PATRIMÓNIO FAIAL

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Igreja do Carmo na Cidade da Horta
O TEMPO PASSA E CRESCE A ANGÚSTIA DE ALGUNS PROJETOS SEM FIM À VISTA!
Foi em 2008 que aceitei o grande desafio de presidir a uma comissão, formada por D. António de Sousa Braga, para a reorganização e gestão do Património do Carmo e Museu de Arte Sacra.
A Igreja de Nossa Senhora do Carmo, na cidade da Horta, foi o primeiro templo carmelita a ser construído, a nível nacional, fora de Portugal continental e serviu como um convento de ligação intercontinental dos Carmelitas entre a Europa e a América.
Esta majestosa igreja começou a ser edificada em 1698, ficando concluída apenas no século seguinte, e marca de forma imponente a cidade da Horta. Para além de apresentar uma grandiosa fachada em estilo barroco, foi, juntamente com o Convento do Carmo que lhe está anexo, construída em local sobranceiro à cidade, permitindo ser facilmente observada por quem chega ao Faial por via marítima.
Sem sofrer obras de manutenção adequadas ao longo do tempo, a degradação daquele templo foi-se acentuando e agravou-se com o sismo de 1998 que abalou, especialmente, as ilhas do Faial e do Pico.
Em agosto de 1998, foi reaberto o concurso para a execução da obra de «consolidação e restauro» daquela igreja, um processo de recuperação que se previa longo. Porém, as obras foram suspensas pela Ordem Terceira do Carmo, em setembro de 2001, por tempo indeterminado, por falta de financiamento.
Dada a grandeza, complexidade e estado elevado de degradação em que se encontrava este edifício e o seu acervo, houve a necessidade de criar um plano de intervenção a longo prazo que pudesse reorganizar e recuperar este imenso e rico património.
A grande prioridade deste grupo de trabalho foi fazer um ponto da situação das obras que tinham sido lamentavelmente interrompidas pela Ordem Terceira do Carmo em 2001. Para tal não tivemos acesso ao projeto nem a qualquer tipo de documentação que nos esclarecesse das causas que levaram à interrupção das obras. Contudo, teríamos de agir rapidamente pois era urgente salvaguardarmos as imagens, paramentos e outras alfaias que estavam em vias de se perder devido ao alto estado às infiltrações e degradação do pré-fabricado que acondicionava parte do acervo da Igreja do Carmo.
Com base num inventário cedido amavelmente pelo Museu da Horta começámos este árduo trabalho. Com a ajuda de alguns voluntários e com a colaboração do Governo Regional dos Acores, parte deste acervo foi retirado do pré-fabricado, transportando e acondicionado na Matriz da Horta e na Igreja do Carmo. Apesar da Igreja do Carmo necessitar de intervenções profundas para sanar as muitas infiltrações existentes no edifício, encontraram-se alguns espaços onde foi possível guardar este extenso património.
Em 2012, a Ordem Terceira do Carmo e o Governo Regional dos Açores, suportaram financeiramente as obras no valor aproximado de cem mil euros para sanar as muitas infiltrações detetadas na Igreja do Carmo.
Nos anos consequentes, surgiram muitas indefinições quanto ao futuro e função desta igreja e apesar de todas as propostas, soluções e promessas, nada se concretizou para avançarmos com as obras, mesmo que de uma forma faseada.
Passados cerca de três anos, foram tomadas decisões decisivas e importantes. Da parte da Ordem Terceira do Carmo não havia cabida financeira para assumir as obras de reabilitação e conclusão da igreja e também por não haver um compromisso que fosse claro e efetivo por parte do Governo Regional para assumir tal financiamento. Contudo, há que ter em conta que o Governo Regional tinha assumido a derrapagem financeira aquando a interrupção das obras por falta de financiamento por parte do dono da obra (Ordem terceira do Carmo). Entre esta derradeira situação e a necessidade imperiosa de fazermos alguma coisa por este vasto e rico património. Graças à generosidade de alguns voluntários e da comunidade local, foi possível por mãos à obra e começar a trabalhar pela reabilitação desta Igreja muito queria aos faialenses e a todos os carmelitas. Em consequência da venda de um prédio/habitação degradado da Ordem Terceira do Carmo, avançou-se para a recuperação da Capela dos Terceiros, zonas anexas e Consistório da Igreja do Carmo. Foi um investimento na ordem dos cinquenta mil euros, suportados inteiramente pela Ordem Terceira do Carmo. Tudo foi feito por administração direta e através de pequenos orçamentos contratualizados diretamente com os trabalhadores.
Assim, foram criadas as condições para retomar o culto na Capela dos Terceiros e aquele espaço, em tempos abandonado, começou a ganhar uma nova vida. Seria injusto da minha parte se não fizesse referência ao esforço e à comparticipação financeira que a Câmara Municipal da Horta realizou em todas estas iniciativas que permitiram revalorizar aquela zona da cidade.
Foi a vontade e o espírito de fazer mais e melhor por esta causa que em 2017 decidimos dar mais um passo e avançar para a reabertura da Igreja, fechada desde 1996.
Para quem conhecia o cenário dantesco com que nos deparávamos no interior deste templo, sabe bem valorizar o muito que se fez para reabrir esta igreja. Desde os pavimentos no corpo principal do edifício, capela-mor e cripta, teto do alto coro, portas, janelas, limpeza e recuperação da cantaria interior e pórtico exterior, pinturas, eletricidade, bancada, cadeiral da capela-mor, guarda-vento, som, altar, ambão, etc…muito se fez para além daquilo que estava programado e orçamentado. Reunindo esforços e criando algumas sinergias locais, como a Câmara Municipal da Horta, Junta de Freguesia da Matriz, empresas locais e alguns mecenas generosos, foi possível realizarmos a obra e reabrir a Igreja do Carmo no dia 29 de julho de 2018. Foi um dia feliz e inesquecível para a nossa Ilha e para todos aqueles que empreenderam esta empreitada.
Constituído e nomeado o Conselho para os Assuntos Económicos da Igreja do Carmo, foram realizados vários estudos e orçamentos para o restauro dos altares, estabelecendo as prioridades de ação e intervenção.
Depois de concluídos os orçamentos e realizada a candidatura para a Direção Regional da Cultura, foi-nos comunicado quase um ano depois, que não havia enquadramento legal para apoiar a Igreja do Carmo no restauro dos seus altares.
Com vista a uma solução que pudesse prever financiamento legal para intervir nesta igreja, foi em boa hora que o grupo parlamentar do PSD sugeriu avançar-se para a proposta de classificação da Igreja do Carmo como monumento de interesse regional.
Atendendo à importância que têm para as nossas sociedades as questões patrimoniais, a ausência de uma classificação deste grandioso monumento, parecia ser um sinal de um certo desconhecimento da importância história e patrimonial da Igreja do Carmo no contexto dos monumentos religiosos existes nos Açores.
Numa conferência e mais tarde num livro intitulado “A Igreja do Carmo- Um Património a redescobrir” tive a oportunidade de chamar a atenção para a necessidade da classificação deste monumento:
“Atendendo que esta foi a primeira Igreja Carmelita a ser fundada fora do território nacional, atendendo ser considerada como uma das maiores, senão a maior Igreja dedicada a Nossa Senhora do Carmo em Portugal, atendendo que foi considerada como um convento intercontinental dos carmelitas, plataforma entre a Europa e a América, atendendo ao seu percurso histórico, atendendo ao seu rico acervo patrimonial, atendendo ao facto desta igreja ser muito procurada por visitantes do continente português e do estrangeiro por conter o maior arco abatido, não suportado de Portugal, nada justifica que até ao momento este monumento não tenha sido classificado. A julgar pelas classificações de interesse regional que são feitas hodiernamente, parece-nos no mínimo estranho que isto não tenha acontecido até ao momento.”
Apresentada esta possibilidade, estava aberto um caminho de esperança para retomarmos este processo, pois a partir da classificação, poderíamos realizar uma candidatura que tivesse finalmente um enquadramento legal de apoio.
Depois da classificação, surgiu o problema de registar a Igreja, pois a legislação dizia que um edifício em vias de classificação não pode ser registado. Foi então que o processo sofreu mais um revés. Felizmente, tudo foi superado e atualmente estamos à espera que o edifício seja classificado para avançarmos com as candidaturas para a Direção Regional da Cultura.
É urgente avançarmos! É importante para o conhecimento público, que desde 2008 até aos nossos dias, já assisti à triste derrocada do Altar do Senhor dos Aflitos e neste momento está em perigo de ruir o Altar de São Francisco de Paula. Infelizmente, se não for através de um apoio por via de uma candidatura ou outro género de comparticipação, será impossível resgatar este rico património.
Em julho de 2020 fui nomeado Diretor do Museu de Arte Sacra da Horta e encarregue de proceder à realização dos estatutos e instalação do Museu de Arte Sacra da Horta na Igreja do Carmo. Este museu passou a ser constituído por um rico acervo patrimonial da Diocese de Angra e das suas paróquias, das Ordens Terceiras do Carmo e São Francisco e da Matriz do Santíssimo Salvador da Horta. Para a instalação do Museu de Arte Sacra na Igreja do Carmo houve a necessidade de fazermos obras em salas anexas à Igreja procedermos ao ponto de situação do acervo patrimonial dos vários espólios do antigo Museu de Arte Sacra e Etnografia religiosa que teve como seu fundador e grande impulsionador o Monsenhor Júlio da Rosa. Algum do espólio que passou a fazer parte das várias exposições visitáveis estava em depósito no Museu da Horta desde o Sismo de 1998. Assim, houve necessidade que de procedermos ao levantamento parcial das peças que estavam em depósito no Museu da Horta.
Juntamente a uma dimensão artística, histórica e cultural que importa realçar, o novo e recém Museu de Arte Sacra da Horta sediado na Igreja do Carmo, passou a ter uma função pastoral que o diferencia das demais tipologias de museus e sobre a qual gravitam as tradicionais funções museológicas. As funções de estudo e investigação, incorporação, inventário e documentação, conservação são cruciais no trabalho futuro a desenvolver por esta instituição.
Para que o Museu de Arte Sacra fosse instalado na Igreja do Carmo foi realizado um grande investimento que contou com a participação financeira da Câmara Municipal da Horta, Ordem Terceira do Carmo e um mecenas anónimo.
Ultimamente, fruto de uma visita à Igreja do Carmo e Museu de Arte Sacra, o Senhor Presidente do Governo dos Açores comprometeu-se em ajudar financeiramente em algumas despesas realizadas aquando a instalação do Museu de Arte Sacra e também colocou a hipótese da realização de um protocolo anual que possa contribui com despesas ordinárias para manter aberta esta instituição cultural que constitui uma mais valia cultural para o Faial e para os Açores.
O Reitor da Igreja do Carmo
Pe. Marco Luciano da Rosa Carvalho
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Sobre CHRYS CHRYSTELLO

Chrys Chrystello jornalista, tradutor e presidente da direção da AICL
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