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Especialista diz que adesão de Timor-Leste a Associação de Nações do Sudeste Asiático pode demorar
Díli, 19 jan 2023 (Lusa) – Uma especialista em estudos sobre a Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) diz que a adesão formal de Timor-Leste a este grupo de países pode demorar, com os critérios a incluírem exigências complexas.
“Timor-Leste pode ter recebido um prémio de consolação no ano passado quando recebeu, em princípio, a aprovação para aderir à Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) como o seu 11º Estado-Membro. No entanto, pode ter um longo caminho a percorrer para chegar ao prémio final: a adesão completa”, considera Joanne Lin, co-coordenadora do Centro de Estudos da ASEAN, do Instituto de Estudos do Sudeste Asiático, em Singapura.
“O estatuto de observador permite que o país participe em todas as reuniões da ASEAN, incluindo em plenários das cimeiras. Embora aparentemente generoso, Timor-Leste não poderá contribuir para a tomada de decisões ou partilhar livremente os seus pontos de vista nestas reuniões”, recorda num artigo publicado no portal do Channel News Asia.
Na prática, refere, o estatuto de observador é uma oportunidade para Timor-Leste conhecer os meandros da organização e da burocracia e “aprender a melhor forma de negociar no bloco”.
O calendário de adesão poderá ficar mais claro em fevereiro quando se antecipa que possa ser aprovado um primeiro conjunto de orientações, antes de cumprir “um roteiro com critérios objetivos até à participação plena”.
“O chamado roteiro de critérios objetivos pode revelar-se mais um longo processo burocrático com uma lista de verificação a curto, médio e longo prazo para ganhar tempo para Timor-Leste construir a sua capacidade e ratificar os instrumentos da ASEAN”, explica Lin.
“Não admira que [o Presidente timorense] José Ramos-Horta tenha feito as suas famosas observações que ‘parece que o caminho para o céu é mais fácil do que chegar aos portões da ASEAN’”, escreve.
Solicitada em 2011, a adesão de Timor-Leste tem tido um impulso significativo nos últimos anos, com um esforço amplo do Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação (MNEC) e, este ano, com o apoio adicional de José Ramos-Horta.
No ano passado, numa visita a Singapura e à a Malásia, o líder conseguiu compromissos dos dois países para apoiar com o reforço de capacidade em Timor-Leste no quadro da adesão.
Joanne Lin alerta, por exemplo, que a concordância consensual dos 10 estados-membros para a adesão exige de Timor-Leste “maiores garantias de cumprimento de vários compromissos e responsabilidades”.
Entre os aspetos a comprovar contam-se, por exemplo, a “capacidade de Timor-Leste liderar a presidência rotativa anual da ASEAN, que incluirá a realização de cimeiras e todas as infraestruturas e capacidade de conectividade” necessárias.
Timor-Leste tem que ter funcionários e especialistas competentes para participar nas mais de 1.300 reuniões da ASEAN, “incluindo exercícios conjuntos de segurança e a proficiência necessária para negociar e facilitar as relações com parceiros de diálogo como a China, a União Europeia e os Estados Unidos”.
Em termos processuais, Timor-Leste tem que aderir a todos os acordos da ASEAN e de se comprometer com a sua aplicação, harmonizando as suas leis e regulamentos com os mais de 80 tratados e convenções juridicamente vinculativos da organização regional e que abrangem aspetos desde o tráfico de seres humanos e contraterrorismo a acordos sobre gestão de catástrofes e resposta a emergências.
Lin destaca o Acordo de Comércio de Mercadorias da ASEAN, que visa alcançar o livre fluxo de mercadorias e aprofundar as ligações económicas na região, com base no qual as taxas de importação foram eliminadas – ou reduzidas para quase zero para os membros mais novos – para quase todos os bens.
Timor-Leste tem em vigor, desde 01 de janeiro deste ano, uma taxa de 5% sobre todos os bens importados.
Além disso, explica Lin, Timor-Leste tem ainda que estabelecer “regras de origem e procedimentos de certificação, regime de normas técnicas, normas sanitárias e fitossanitárias atualizadas, bem como garantir pessoal qualificado, incluindo peritos legais, para gerir as alfândegas”.
O contributo financeiro anual para a ASEAN é de 2,5 milhões de dólares (2,3 milhões de euros) por ano, com contributos obrigatórios “para uma lista de fundos e entidades da ASEAN, como a Fundação ASEAN, os seus próprios recursos humanos e custos de participação nas reuniões da ASEAN”.
A especialista de Singapura sublinha que uma das questões que continua a suscitar debate interno no seio da ASEAN tem a ver com a capacidade de Timor-Leste concretizar os compromissos que fez de cumprimento das suas obrigações ao abrigo da Carta da ASEAN, especialmente no que toca às questões económicas.
Lin refere que esse terá sido um dos aspetos que levou à demora na aceitação da adesão de Timor-Leste, comparativamente a possessos de adesão como os do Camboja, Laos, Myanmar e Vietname, que demoraram apenas dois anos, na década de 1990, “quando as suas posições socioeconómicas não eram muito melhores do que as de Timor-Leste no momento da admissão”.
“Observadores atribuíram o longo atraso a algumas reservas dentro do bloco, por exemplo, de que as limitações económicas de Timor-Leste podem atrasar a realização da Comunidade Económica da ASEAN – imaginada como uma economia integrada com um livre fluxo de bens, serviços, capital e mão-de-obra”, explica.
“Alguns analistas consideram que a adesão de Timor-Leste pode entrincheirar divisões e diluir ainda mais a eficácia da organização. Pode também complicar as perspetivas de adesão da ASEAN se o país aumentar a sua dependência da China ou depender excessivamente da ajuda externa”, enfatiza.
Neste quadro, em particular, Lin refere que cabe à própria ASEAN apoiar Timor-Leste na construção de uma “identidade regional”, correndo o risco, se não o fizer, de ver o país aproximar-se cada vez mais da China, o que “resultará num maior risco geopolítico para a região”.
ASP // CAD
Lusa/Fim
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