A palavra xenofobia significa aversão ao que é estrangeiro. Ouvimos essa expressão com bastante frequência neste início de século 21, quando milhares de pessoas tentam migrar em direção, principalmente, aos Estados Unidos e à Europa. Nesses lugares, há movimentos xenófobos contra a população estrangeira, acusada, entre outras coisas, de disputar os já escassos postos de trabalho com a população local.
Seja como for, xenofobismo não é um comportamento novo, nem tampouco diz respeito à história dos Estados Unidos e dos países da Europa, apenas. Durante o período imperial, sobretudo, havia no Brasil um forte sentimento xenófobo em relação aos portugueses. Compreender como se deu esse comportamento e analisar a posição assumida pelos cidadãos lusitanos no Novo Continente ajuda a entender melhor esse aspecto importante – porém, nem sempre ressaltado – da história brasileira.
A Corte no Rio de Janeiro
É verdade que, como colônia de Portugal, o Brasil sempre foi um dos destinos mais comuns para os portugueses. Contudo, foi com a transferência da Família Real para a América, em 1808, que essa situação se intensificou. Antes de mais nada, porque não foram apenas os membros da realeza lusitana que vieram para o Brasil, mas, sim, a Corte inteira.
Para se ter a real dimensão do problema, com a transformação do Rio de Janeiro em sede da Corte, a cidade logo aumentou sua população em cerca de 50% – embora, é claro, nem todo esse percentual fosse de portugueses. Ainda assim, os lusitanos que chegaram junto com a Família Real passaram a ocupar postos de poder e privilégio, o que, de certa forma, era natural para quem integrava a Corte.
Tal situação, de outro lado, contribuiu para alimentar um sentimento contrário aos portugueses. Ou seja, o xenofobismo em relação aos lusitanos. Junto com os membros da Corte, vieram para o Brasil, logo após a transferência da Família Real, muitos comerciantes e funcionários públicos (para preencher os cargos da burocracia estatal) portugueses, reforçando ainda mais a questão xenófoba.
Posições políticas dos portugueses
Naturalmente, como cidadãos de Portugal e beneficiários da ordem política estabelecida, os portugueses tendiam a querer manter seu status quo. Por isso, eram comuns as manifestações de apoio ao rei dom João 6° e mesmo a dom Pedro 1°. Este, embora tenha declarado a Independência do Brasil, era português e governou dialogando com seus compatriotas que aqui viviam.
Em vários momentos da história brasileira, as posições políticas assumidas pelos portugueses os isolaram ainda mais dos brasileiros, acentuando o xenofobismo. Quando o governo de Pedro 1° já estava bastante desgastado, por exemplo, alguns lusitanos decidiram fazer uma manifestação de apoio ao imperador. Nas ruas do Rio de Janeiro, acabaram se enfrentando a pedras e garrafas com brasileiros, na chamada Noite da garrafadas.
Em 1820, quando teve início em Portugal a Revolução Liberal do Porto, que, entre outras coisas, propôs a recolonização do Brasil (já bastante autônomo naquele momento), muitos portugueses (especialmente os que viviam nas províncias do Norte e Nordeste da colônia) apoiaram uma causa contrária às aspirações autônomas do Brasil.
Difícil relação com os portugueses
Em linhas gerais, a relação entre brasileiros e portugueses, ao contrário do que se possa pensar hoje em dia, nem sempre foi tão cordial. Pelo contrário. Em determinados momentos da nossa história, o sentimento xenófobo em relação aos lusitanos se intensificou bastante. Muitas vezes, em razão das posições políticas dos próprios portugueses.
Exemplo significativo, nesse sentido, foi o apoio de portugueses à restauração – isso é, à volta de dom Pedro 1° ao Brasil, quando o imperador já havia abdicado ao trono.
Evidentemente, esse é apenas um aspecto da relação entre brasileiros e portugueses e do comportamento destes diante dos interesses próprios do Brasil. Não pode, portanto, ser generalizado a todos os portugueses, sob o risco de desconsiderarmos a complexa rede de interesses que se formou na colônia, especialmente no século 19.
O que é certo, contudo, é que em diversos momentos daquele período aflorou um xenofobismo bastante acentuado contra os portugueses. Ou pelo menos parte deles.