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  • Solar dos Pimentel em Castelo Branco, Mogadouro

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    O solar com 365 portas e janelas,por Tiago Patrício

     

     

    O solar com 365 portas e janelas,por Tiago PatrícioNuma aldeia chamada Castelo Branco viveu um professor dedicado, que escrevia ensaios rigorosos sobre a origem da linguagem nos seres humanos, a sua evolução geográfica e temporal nas diferentes ramificações regionais. Estudava há mais de 15 anos, vários manuscritos sobre a ligação entre a linguagem do planalto mirandês e a do antigo leonês do outro lado do rio Douro, quando numa tarde de Verão, por entre alguns manuscritos amarelados viu um minúsculo grilo branco passear-se entre as iluminuras. Aproximou a vista do recanto da folha onde o insecto se movia com pertinácia e ficou muito tempo a contemplar os seus movimentos graciosos e a sua armadura de quitina. Pegou numa lupa e ficou atento à cadência das antenas e dos apêndices quase até ao fascínio, depois nas patas e peças bucais da mesma cor e graciosidade. Quando a luz do dia desceu a partir da janela, levantou os olhos para fora da sala e acendeu o candeeiro, quando olhou de novo para a secretária, o pequeno grilo tinha desaparecido por entre os outros papéis espalhados na mesa de trabalho.
A recordação de ternura por cada movimento do grilo, que caminhava indiferente e cândido aos registos ou à literatura entre os pesados volumes da história da língua, fê-lo regressar ao início das coisas, à persistência da memória, ao compasso assimétrico entre manter uma família e um espaço suficiente para uma descendência imaginária e a escolha solitária das ciências exactas e da escrita, numa reverência à história antiga.
A sua casa era um jazigo do tamanho de um solar com 365 portas e janelas, mandado construir pelo avô, para harmonizar o trabalho do campo com a vida dos filhos e as estações do ano, que agora estava vazia de gente e forrada de livros para o isolar da passagem do tempo. Conhecia a grafia e a fonética de todos os alfabetos usados na Europa ocidental, para além do Árabe clássico e mesmo alguns dialectos africanos das colónias portuguesas. As suas viagens antes do isolamento não foram apenas uma perda irremediável de tempo ou de energia e trouxe consigo o peso de muitas vidas que tentava reproduzir contra os seus olhos cansados e as mãos trementes.
Já o sol tinha descido abaixo do nível da janela quando começou a desenhar o grilo branco de memória e a seguir pegou ao acaso numa das folhas dos manuscritos, dobrou-a várias vezes até obter a figura aproximada de um grilo preenchido com letras de imprensa. Depois passou à sala onde mantinha a colecção de artrópodes em pequenas caixas de vidro e retirou com cuidado a pilha de livros que ocupava o vão da pequena janela, que o avô só usava nos anos bissextos e ficou de livros nos braços a olhar os campos de trigo e as papoilas complementares na mancha verde do ocaso. Pousou os livros e abriu a janela com esforço e sentiu o vento fresco de Abril na face cansada e deixou a folha de papel em forma de grilo no parapeito, para que fosse levada pela aragem da tarde. Quando voltou às borboletas, escaravelhos, coleópteros, aracnídeos e grilos pretos fixos com alfinetes, perdeu o sentido de utilidade nos dias passados a seleccionar, catalogar e conservar os animais para o arquivo encerrado naquela sala sem vida.
Quando desceu as escadas a custo encontrou o caseiro à entrada com o chapéu torcido nas mãos e o rosto contraído, com o susto de ver a janela abrir-se num ano regular e o receio do patrão estar contrafeito com alguma coisa.
Depois dessa tarde, o Homem, deixou de subir aos andares de cima, escolheu um dos quartos mais soalheiros no rés-do-chão, reabriu o salão de jantar e dedicou-se a ver passar o tempo no alpendre das traseiras e a apreciar o a azáfama da mulher e dos filhos do caseiro na horta ou das carroças dos aldeões no lado da estrada.
Muitos anos depois da sua morte, um estudioso das bibliotecas e arquivos perdidos que vivia em França, farejou o rasto desse homem através de uma conversa ocasional escutada num bar de emigrantes portugueses, que descreviam essa casa com 365 portas e janelas, entulhada de livros e bugigangas até ao tecto. Esse professor e coleccionador exótico de livros antigos estava dado como perdido para os estudiosos na matéria, assim como toda a sua colecção, porque as referência apontavam para um território difuso entre Castela-Leão, Trás-os-Montes e as Beiras.
Com o orçamento de um projecto de estudo para reencontrar a colecção, o estudioso decidiu embarcar no Sud-Express até ao local assinalado no mapa com o nome da terra escutado aos emigrantes, Castelo Branco. Quando chegou a Salamanca, depois de três dias de viagem nas liteiras entabulou conversa com um Engenheiro Civil português que regressava de um mês de férias em Paris e vinha maravilhado com a paisagem humana parisiense. Contou-lhe, ainda surpreendido, a entrevista com uma empregada de uma perfumaria com quem tinha passeado no Sena e o tinha demovido de ir à Ópera ver as Valquírias de Wagner, por ser uma peça muito longa e pesada, para um português acabado de chegar à cidade incandescente.
Quando se aproximavam do entroncamento de Fuentes de San Esteban, o Engenheiro anunciou que ira sair e apanhar a ligação para Trás-os-Montes e o francês despediu-se dele com alguma pena por não poder prolongar a conversa, contou-lhe o motivo da viagem e o entusiasmo em estar tão próximo de encontrar a biblioteca de 365 portas e janelas. Nessa altura os olhos do Engenheiro brilharam e com uma pancada forte nas costas, disse-lhe que saísse já ali porque a casa ficava numa aldeia perto da fronteira e não na cidade da Beira Baixa.
O francês ficou atrapalhado mas confiou na palavra e nas informações adicionais que o Engenheiro avançava sobre a casa cheia de livros e abandonada há vários anos, enquanto arrumava as malas e a roupa de viagem sob a excitação do outro. Era uma tarde fria de Junho que os esperava, quando ajudados pelos carregadores, entraram na carruagem de 1ª classe do comboio a vapor que seguiria até à linha do Douro.
Depois de la Fregeneda, na zona dos precipícios, túneis extensos e pontes metálicas sobre o rio Águeda ao fundo, o francês começou a fartar-se das explicações matemáticas sobre a engenharia ferroviária e a recear pela segurança com as oscilações da pesada máquina a vapor sobre as passagens estreitas nas veredas. Depois da Barca d’Alva o comboio seguiu mais a direito e rente ao rio e aquele susto inicial deu lugar a um certo apaziguamento pela presença sideral da paisagem. Trocaram para uma automotora de via estreita na estação do Pocinho e deixaram o Douro para trás numa subida lenta e íngreme até ao planalto. Nessa altura o francês já tinha aceite o convite para pernoitar na casa do engenheiro em Carviçais e seguir no carro dele até Castelo Branco no dia seguinte.
Foi uma noite longa, depois do jantar com os pais do Engenheiro no serão à lareira, o estudioso francês teve de satisfazer a curiosidade do pai e do filho que traduzia as inquietações do velho pelos maus exemplos que chegavam de França. A casa ficava mesmo ao lado da igreja pesada de granito e durante a noite teve dificuldade em adaptar-se ao o toque do relógio da igreja de 15 em 15 minutos. Na manhã seguinte acordou com o som das carroças e das ferraduras dos animais na calçada, levantou-se para tomar o pequeno almoço e não escondeu o espanto pela mesa com pratos cheios de batatas, feijão, carne de porco, couves, pão e vinho tinto.
Arrancaram de barriga cheia, depois de uma pequena visita obrigatória pela aldeia e no resto do caminho o Engenheiro insistia em explicar os nomes e a história das aldeias por onde passavam. Cruzaram-se com o comboio na estação de Freixo de Espada-à-Cinta e com muitas pessoas que caminhavam descalças ou montadas nos burros pela estrada nessa manhã e ficaram na memória do francês.
Viajavam devagar devido às curvas e à largura do caminho esburacado e por vezes o Engenheiro contava episódios da viagem a Paris e de como os achava muito cultos. Confessou que deixou os museus para quando estivesse reformado e queixou-se apenas dos empregados de balcão que exigiam sempre gorjeta e das prostitutas que só se despiam depois do dinheiro na mão.
Quando passaram a placa com o nome da aldeia o francês começou a olhar em todas as direcções para encontrar o solar, mas uma carroça carregada de nabos que seguia à frente do carro impedia-os de ultrapassar. Nos breves minutos de impaciência, o estudioso francês ficou para sempre a lembra-se do olhar silencioso da mulher de negro sentada na carga, de frente para eles, com a cabeça coberta e o nariz disfarçado entre as rugas da cara escura, que extinguiam a voz esganiçada do Engenheiro e o atingiam num estremecimento que subia aos olhos. Depois a carroça cortou por um caminho à direita e desapareceu por trás de casas ou palheiros onde havia roupa estendida à porta.
Quando o solar apareceu debruçado sobre a estrada os pensamentos do francês já estavam tão perturbados pelo cansaço da viagem e a ruína do país, que só reparou no casarão a contraluz pela cotovelada do Engenheiro. Estava abandonado, com uma parte do telhado caída mas uma fogueira próxima denunciava uma certa actividade.
Quando saíram do carro em direcção ao portão, o relógio da aldeia dava o sinal do meio-dia e à volta da fogueira um homem preparava o almoço e protegia a cara das labaredas amarelas, azuis e esverdeadas, naquele dia de Primavera. Havia outros que transportavam cimento e tijolos para dentro da casa e o francês pediu ao engenheiro para lhes perguntar pelo dono da casa, enquanto reparava que as portas e as janelas escuras eram como órbitas de uma casa vazia. Depois encaminhou-se até à caixa de onde os trabalhadores tiravam gravetos para atiçar as chamas e começou a tropeçar em restos de livros espalhados pelo chão, com as páginas rasgadas e dissolvidas na lama. Desesperado pelos risos alarves dos homens numa língua que não compreendia, confirmou que estavam a alimentar a fogueira com livros inteiros que se consumiam em chamas de várias cores e crepitavam em línguas mortas e discursos ininteligíveis de pânico ou libertação.
Atirou as mãos à cabeça e afastou-se da casa ao longo do muro a disparar nomes estrangeiros e frases incompletas até chegar ao início de um bosque fechado. Sem querer entrar na sombra voltou a olhar o casarão iluminado pelo sol forte do meio-dia e sentou-se na erva do terreno, com os joelhos encostados ao peito e rodeado pelo crepitar de grilos brancos que saiam das tocas e andavam de cá para lá, como se há muito não escutassem a vocalização característica da angústia num homem encurvado.
Nota do editor:foto retirada da netNuma aldeia chamada Castelo Branco viveu um professor dedicado, que escrevia ensaios rigorosos sobre a origem da linguagem nos seres humanos, a sua evolução geográfica e temporal nas diferentes ramificações regionais. Estudava há mais de 15 anos, vários manuscritos sobre a ligação entre a linguagem do planalto mirandês e a do antigo leonês do outro lado do rio Douro, quando numa tarde de Verão, por entre alguns manuscritos amarelados viu um minúsculo grilo branco passear-se entre as iluminuras. Aproximou a vista do recanto da folha onde o insecto se movia com pertinácia e ficou muito tempo a contemplar os seus movimentos graciosos e a sua armadura de quitina. Pegou numa lupa e ficou atento à cadência das antenas e dos apêndices quase até ao fascínio, depois nas patas e peças bucais da mesma cor e graciosidade. Quando a luz do dia desceu a partir da janela, levantou os olhos para fora da sala e acendeu o candeeiro, quando olhou de novo para a secretária, o pequeno grilo tinha desaparecido por entre os outros papéis espalhados na mesa de trabalho.
    A recordação de ternura por cada movimento do grilo, que caminhava indiferente e cândido aos registos ou à literatura entre os pesados volumes da história da língua, fê-lo regressar ao início das coisas, à persistência da memória, ao compasso assimétrico entre manter uma família e um espaço suficiente para uma descendência imaginária e a escolha solitária das ciências exactas e da escrita, numa reverência à história antiga.
    A sua casa era um jazigo do tamanho de um solar com 365 portas e janelas, mandado construir pelo avô, para harmonizar o trabalho do campo com a vida dos filhos e as estações do ano, que agora estava vazia de gente e forrada de livros para o isolar da passagem do tempo. Conhecia a grafia e a fonética de todos os alfabetos usados na Europa ocidental, para além do Árabe clássico e mesmo alguns dialectos africanos das colónias portuguesas. As suas viagens antes do isolamento não foram apenas uma perda irremediável de tempo ou de energia e trouxe consigo o peso de muitas vidas que tentava reproduzir contra os seus olhos cansados e as mãos trementes.
    Já o sol tinha descido abaixo do nível da janela quando começou a desenhar o grilo branco de memória e a seguir pegou ao acaso numa das folhas dos manuscritos, dobrou-a várias vezes até obter a figura aproximada de um grilo preenchido com letras de imprensa. Depois passou à sala onde mantinha a colecção de artrópodes em pequenas caixas de vidro e retirou com cuidado a pilha de livros que ocupava o vão da pequena janela, que o avô só usava nos anos bissextos e ficou de livros nos braços a olhar os campos de trigo e as papoilas complementares na mancha verde do ocaso. Pousou os livros e abriu a janela com esforço e sentiu o vento fresco de Abril na face cansada e deixou a folha de papel em forma de grilo no parapeito, para que fosse levada pela aragem da tarde. Quando voltou às borboletas, escaravelhos, coleópteros, aracnídeos e grilos pretos fixos com alfinetes, perdeu o sentido de utilidade nos dias passados a seleccionar, catalogar e conservar os animais para o arquivo encerrado naquela sala sem vida.
    Quando desceu as escadas a custo encontrou o caseiro à entrada com o chapéu torcido nas mãos e o rosto contraído, com o susto de ver a janela abrir-se num ano regular e o receio do patrão estar contrafeito com alguma coisa.
    Depois dessa tarde, o Homem, deixou de subir aos andares de cima, escolheu um dos quartos mais soalheiros no rés-do-chão, reabriu o salão de jantar e dedicou-se a ver passar o tempo no alpendre das traseiras e a apreciar o a azáfama da mulher e dos filhos do caseiro na horta ou das carroças dos aldeões no lado da estrada.
    Muitos anos depois da sua morte, um estudioso das bibliotecas e arquivos perdidos que vivia em França, farejou o rasto desse homem através de uma conversa ocasional escutada num bar de emigrantes portugueses, que descreviam essa casa com 365 portas e janelas, entulhada de livros e bugigangas até ao tecto. Esse professor e coleccionador exótico de livros antigos estava dado como perdido para os estudiosos na matéria, assim como toda a sua colecção, porque as referência apontavam para um território difuso entre Castela-Leão, Trás-os-Montes e as Beiras.
    Com o orçamento de um projecto de estudo para reencontrar a colecção, o estudioso decidiu embarcar no Sud-Express até ao local assinalado no mapa com o nome da terra escutado aos emigrantes, Castelo Branco. Quando chegou a Salamanca, depois de três dias de viagem nas liteiras entabulou conversa com um Engenheiro Civil português que regressava de um mês de férias em Paris e vinha maravilhado com a paisagem humana parisiense. Contou-lhe, ainda surpreendido, a entrevista com uma empregada de uma perfumaria com quem tinha passeado no Sena e o tinha demovido de ir à Ópera ver as Valquírias de Wagner, por ser uma peça muito longa e pesada, para um português acabado de chegar à cidade incandescente.
    Quando se aproximavam do entroncamento de Fuentes de San Esteban, o Engenheiro anunciou que ira sair e apanhar a ligação para Trás-os-Montes e o francês despediu-se dele com alguma pena por não poder prolongar a conversa, contou-lhe o motivo da viagem e o entusiasmo em estar tão próximo de encontrar a biblioteca de 365 portas e janelas. Nessa altura os olhos do Engenheiro brilharam e com uma pancada forte nas costas, disse-lhe que saísse já ali porque a casa ficava numa aldeia perto da fronteira e não na cidade da Beira Baixa.
    O francês ficou atrapalhado mas confiou na palavra e nas informações adicionais que o Engenheiro avançava sobre a casa cheia de livros e abandonada há vários anos, enquanto arrumava as malas e a roupa de viagem sob a excitação do outro. Era uma tarde fria de Junho que os esperava, quando ajudados pelos carregadores, entraram na carruagem de 1ª classe do comboio a vapor que seguiria até à linha do Douro.
    Depois de la Fregeneda, na zona dos precipícios, túneis extensos e pontes metálicas sobre o rio Águeda ao fundo, o francês começou a fartar-se das explicações matemáticas sobre a engenharia ferroviária e a recear pela segurança com as oscilações da pesada máquina a vapor sobre as passagens estreitas nas veredas. Depois da Barca d’Alva o comboio seguiu mais a direito e rente ao rio e aquele susto inicial deu lugar a um certo apaziguamento pela presença sideral da paisagem. Trocaram para uma automotora de via estreita na estação do Pocinho e deixaram o Douro para trás numa subida lenta e íngreme até ao planalto. Nessa altura o francês já tinha aceite o convite para pernoitar na casa do engenheiro em Carviçais e seguir no carro dele até Castelo Branco no dia seguinte.
    Foi uma noite longa, depois do jantar com os pais do Engenheiro no serão à lareira, o estudioso francês teve de satisfazer a curiosidade do pai e do filho que traduzia as inquietações do velho pelos maus exemplos que chegavam de França. A casa ficava mesmo ao lado da igreja pesada de granito e durante a noite teve dificuldade em adaptar-se ao o toque do relógio da igreja de 15 em 15 minutos. Na manhã seguinte acordou com o som das carroças e das ferraduras dos animais na calçada, levantou-se para tomar o pequeno almoço e não escondeu o espanto pela mesa com pratos cheios de batatas, feijão, carne de porco, couves, pão e vinho tinto.
    Arrancaram de barriga cheia, depois de uma pequena visita obrigatória pela aldeia e no resto do caminho o Engenheiro insistia em explicar os nomes e a história das aldeias por onde passavam. Cruzaram-se com o comboio na estação de Freixo de Espada-à-Cinta e com muitas pessoas que caminhavam descalças ou montadas nos burros pela estrada nessa manhã e ficaram na memória do francês.
    Viajavam devagar devido às curvas e à largura do caminho esburacado e por vezes o Engenheiro contava episódios da viagem a Paris e de como os achava muito cultos. Confessou que deixou os museus para quando estivesse reformado e queixou-se apenas dos empregados de balcão que exigiam sempre gorjeta e das prostitutas que só se despiam depois do dinheiro na mão.
    Quando passaram a placa com o nome da aldeia o francês começou a olhar em todas as direcções para encontrar o solar, mas uma carroça carregada de nabos que seguia à frente do carro impedia-os de ultrapassar. Nos breves minutos de impaciência, o estudioso francês ficou para sempre a lembra-se do olhar silencioso da mulher de negro sentada na carga, de frente para eles, com a cabeça coberta e o nariz disfarçado entre as rugas da cara escura, que extinguiam a voz esganiçada do Engenheiro e o atingiam num estremecimento que subia aos olhos. Depois a carroça cortou por um caminho à direita e desapareceu por trás de casas ou palheiros onde havia roupa estendida à porta.
    Quando o solar apareceu debruçado sobre a estrada os pensamentos do francês já estavam tão perturbados pelo cansaço da viagem e a ruína do país, que só reparou no casarão a contraluz pela cotovelada do Engenheiro. Estava abandonado, com uma parte do telhado caída mas uma fogueira próxima denunciava uma certa actividade.
    Quando saíram do carro em direcção ao portão, o relógio da aldeia dava o sinal do meio-dia e à volta da fogueira um homem preparava o almoço e protegia a cara das labaredas amarelas, azuis e esverdeadas, naquele dia de Primavera. Havia outros que transportavam cimento e tijolos para dentro da casa e o francês pediu ao engenheiro para lhes perguntar pelo dono da casa, enquanto reparava que as portas e as janelas escuras eram como órbitas de uma casa vazia. Depois encaminhou-se até à caixa de onde os trabalhadores tiravam gravetos para atiçar as chamas e começou a tropeçar em restos de livros espalhados pelo chão, com as páginas rasgadas e dissolvidas na lama. Desesperado pelos risos alarves dos homens numa língua que não compreendia, confirmou que estavam a alimentar a fogueira com livros inteiros que se consumiam em chamas de várias cores e crepitavam em línguas mortas e discursos ininteligíveis de pânico ou libertação.
    Atirou as mãos à cabeça e afastou-se da casa ao longo do muro a disparar nomes estrangeiros e frases incompletas até chegar ao início de um bosque fechado. Sem querer entrar na sombra voltou a olhar o casarão iluminado pelo sol forte do meio-dia e sentou-se na erva do terreno, com os joelhos encostados ao peito e rodeado pelo crepitar de grilos brancos que saiam das tocas e andavam de cá para lá, como se há muito não escutassem a vocalização característica da angústia num homem encurvado.
    Nota do editor:foto retirada da net

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  • dicionário açoriano

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    http://www.iloveazores.net/2014/01/grande-dicionario-de-acoriano.html#.U30h9_nauSp

     

    http://www.iloveazores.net/2014/01/grande-dicionario-de-acoriano.html#.U30h9_nauSp

  • fajã de Pedro Velho Santa Maria Açores

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    O SUL, A Fajã de Pedro Velho. Em tempos recuados o lugar que hoje conhecemos como Sul denominava-se Fajã Pedro Velho, por ser esse o nome do dono de aquele lugar. Pedro Velho era descendente de um sobrinho de Gonçalo Velho Cabral. Mais precisamente era neto de Nuno Velho Cabral Travassos e Melo (nasc. 1451), filho de Violante Velho Cabral irmã de Gonçalo Velho. Nuno Velho veio ainda criança para Santa Maria acompanhando o seu tio materno Gonçalo Velho. Do segundo casamento de Nuno Velho com África Anes nasceu Duarte Nunes Velho - pai de Pedro Velho que viria a dar o seu nome à fajã que hoje conhecemos como o Sul. Pedro Velho no seu testamento feito a 10 de Julho de 1587 ordena ser enterrado na igreja matriz na capela do Bom Jesus edificada pelo seu pai e vincula a terça dos seus bens em beneficio da sua alma nomeando administrador do vinculo o seu filho padre José Pimentel Velho. Este filho foi ouvidor eclesiástico em Santa Maria. A primitiva ermida de Nossa Senhora da Piedade na Malbusca foi por ele mandada edificar na propriedade que herdara de seu pai. Apesar desta ermida já não existir o local da antiga edificação está assinalado com uma cruz de pedra. O Padre José Pimentel Velho fez testamento a 6 de Maio de 1594 e mais tarde a 7 de Março de 1630 doou os seus bens a Bárbara Velho, casada com Estêvão Dias de Bulhões, "doou também uma escrava Ana, e Maria sua mãe, e Cosme, escravo baço, recomendando que não os vendam e os tratem bem." Um neto de Bárbara Velho, Padre Bartolomeu de Bulhões por escritura de 18 de Janeiro de 1674, viria a ser o proprietário das terras doadas pelo Padre José Pimentel Velho à sua avó, que incluíam a Malbusca, Sul, Zimbral e casas sobradadas na rua Direita de Vila do Porto (actual Rua Frei Gonçalo Velho). Bartolomeu de Bulhões mandou edificar a ermida de Nossa Senhora da Boa Morte na Fajã Pedro Velho. Em 1886 essa ermida seria construída no lugar do Panasco porque a primitiva, demasiado próxima do mar, fora destruída por um temporal.

    O SUL, A Fajã de Pedro Velho.
    Em tempos recuados o lugar que hoje conhecemos como Sul denominava-se Fajã Pedro Velho, por ser esse o nome do dono de aquele lugar. Pedro Velho era descendente de um sobrinho de Gonçalo Velho Cabral. Mais precisamente era neto de Nuno Velho Cabral Travassos e Melo (nasc. 1451), filho de Violante Velho Cabral irmã de Gonçalo Velho. Nuno Velho veio ainda criança para Santa Maria acompanhando o seu tio materno Gonçalo Velho.
    Do segundo casamento de Nuno Velho com África Anes nasceu Duarte Nunes Velho – pai de Pedro Velho que viria a dar o seu nome à fajã que hoje conhecemos como o Sul.
    Pedro Velho no seu testamento feito a 10 de Julho de 1587 ordena ser enterrado na igreja matriz na capela do Bom Jesus edificada pelo seu pai e vincula a terça dos seus bens em beneficio da sua alma nomeando administrador do vinculo o seu filho padre José Pimentel Velho. Este filho foi ouvidor eclesiástico em Santa Maria.
    A primitiva ermida de Nossa Senhora da Piedade na Malbusca foi por ele mandada edificar na propriedade que herdara de seu pai. Apesar desta ermida já não existir o local da antiga edificação está assinalado com uma cruz de pedra.
    O Padre José Pimentel Velho fez testamento a 6 de Maio de 1594 e mais tarde a 7 de Março de 1630 doou os seus bens a Bárbara Velho, casada com Estêvão Dias de Bulhões, “doou também uma escrava Ana, e Maria sua mãe, e Cosme, escravo baço, recomendando que não os vendam e os tratem bem.”
    Um neto de Bárbara Velho, Padre Bartolomeu de Bulhões por escritura de 18 de Janeiro de 1674, viria a ser o proprietário das terras doadas pelo Padre José Pimentel Velho à sua avó, que incluíam a Malbusca, Sul, Zimbral e casas sobradadas na rua Direita de Vila do Porto (actual Rua Frei Gonçalo Velho).
    Bartolomeu de Bulhões mandou edificar a ermida de Nossa Senhora da Boa Morte na Fajã Pedro Velho. Em 1886 essa ermida seria construída no lugar do Panasco porque a primitiva, demasiado próxima do mar, fora destruída por um temporal.

  • espetacular: vistas aéreas das Flores (Açores)

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    http://www.iloveazores.net/2014/05/espetaculares-imagens-aereas-da-ilha.html#.U3kxjfl_vE0

  • prémio Meendinho para a AICL

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    meendinho

    Vai anexo a proclamação do Prémio Meendinho, abraço, alexandre banhos

     

    O padroado da Fundaçom Meendinho, decidiu que a Comissão promotora da ILP Valentim Paz Andrade; e Os Colóquios da Lusofonia, na pessoa do seu Presidente e impulsionador Chrys Chrystello, foram os ganhadores do Prémio Meendinho 2014.

     

    Aos promotores da ILP: Valentim Paz Andrade, hoje já convertida na Lei da Galiza 1/2014 para o aproveitamento do português e vínculos com a Lusofonia. Por demonstrarem como se faz um trabalho duro e cansativo dum jeito bem abrangente e integrador, e se faz que o esforço alcance sucesso.

     

    Aos Colóquios da Lusofonia, dos que já se realizaram XXI edições, e que se devem à vontade, entusiasmo, e duro trabalho de Chrys Chrystello, do que é inseparável o apoio e contributo decisivo da sua esposa e companheira Helena. Recebem o prémio por muitas e diversas razões das que pomos em destaque as seguintes:

    • Os Colóquios da Lusofonia criaram um espaço de convívio, partilha de experiências e criação de laços solidários muito importantes, entre pessoas de toda a Lusofonia e lusófonos do mundo inteiro.
    • Os Colóquios da Lusofonia ajudaram a difundir os problemas e realidades da nossa língua, desde perspetivas muito originais e integradoras.
    • Os Colóquios da Lusofonia, ajudaram a difundir a realidade do português da Galiza, como o que é, mais um português, infelizmente submetido a asfixia pelo castelhano.
    • Nos Colóquios da Lusofonia, encorajou-se o nascimento da Academia Galega, e foram decisivos os seus trabalhos para o imediato reconhecimento pelas academias parceiras dos distintos estados da nossa língua portuguesa.

    O Prémio Meendinho vai ser entregue à AICL de 25 a 29 de setembro no 22º colóquio da Lusofonia; da que se dará a correspondente publica difusão

    Outros prémios Meendinho: