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612 ESPERANÇA DE VIDA REDUZIDA, 27/9/2025
(anteriores crónicas em https://www.lusofonias.net/mais/as-ana-chronicas-acorianas.html
Quando vim para o arquipélago em 2005 ignorava tudo, até as estatísticas locais de longevidade familiar. Nem sabia que, a crer nelas, iria ter a vida condicionada e drasticamente reduzida pelo mero facto de aqui habitar. Estava preocupado. Acabara de saber que ia viver menos do que esperava. O Diário dos Açores, o quotidiano mais antigo do arquipélago, fundado em 1870, na sua edição de 19 de janeiro de 2006, afirmava em artigo assinado por Manuel Moniz:
Açores entre as regiões onde se vive menos…
Os Açores estão entre as regiões do país onde a esperança média de vida à nascença, em 2004, é mais baixa. No entanto, é possível que seja uma questão de ilhas: a Madeira está ainda ligeiramente abaixo dos Açores – ou seja, em média vive-se menos tempo nas ilhas do que no continente. Em 2004, a esperança de vida para as pessoas nascidas nesse ano é de 74 anos nos Açores, menos 4 que a média do país, que é de 77,8 anos. Os números do Instituto Nacional de Estatística não explicam o porquê – mas são os números oficiais. Se será da humidade, das preocupações, da falta de médicos ou de um nível escolar mais baixo, isso terá de ser o leitor a concluir. Pode aliás ser por muitas e variadas razões que nestas e noutras coisas as ciências são ainda inexatas quanto baste. Os números apenas dizem que é assim: Nos Açores vive-se quase menos quatro anos que a média nacional. Apesar de tudo, a situação tem melhorado nos últimos anos. Esta réstia de otimismo era bem necessária depois do início da notícia….
No triénio 1992/1994, a esperança média de vida açoriana era de apenas 70,44 anos (mais ou menos 70 anos e 5 meses), o que significa que em pouco mais de uma década esse valor melhorou 5%. Não é, no entanto, o crescimento maior do país: há distritos onde o crescimento ultrapassou os 10% (o Ave, no Norte, atingiu mesmo os 13,19%, atingindo neste momento uma esperança média de vida de 78,4 anos). O melhor distrito para se nascer é…a Cova da Beira, onde a esperança média é de 79,3 anos, e o Entre Douro e Vouga, com 79,2. Os piores: o Baixo Alentejo, com apenas 71,2 anos de esperança média de vida, e a Serra da Estrela, com 72,2. Os grandes centros urbanos também são bons, como a Grande Lisboa, onde se espera uma média de 78,2 anos, e o Grande Porto, com 78 anos. O facto, no entanto, é que os Açores estão claramente na cauda do país neste tipo de indicador: apenas o 5º do fim. Abaixo dos Açores, apenas a Beira Interior (com 73,8), a Madeira (com 73,4) e Serra da Estrela e o Baixo Alentejo, que se ocupam dos piores valores….
Ao fim de 20 anos nos Açores (2025) as estatísticas pioraram (Autor: Lusa / AO Online 27/9/25). Com base nos dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), a DRE (Direção Regional de Estatística) refere que “para o todo nacional, a esperança de vida à nascença foi estimada em 81,49 anos, tendo crescido 0,32 anos (4 meses) face ao triénio precedente”. No país, “as mulheres podem esperar viver 83,96 anos e os homens 78,73 anos”, adianta a DRE, acrescentando que no Norte “verifica-se a maior longevidade (82,13 anos), contrastando com a Região Autónoma dos Açores, cuja esperança de vida à nascença é a mais baixa do país (78,33 anos)”.
Relativamente à esperança de vida aos 65 anos em Portugal atingiu 20,02 anos para o total da população, 18,30 anos para os homens e 21,35 anos para as mulheres. É no Norte que se verifica a maior longevidade aos 65 anos (20,42 anos) e na Região Autónoma dos Açores a menor (17,83 anos)”, lê-se na mesma nota.
Não sabendo o que houvera de fazer, adotei uma velha máxima, em caso de dúvida se calhar o melhor seria nem fazer nada e ficar a aguardar. Tal como “a nêspera” do Mário Henrique Leiria “que estava quieta e calada, à espera, até que vieram e zás comeram-na”.
A Nêspera
Uma nêspera
estava na cama
deitada
muito calada
a ver
o que acontecia
chegou a Velha
e disse
olha uma nêspera
e zás comeu-a
é o que acontece
às nêsperas
que ficam deitadas
caladas
a esperar
o que acontece
Mário Henrique Leiria, in Novos Contos do Gin
Não queria ter esse fim, mas também podia ficar calado e quieto à espera de que esse dia chegasse. Não podia ir para mais nenhum sítio. Teria de se adaptar às estatísticas. A notícia não mencionava, mas poderia, eventualmente, acontecer que os que nasceram e viveram noutras paragens durassem mais. Os que (como eu) nasceram na primeira metade do século passado deveriam estar quase a desaparecer, isso já era preocupante. Tinha ainda de ter cuidado com a água porque na vila do Nordeste os níveis de arsénio são dos mais altos do país. Sempre pensara que Arsénio era um homem, como o Arsène Lupin.
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