A televisão continua a ser o maior instrumento de formação política do país, mas o pluralismo que devia existir nos painéis de opinião desapareceu. O que temos são ex-ministros, assessores reciclados e economistas de serviço, quase todos com um alinhamento estável à direita ou, no mínimo, com uma visão que se confunde com a defesa dos interesses instalados. Há anos que se repete o mesmo padrão. Comentadores que se dizem independentes, mas que acabam por justificar as decisões do poder e tratar qualquer crítica como radicalismo.
Os canais de televisão transformaram o comentário político num produto de entretenimento. Não há análise, há posição. Não há debate, há confirmação. É o conforto da narrativa única. A economia está sempre melhor do que parece, os pobres queixam-se demais, as greves são irresponsáveis e o Estado é sempre o problema. Quando alguém tenta contrariar esta lógica, é acusado de ideologia como se o resto fosse neutralidade científica.
Os estudos sobre o assunto são claros. A Universidade Católica identificou o paralelismo político entre televisões e partidos. Ou seja, os comentadores não são escolhidos pela qualidade da análise, mas pelo enquadramento que dão às decisões políticas. É uma forma elegante de domesticar o espaço público. Não se proíbe ninguém de falar, apenas se escolhe quem fala mais.
A direita percebeu isso há muito tempo. Conquistou o espaço mediático sem precisar de o controlar formalmente. Basta garantir que os rostos mais visíveis são os que partilham os mesmos pressupostos ideológicos, como liberalização, disciplina orçamental, meritocracia e desconfiança de tudo o que soe a política social. O resultado é uma hegemonia suave. As opiniões parecem plurais, mas quase todas partem do mesmo ponto.
Entretanto, a esquerda raramente tem presença consistente. Surge esporadicamente, como contraponto ou excentricidade, mas não como referência. Não tem o mesmo acesso nem a mesma máquina mediática. E isso distorce o debate. Quem liga a televisão encontra um retrato do país desenhado por quem vive de o explicar, não por quem vive nele.
A consequência é óbvia. O discurso público desloca-se. Ideias que há dez anos seriam consideradas radicais à direita, como cortes salariais, privatizações totais, desregulação laboral, hoje são apresentadas como senso comum. E quando alguém as contesta, o comentador de plantão levanta a sobrancelha e fala de “populismo” ou “inveja social”. O truque resulta porque se repete todos os dias.
As pessoas acabam por interiorizar a mensagem e confundem opinião com informação. Acreditam que ouvir três comentadores dizerem o mesmo é o equivalente a ouvir três pontos de vista. E quem tenta pensar de outra forma é tratado como um desajustado. A manipulação deixou de precisar de censura. Basta saturar o espaço com a mesma narrativa até parecer verdade.
É este o país que se vê todos os dias nos telejornais. Comentadores que opinam sobre tudo com a segurança de quem nunca é confrontado, jornalistas que fazem de moderadores sem moderar nada e uma audiência que vai absorvendo a convicção de que o mundo é exatamente como lhe é apresentado.