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CONTINUANDO…
No que respeita à “serenidade” , que Lemos Pires relatou, no seu livro, com que decorreu a operação, que eu, já indo a caminho de Darwin, não presenciei, a crer em algumas pessoas embarcadas no “Mac Dilly”, terá havido algum tumulto, principalmente por parte da tropa que seguia neste navio, e também o próprio Capitão Piloto-Aviador Alves Ferreira, que ia a bordo do rebocador, da comitiva governamental a caminho de Ataúro, que contou no seu livro “O Último Voo Sobre Timor”, que “a certa altura alguém com um megafone avisou que ninguém transportasse armas para a Austrália; logo seguida grande número de armas e munições foram pura e simplesmente atiradas à água pelos militares que iam embarcar…”. Do mesmo modo, o Dr. António Cravo Cascais, no seu livro “Timor, quem é o culpado?”, e no que respeita ao comportamento de alguns militares portugueses — aliás, alguns desses factos por mim também presenciados, anteriormente — “os armazéns da alfândega foram ‘verificados’ por ‘briosos’ militares portugueses que ‘apreenderam’, em seu proveito, tudo o que se lhes afigurava de interesse…”. E que “antes da Gloriosa Retirada, houve uma ‘recolha’ total do que havia nos principais estabelecimentos, de aparelhagens fotográficas e de som, ao ponto de, já em Darwin, um Sr. Ten. Coronel exibir uma sofisticada máquina, último modelo, que adquiriu a um soldado por 100 dólares, quando o valor dela seria de 500 ou 600… uma pechincha! Oficiais houve que até aparelhos de ar condicionado usados trouxeram! No antigamente os vencedores da guerra tinham direito a saquear os vencidos, o que se passou em Timor revolucionou esses costumes do passado…”.
Com efeito, também na minha viagem no navio norueguês, um soldado oferecia, a quem o quisesse, uísque de um garrafão que empunhava, ansiando por o ver vazio, não que o fizesse para comemorar o livrar-se do pesadelo, ou por fraterna solidariedade, mas para ficar com aquele bonito recipiente de vidro vazio, pois que cheio… ai da alfândega!
Já antes da saída da equipa governamental, e dos que a acompanhavam, para o suposto ‘paraíso’ de Ataúro, a “última Voz de Portugal em Timor — a Estação Radionaval —que, muitas vezes, em condições difíceis sob o fogo cruzado dos dois partidos em luta, continuara fazendo o serviço de ser o único meio de comunicação com o exterior, só foi abandonada às 20,45 horas daquele dia, pois “as comunicações deveriam manter-se até ao último momento “, sendo os seus operadores os últimos a sair e tomando medidas para que se tornasse inoperável mas facilmente recuperável”. É José Luís Ferreira Leiria Pinto, comandante da Defesa Marítima e Capitão do porto de Díli, que relata que, com “Díli mergulhado num silêncio e numa escuridão impressionantes, embarca na lancha ‘Tibar’ pelas 21,30 horas, juntamente com o governador e o seu Estado Maior, comentando que “depois de quatro séculos de permanência em Timor os portugueses partem”, mas com o refrigério — porventura não inteiramente consolador: “Comigo apenas trago a Bandeira Nacional que a Armada manteve sempre içada na Estação Radionaval de Díli, reduto dos últimos marujos nos mares do Sul”.
Apenas, no Largo do Infante, em frente ao Palácio das Repartições, ficou, drapejando ao vento, a Bandeira Verde-Rubra das quinas que, no dia 17 de Agosto, fora içada, tendo como assistentes, julgo que os únicos, um Goês e um Algarvio: o José Noronha e eu, vinte e um anos amando e dedicando toda a sua juventude à ilha… também Verde-Rubra.
A Bandeira de Portugal — primeiramente azul e branca, e depois, com a República, verde e vermelha — que durante séculos flutuara nos céus luminosos da ilha do sândalo e dos valorosos Mau-Beres, ali ficou hasteada até que, às 17h55m da tarde de 28 de Novembro de 75, foi arreada, porque, com a proclamação da independência, naquela data e unilateralmente, deixara de representar (embora por pouco tempo, e não confirmado pelas Nações Unidas), o o novo Estado da República Democrática de Timor-Leste, designando como seu primeiro presidente Francisco Xavier do Amaral, o qual, pouco tempo depois, era demitido pelos seus camaradas, acusado de traição. Segundo parece, a proclamação era para ser feita no dia 1 de Dezembro, — aniversário de feito semelhante, executado por um grupo de portugueses, para se livrarem do jugo espanhol —, e só não foi porque a Fretilin, vendo o tempo a faltar-lhe, num acto de desespero, se precipitou a a fazê-lo.
CONTINUAREI…