira Pinto, um antigo secretário de Estado adjunto de Cavaco Silva. Teixeira Pinto ascendeu a gestor de topo no BCP, pela mão de Jardim Gonçalves, sem antes ter qualquer experiência no setor (depois de deixar o banco tornou-se editor livreiro). Guerras dentro do corpo acionista do banco levaram o fundador do BCP a abandonar completamente o banco em 2008. Em 2010, o Banco de Portugal condenou-o a uma multa de um milhão de euros por irregularidades cometidas na administração do banco, inibindo-o também de deter cargos no setor financeiro. Em 2014 foi condenado a dois anos de prisão por crimes de manipulação de mercados – mas com pena suspensa. Ainda hoje o ex-banqueiro recebe do próprio banco uma pensão mensal de cerca de 167 mil euros/mês. As tentativas da atual administração para que esta pensão lhe seja cortada e/ou diminuída têm esbarrado em sentenças dos tribunais em sentido contrário.

João Rendeiro

No passado dia 15 de outubro, João Rendeiro, fundador do BPP (Banco Privado Português), foi condenado, em conjunto com outros ex-quadros da instituição, pelos crimes de falsidade informática e falsificação de documento, a cinco anos de prisão. Com pena suspensa. Funcionário público com uma licença sem vencimento de tempo ilimitado, Rendeiro, gestor que sempre alimentou um elevado perfil mediático, terá de pagar 40 mil euros de multa a uma IPSS. No essencial, foi acusado de falsear as contas do banco para que o mercado não se apercebesse de como as coisas não estavam a correr bem. Em 2008, o Banco de Portugal iniciou o processo de liquidação do BPP, cujas dificuldades nasceram da crise geral do sistema bancário iniciada nesse ano com a queda do Lehman Brothers, nos EUA. O Estado interveio com uma garantia de 450 milhões de euros, que depois conseguiu reaver.

Tomás Correia

Apesar de arguido num processo que resultou da Operação Marquês, Tomás Correia é atualmente recandidato, liderando a lista A, a presidente da Associação Mutualista Montepio Geral. O estatuto de arguido não lhe implica nenhuma inibição de atividade no setor financeiro – só se for formalmente acusado, cabendo a decisão ao Banco de Portugal (que por sistema tem atuado dentro do princípio “casa arrombada, trancas na porta”, ou seja, demasiado tarde). Sobre Tomás Correia recaem suspeitas, segundo o jornal Público , de crimes como insolvência dolosa, cheques sem cobertura e burla qualificada, entre outros. O banqueiro é suspeito, segundo o mesmo jornal, de ter recebido 1,5 milhões de euros do construtor civil José Guilherme, que deu 14 milhões a Ricardo Salgado, ex-presidente do BES, a título de “liberalidade”.