Osvaldo José Vieira Cabral Uma coligação trapalhona e uma oposição brincalhona

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Uma coligação trapalhona e uma oposição brincalhona
É como digo, este governo colecciona trapalhadas à média de uma por mês (já contei 11 desde que tomou posse). E o padrão é sempre o mesmo, ou seja, as polémicas em que se envolve surgem imediatamente a seguir a uma boa prestação, para abafar as boas medidas. Tudo ao contrário de uma boa estratégia de comunicação.
Na última semana bateu todos os recordes. Foram três seguidas, depois de uma boa prestação no parlamento, durante os debates sobre a SATA e as finanças públicas, graças às excelentes intervenções de Duarte Freitas e Berta Cabral.
Tudo foi abafado por mais três casos incríveis de imaturidade política.
A primeira foi aquela nomeação familiar no hospital de Angra, que nunca devia ter ocorrido e que levou dias em lume brando até tomarem uma decisão, que se exigia rápida, para evitar o falatório no espaço público, como se veio a verificar.
As declarações de José Manuel Bolieiro e de Clélio Meneses, completamente desencontradas, agravaram ainda mais a percepção pública, porquanto ficamos sem saber se foi Bolieiro que desautorizou Clélio ou se foi Clélio que desautorizou Bolieiro.
Depois, no parlamento, veio aquela cedência inexplicável ao Chega, para criar um regime transitório destinado aos pescadores da Caloura.
Desde quando se nomeia um grupo de trabalho para estudar uma zona marinha protegida? Se é protegida, ponto final.
Então o Presidente Bolieiro anda nas conferências internacionais a defender mais zonas protegidas e a sustentabilidade das pescas e, depois, cá dentro, dá sinais contraditórios, só para ceder aos caprichos de um deputado?
Por incrível que pareça, o PSD ficou a falar sozinho, pois nem os parceiros da coligação o acompanharam na aprovação da proposta. Mais uma trapalhada humilhante.
A mais surreal estava guardada para o fim.
A questão do saneamento do médico do Corvo é de uma infantilidade política fora de qualquer manual sobre bom senso político. E como se não bastasse, nomeiam para substituí-lo, nada mais nada menos, do que um candidato das listas do PPM! Só visto!
Querem mais claro do que isto sobre as cedências a Paulo Estevão?
O Corvo de 337 eleitores, 115 do PPM+CDS e 64 do PSD, tem vindo a contribuir fortemente para a animada sessão de trapalhadas desta coligação. Foi com o navio “do outro mundo”, que custa uma pipa de massa do outro mundo, foi com o outro caso surreal do boi anão e, agora, mais esta.
Quando se esperava que, depois da remodelação, este governo ganhasse mais músculo político (e mais juízo), eis que consegue fazer ainda pior.
Definitivamente, esta (des)coligação não tem cura.
O PSD, para sair com alguma dignidade disto tudo, no final do mandato, só tem que se apresentar sozinho às próximas eleições regionais, porque se for com esta coligação, em que os mais pequenos estão a devorá-lo, vai ter uma derrota estrondosa.
Em política não há milagres.
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OPOSIÇÃO BRINCALHONA – O PS a falar de contas públicas é como colocar um lobo a tomar conta de um galinheiro.
O que se passou nos últimos anos foi um autêntico forrobodó de dívidas escondidas, que fazem corar qualquer revisor de contas.
E os nossos revisores, os deputados eleitos para escrutinar a governação, passaram ao lado deste descalabro público, especialmente os deputados do PS, que não se questionavam, não perguntavam nada, não desconfiavam de nada e nem se atreviam a levantar um caso que fosse sobre tanta conta duvidosa.
Bem pelo contrário, até havia as “popotas” – lembram-se? – que publicavam artigos em defesa de Sérgio Ávila, elogiando o desconchavo financeiro derramado pelas incontáveis empresas públicas. Eram autênticos brinquedos nas mãos do responsável pelas Finanças.
Agora, era esfregar-lhes as facturas escondidas que vão aparecendo aos poucos, com os enormes calotes que nos deixaram como herança.
O último dos quais, que está a dar brado, é aquele aval a uma empresa privada (Angrasol), assinado por Sérgio Ávila e Vasco Cordeiro, em nome da Ilhas de Valor, a empresa pública profissionalíssima a esconder dívidas de outras, a começar pelos campos de golfe, outro negócio desastroso para empregar os amigos, afilhados e resolver problemas da habitual clientela que adora mergulhar na manjedoura do orçamento público.
Então, um promotor privado encosta o governo à parede porque não consegue uma instituição financeira que financie a empresa no montante que é previsto a empresa contratar com a banca, e o governo cede?
O contrato de concessão de incentivos remete para a empresa a responsabilidade de encontrar financiamento.
Quem estaria em incumprimento seria a empresa e se não conseguisse cumprir não teria incentivo reembolsável e não reembolsável – é uma condição que o promotor tem de cumprir.
Em todos os outros projetos foi assim e, provavelmente, muitos empresários não terão prosseguido com os investimentos exatamente por esta razão – não tinham financiamento bancário para o efeito garantido pelo governo.
O parecer do Prof. Eduardo Paz Ferreira não tem nada para o caso. A pergunta que lhe é feita, ao que parece, é se uma empresa pública pode garantir um empréstimo de um privado. Juridicamente é claro que pode, com ou sem contragarantia. Mas a questão não é essa. A questão é se é justo para com todas as outras empresas (há cerca de 5 mil na região) que não beneficiam de igual procedimento mesmo concedendo uma contragarantia. Muitos gostariam de ter tido este privilégio porque lhes daria mais segurança.
Salvo erro, o montante da garantia não é sobre o projeto todo de 20 milhões de euros (de cuja avaliação podemos e devemos duvidar) mas sim sobre os terrenos de implantação do empreendimento (assunto que devia ser esclarecido, embora seja materialmente irrelevante – o que importa é que o apoio foi discricionário e só para esta empresa. Mas, se a garantia for sobre o terreno, o governo fica com um terreno sobre o qual está construída uma benfeitoria que não é dele mas que beneficiou de 5 milhões de apoios comunitários e de mais 5 milhões de empréstimo disponibilizados por ele).
Nos sistemas de incentivo, pelo que sabemos, o governo tem sempre o poder de obrigar o promotor a devolver os apoios se incumprir alguma das cláusulas – é a regra para todos.
Com este apoio extraordinário o governo distorce a concorrência e viola uma regra sagrada da União Europeia, mais uma vez.
Dito isto, é, na mesma, efetivamente relevante saber o que tem feito a administração da Ilhas de Valor para salvaguardar os interesses da empresa, que são os da Região.
Haverá mais casos semelhantes?
É limpar a casa e fechar aquilo, que só servia para esconder dívida e brincar com os nossos impostos.
As gerações futuras já nascem endividadas e com uma herança de calotes para resolver que só nos envergonha a todos.
Se à direita ninguém se entende e à esquerda só nos deixam dívidas, não será a hora para uma Terceira Via?
Maio 2022
Osvaldo Cabral
(Diário dos Açores, Diário Insular, Multimedia RTP-A, Portuguese Times EUA, LusoPresse Montreal)
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