Blog

  • restaurantes não são santuários

    Views: 0

    May be an image of 1 person
    “Restaurantes Não São Santuários”
    ​ por João Pereira Coutinho
    Este texto é dedicado ao “Chef” Avilez, que estragou dois magníficos restaurantes, o Tavares e, principalmente, o Belcanto. E como esta praga não é nacional apenas, dedicado também ao Alain Ducasse, que assassinou o em tempos magnífico Louis XV, o restaurante (emblemático) do Hotel de Paris, em Monte Carlo. Felizmente, neste caso, pelo menos continua a magnífica garrafeira.
    Restaurantes não são santuários…
    Estou cansado da religião dos chefs: restaurantes não são santuários…
    O melhor restaurante do mundo?
    Ora, ora: é o Eleven Madison Park, em Nova York.
    Parabéns, gente.
    A sério.
    Espero nunca vos visitar.
    Entendam: não é nada de pessoal.
    Acredito na vossa excelência.
    Acredito, como dizem os críticos, que a vossa mistura de “cozinha francesa moderna” com “um toque nova-iorquino” é perfeitamente comparável às 72 virgens que existem no paraíso corânico.
    Mas eu estou cansado da religião dos chefs.
    Vocês sabem: a elevação da culinária a um reino metafísico, transcendental, celestial.
    Todas as semanas, lá aparece mais um chef, com a sua igreja, apresentando o cardápio como se fossem as sagradas escrituras.
    Os ingredientes não são ingredientes.
    São “elementos”.
    Uma refeição não é uma refeição.
    É uma “experiência”.
    E a comida, em rigor, não é comida.
    É uma “composição”.
    Já estive em vários desses santuários.
    Quando a comida chegava, eu nunca sabia se deveria provar ou rezar.
    Os meus receios sacrílegos eram acentuados pelo próprio garçom, que depositava o prato na mesa e, em voz baixa, confidenciava o milagre que eu tinha à minha frente:
    – Pato defumado com pétalas de tomate e essências de jasmim.
    Escutava tudo com reverência, dizia um “obrigado” que soava a “amém” e depois aproximava o garfo trêmulo, com mil receios, para não perturbar o frágil equilíbrio entre as “pétalas” e as “essências”.
    Em raros casos, sua santidade, o chef, aparecia no final.
    Para abençoar os comensais.
    No dia em que beijei a mão de um deles, entendi que deveria apostatar.
    E, quando não são santos, são artistas.
    Um pedaço de carne não é um pedaço de carne.
    É um “desafio”.
    É o teto da Capela Sistina aguardando pelo seu Michelangelo.
    Nem de propósito: espreitei o site do Eleven Madison Park.
    Tenho uma novidade para dar ao leitor: a partir de 11 de abril, o Eleven vai fazer uma “retrospectiva” (juro, juro) com os 11 melhores pratos dos últimos 11 anos.
    “Retrospectiva.”
    Eis a evolução da história da arte ocidental: a pintura rupestre de Lascaux; as esculturas gregas de Fídias; os vitrais da catedral gótica de Chartres; os quadros barrocos de Caravaggio; a tortinha de quiche de ovo do chef Daniel Humm.
    Gosto de comer.
    Gosto de comida.
    Essas duas frases são ridículas porque, afinal de contas, sou português.
    E é precisamente por ser português que me tornei um ateu dos “elementos”, das “composições” e das “essências”.
    A religião dos chefs, com seu charme diabólico, tem arrasado os restaurantes da minha cidade.
    Um deles, que fica aqui no bairro, servia uns “filetes de polvo com arroz do mesmo” que chegou a ser o barômetro das minhas relações amorosas: sempre que estava com uma namorada e começava a pensar no polvo, isso significava que a paixão tinha chegado ao fim.
    Duas semanas atrás, voltei ao espaço que reabriu depois das obras.
    Estranhei: havia música ambiente e a iluminação reduzida imitava as casas de massagens da Tailândia (aviso: querida, se estiveres a ler esta crônica, juro que nunca estive na Tailândia).
    Sentei-me.
    Quando o polvo chegou, olhei para o prato e perguntei ao dono se ele não tinha esquecido alguma coisa.
    “O quê?”, respondeu o insolente.
    “O microscópio”, respondi eu.
    Ele soltou uma gargalhada e explicou: “São coisas do chef, doutor.”
    “Qual chef?”, insisti.
    Ele, encolhendo os ombros, respondeu com vergonha: “O Agostinho”.
    O cozinheiro virou chef e o meu polvo virou calamares.
    Infelizmente, essa corrupção disseminou-se pela pátria amada.
    Já escrevi sobre o crime na imprensa lusa.
    Ninguém acompanhou o meu pranto.
    É a música ambiente que substituiu o natural rumor das conversas.
    É a iluminação de bordel que impede a distinção entre uma azeitona e uma barata.
    É o hábito chique de nunca deixar as garrafas na mesa, o que significa que o garçom só se apercebe da nossa sede “in extremis” quando existem tremores alcoólicos e outros sinais de abstinência.
    Meu Deus, onde vamos parar?
    Não sei.
    Mas sei que já tomei providências: no próximo outono, tenciono aprender a caçar.
    Tudo serve: perdiz, lebre, javali.
    Depois, com uma fogueira e um espeto, cozinho o bicho como um homem pré-histórico.
    O pináculo da civilização é tortinha de quiche de ovo do chef Daniel Humm?
    Então chegou a hora de regressar às cavernas de Lascaux…”
    You, Maria Meneses and 15 others
    2 comments
    2 shares
    Like

    Comment
    Share
    2 comments
    View 1 more comment
    • Paulo Roldão

      Nada como a slowfood, ou como dizemos em português, comida de panela. 🙂
  • PICO RECORDE DE PASSAGEIROS EM JANEIRO

    Views: 0

    Pico bate recorde no crescimento de passageiros
    No mês de Janeiro de 2022 desembarcaram nos aeroportos dos Açores 68 806 passageiros, um aumento de 129,2% em relação ao mesmo mês do ano anterior.
    Os passageiros desembarcados com origem noutras regiões do território nacional atingiram 32 446, interilhas 33 029 e internacionais 3 331.
    Relativamente ao número de passageiros embarcados, no total, ascendeu aos 71 828.
    Os valores relativos aos passageiros desembarcados distanciam-se ainda dos registados no mesmo mês de 2020 (-24,1%), aumentando, contudo, 129,2% face a Janeiro de 2021.
    À semelhança dos passageiros desembarcados, os valores relativos aos passageiros embarcados apresentam também uma variação negativa face a Janeiro de 2020 (-23,4%), mas uma variação positiva de 118,1% face ao mesmo mês de 2021.
    Relativamente à tipologia de voo, verifica-se no mês de Janeiro uma variação homóloga positiva de 93,3% dos passageiros embarcados nos voos interilhas, de 132,4% nos voos territoriais e mais de 4 vezes nos voos internacionais.
    Quanto ao desembarque de passageiros, também por tipologia de voo, ocorreu igualmente um aumento mensal homólogo de 94,6% nos voos interilhas, de 159,6% nos voos territoriais e cerca de 6 vezes mais nos voos internacionais.
    Por ilha, todas apresentam variações homólogas positivas, sendo que a que apresenta a maior variação é a do Pico com 174,6% e a menor variação é a de São Jorge com 18,3%.
    No photo description available.
    4
    2 shares
    Like

    Comment
    Share
    0 comments
  • Spain (Chick Corea) by José André Trío – YouTube

    Views: 0

  • Dimash – Ikanaide | 2021 – YouTube

    Views: 0

  • Tom Vinícius Toquinho e Miúcha 06 – Samba de uma Nota Só (One Note Samba) – YouTube

    Views: 0

  • A.T.O.D. International Dance Competition 2021 demi-character solo [PANISA] – YouTube

    Views: 0

  • BESOS – El poema mas romantico de Gabriela Mistral – (Recitado) – YouTube

    Views: 0

  • AO1911

    Views: 0

    estou de accôrdo com o Accôrdo Orthographico actual…embora saiba que com as machinas de escrever eu posso escrever assim: Corographia açórica ou descripção phizica, politica e historica dos Açores por um cidadão açorense ou como diria Anthero Tarquinio de Quental: Portugal perante a revolução de Hespanha: Considerações sobre a philosofia da história litteraria portugueza extrahidas de Fr Alexandre da Sagrada-Familia: Devoção das Dores da Virgem Mãi de Deos por hum seu devoto com Descripção da entrada d’El-Rei, nosso senhor, procissão solemne em acção de graças pelas victorias

    Antero de Quental. Quem foi o poeta que marcou o dia 11 de setembro em  Portugal?

  • Nova Iorque despede três mil funcionários municipais não vacinados

    Views: 0

    Nova Iorque planeia despedir esta sexta-feira cerca de três mil funcionários municipais que recusaram a vacinar -se contra a covid-19, apesar da norma de vacinação obrigatória instituída pela Câmara aos seus trabalhadores, revelou o jornal “The New York Times”.

    Source: Nova Iorque despede três mil funcionários municipais não vacinados