penas roias (mogadouro) local mítico da minha infância

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A M Pires Cabral

Yesterday at 11:32

mais fotos e texto meu adiante

crónica 58.5.setº 2008

Lembrava-me sempre dos fraguedos de Penas Roias (onde fora pela primeira vez em 1962), e da famosa arca do cura dessa aldeia esquecida, onde só regressaria no conforto do alcatrão em 2004.

setº 2008

Uma das cenas mais marcantes destas várias férias transmontanas ocorreu, não recordo exatamente, mas foi entre 1962 e 1964, quando juntamente com os dois primos e o meu pai fomos de jipe a Penas Roias, a uns 7 km do Azinhoso, mas que à época parecia distar mais duma hora e meia. Penas Roias é um dos povoados acastelados com pinturas rupestres (Fraga da Letra de Penas Roias) que pertenceu à Ordem dos Templários e depois entrou em declínio.

Embora tradicionalmente se afirme a data de 1166 como a de início da construção do Castelo de Penas Roias, sob a direção do Mestre da Ordem D. Gualdim Pais, a inscrição epigráfica na Torre de Menagem encontra-se bastante deteriorada. É possível, entretanto, ler-se a data como “Era 1210” (da Era Hispânica, correspondente ao ano de 1172 da Era Cristã) ou ainda Era 1219 (correspondente a 1181). Alguns autores pretendem ler nela o nome de Gualdim Pais, o que não é plenamente verificável. De qualquer modo, os trabalhos contaram com o seu patrocínio direto, uma vez que a torre (e o castelo) inscrevem-se no movimento maior de construção de castelos templários no país, todos assinalados por inscrições epigráficas e empreendidos por Gualdim Pais, como os de Almourol, Longroiva, Tomar e outros. Sob o reinado de D. Sancho I (1185-1211), empreendeu-se novo esforço de repovoamento da vila, que passou a sede de Concelho. Nesta fase, a Ordem deslocava a sua atuação mais para o Sul, para a Beira Baixa, tendo recebido os domínios de Idanha-a-Velha e de Monsanto, em 1165 (os da primeira confirmados em 1197), e uma parcela junto à Vila Velha de Ródão, em 1199. O castelo dominava, à época, a pequena povoação de Penas Roias, ligeiramente afastada. Posteriormente, sob o reinado de D. Afonso III (1248-1279), a vila encontra-se referida nas Inquirições de 1258, tendo recebido Carta de Foral, juntamente com Mogadouro, em 1272, foral esse renovado a Penas Roias no ano seguinte (1273). Diante da extinção da Ordem do Templo, D. Dinis (1279-1325) transferiu os domínios de Penas Roias para a Ordem de Cristo (1319), acreditando-se que tenham tido lugar trabalhos de recuperação e reforço das defesas à época. Conforme a iconografia de Duarte de Armas (Livro das Fortalezas, c. 1509), a vila encontrava-lhe murada. Nesta fase, D. Manuel I (1495-1521) concedeu-lhe o Foral Novo (1512).

No início de 1960 ainda não havia estrada, apenas um caminho de burros serra acima e nem se pensava sequer na mais recente barragem de Bastelos que está aos seus pés. Por isso entramos no jipe do meu primo médico, Zeca, e com o primo Carlos Alberto e o meu pai, um pouco temerosos, que eles não eram para grandes aventuras motorizadas, lá fomos atravessando um rio (a Ribeira de Bastelos), e por entre montes e rochas despidas de vegetação se subiu o fraguedo que se erguia a pique nos socalcos do velho castelo. Passava-se pela velha ponte romana ou ponte templária entre Azinhoso e Penas Roias, monumento hoje completamente ao abandono até se chegar à “fonte da Vila” monumento interessante de grande antiguidade com figuras antropomórficas que hoje também demonstra enorme desprezo. As silvas e arbustos que lhe crescem na cobertura estão lá para o provar.

A certa altura o jipe aberto voltou-se (capotou) e tivemos todos de saltar para não ficarmos debaixo. Lá o endireitamos e voltamos a subir até ao castelo onde o senhor padre, numa habitação ao lado do mesmo, nos ofereceu de dentro da sua bem recheada arca em madeira uns ricos chouriços com pão de centeio e bom vinho da região. Jamais esqueci esta aventura que me marcou para eu mesmo fazer viagens semelhantes para o resto da vida.

Castelo de Penas Roias (Mogadouro)

Em 2008 tive a oportunidade de contar esta mítica viagem histórica a um filho desse meu primo Zeca (que eu não conhecia pois não o via desde que era miúdo e aqui esteve colocado na PSP no Nordeste).

O castelo de Penas Roias é um Castelo roqueiro de origem anterior à nacionalidade, foi seu detentor Fernão Mendes, o Braganção, ao tempo tenens da Terra de Bragança, circunscrição na qual a localidade estava inserida.

Este facto sugere que, por essa altura, já existiria um reduto defensivo de alguma importância, pois, de outra forma, não se justificaria a doação aos Templários. A ser assim, poderão ganhar nova relevância os vestígios de torreões de planta circular, que ainda se encontram nos vértices do castelo.

Estes elementos não são comuns na nossa arquitetura militar medieval setentrional (que optou, na maioria dos casos, por torres de planta quadrangular) e podem estar associados a uma fase construtiva mais ligada à realidade leonesa (os castelos da margem direita do rio Côa optaram sistematicamente por esta solução).

Os estudos mais recentes de Mário Barroca, sugerem uma anterioridade dos torreões circulares de Penas Róias em relação à obra templária[1] Fernão Mendes de Bragança, em 1145, no tempo de D. Afonso Henriques, doou-o aos Templários.

Entre outras obras ergueu-se a torre de menagem por volta de 1172, conforme inscrição aí existente. Após a extinção da ordem do Templo o castelo passou à ordem de Cristo e mais tarde aos Távoras. Em 1758 já se encontrava em avançado estado de ruína.

Atualmente resume-se a pouco mais que uma torre alcantilada, de planta quadrangular com 5 metros de lado, de aparelho simples à base de xisto quartzítico misturado com argamassa.

A estrutura frágil da torre não permite o acesso à mesma. Perto dela existe uma pequena torre circular com uma base em talude de execução recente. A cantaria predomina nas janelas existentes a sul e a este. A porta situa-se a oeste, a cerca de seis metros de altura, e é igualmente feita de cantaria. No lintel podemos observar a cruz pátea templária com a seguinte inscrição:

“Gualdim Pais, mestre geral dos Templários, mandou fazer o castelo de Pena Roia, iniciando os trabalhos a 4 das Calendas de … era de 1204 sendo freires assistentes frei João Francisco …”.

Penas Róias teve muralha, ainda desenhada por Duarte d’Armas no início do século XVI.

[1] ver http://www.culturanorte.pt/pt/patrimonio/castelos/castelo-de-pena-roias/#sthash.nxefuFyv.dpuf –