finados poesia de autor

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I. 343.1. (dia de fiéis) (novembro 2, 1971)

 

 

parado, com respeito de vivo

por entre veneradores de memórias-saudade

observo as faces humoradas das pessoas anónimas

sinaleiros uniformizados regulam o trânsito

param com um sorriso malicioso nas pupilas brilhantes

com corpo de adormecer estrelas passa uma figura impante de formas

os carros param, há comentários

brilham sóis no sexo das pedras pisadas

e lá dentro no cemitério do “eterno repouso”

nem um só morto se moveu dentro do caixão.

 

469.2. le poisson d’avril, abr 1, 1976

 

 

(hoje, todos os jornais cumpriram

nem uma só mentira se imprimiu

era a verdade toda

a do sonho não vivido

talvez possível

em letras garrafais

 

  • HOJE DIA NACIONAL DE ENGANOS É LÍCITO DIZER A VERDADE –

proclamava o editorial)

a duas colunas no canto esquerdo

a páginas quinze

era minha a foto e o nome

nem me impressionou!

ri mesmo com desprendimento

negra cruz encimava frontispício

dizeres os do costume

a missa presente no corpo do finado

hora a habitual

na residência

o féretro sairia para jazigo familiar

lembram-se de cada!

(claro que me importei quando o padre disse

que ELE me chamara à sua presença)

todos compungidos

choravam rezas e eulogias

vestiam negro

exceto as flores

e as palavras vazias

adivinhei um sorriso dissimulado

nos lábios da viúva

andei por aqui e ali

ouvindo este e aquele

pediam à minha alma

que os libertasse

queriam alívio

disfarcei-me por entre sombrias colunatas

e fugi

 

 

(ainda hoje me procuram!)

 

 

 

 

 

Sobre CHRYS CHRYSTELLO

Chrys Chrystello jornalista, tradutor e presidente da direção da AICL
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