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QUANTO NOS CUSTA A VIDA
O custo de vida nos Açores está a roçar a dimensão do absurdo.
É um mistério que se agudizou nos últimos anos: porque razão tudo é muito mais caro nos Açores?
Quem vai aos supermercados ou quem toma conhecimento dos pedidos de ajuda alimentar às instituições sociais, fica arrepiado só de saber a quantidade de famílias que vive dias de aflição.
Não há explicação plausível para a subida galopante dos preços, especialmente na área alimentar.
Os transportes são os mesmos, o IVA é mais barato nos Açores e, apesar de importarmos quase tudo, os produtos são mais baratos lá fora do que cá dentro.
Olhando para as taxas mensais da inflação, é notória a subida nos meses de Verão, fruto do aproveitamento da procura do turismo, em que os preços galopam nos hotéis, alojamentos, restauração e supermercados.
Ainda agora, no mês de setembro, as maiores variações médias positivas verificaram-se nas classes “Restaurantes e hotéis”, com um aumento de 6,7%, quando a inflação média nos Açores foi de 1,7%, ou seja seis vezes mais do que a média total da taxa do índice de preços ao consumidor.
Os produtos alimentares não transformados também dispararam para os 5,8% (6,5% em Agosto), quando há um ano andavam apenas nos 0,43%.
Parece que há muita gente que quer ficar rica num sopro, aumentando preços descontroladamente.
Não admira que os turistas nacionais estejam a evitar os Açores, com uma queda de 3,6% em Agosto e de menos 0,6% de Janeiro a Agosto, o que é preocupante, porque o mercado nacional é o nosso mercado turístico por tradição.
Ficar dependente apenas do turismo já é um problema sério para a economia, mas ficar dependente apenas do mercado estrangeiro é um perigo maior para todo o sector, pelo que todos estes constrangimentos deviam merecer uma reflexão séria por parte dos agentes e das autoridades regionais.
Foi agora publicado o “Inquérito sobre as Práticas Alimentares em Portugal 2024”, realizado pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, onde se conclui que o aumento do custo de vida, especialmente na alimentação, tem consequências nos hábitos alimentares da população, consumindo-se mais produtos de marca branca, maior procura de promoções e cozinhando-se “porções mais pequenas e pratos mais simples, com menos ingredientes”.
Comer fora, nos restaurantes, é cada vez mais uma miragem para os locais e o estudo até revela que há famílias a convidarem menos os familiares ou amigos para refeições lá em casa.
Este ‘amplificador das desigualdades’, como diz um sociólogo, atinge em cheio as famílias mais pobres.
Não admira que continuemos como a região do país com a maior taxa de risco de pobreza (24,2%), enquanto a média nacional é de 16,6%.
Se tivermos em conta que, a agravar este aumento brutal do custo de vida, os preços da habitação também atingem o absurdo, então temos uma tempestade perfeita para muitos agregados familiares.
Os dados mais recentes da OCDE, agora publicados, revelam que o preço das habitações no nosso país aumentou 60% em termos reais, entre 2010 e 2024, um aumento anual de 3,4% acima da inflação.
Os rendimentos salariais dos cidadãos não atingem, na sua maioria, este crescimento, fará os pensionistas e reformados.
Outro relatório da Comissão Europeia vem confirmar que o preço da habitação em Portugal é o mais sobrevalorizado da Zona Euro, cerca de 35% acima do valor médio.
Os panfletos turísticos vão anunciando, por todo o lado, que é mais fácil viver nos Açores do que no Continente, o que até pode ser verdade, mas para quem está cá a perspectiva – ou a percepção, como agora está na moda – começa a ser outra.
E isto pode ser bom para os negócios, mas para os consumidores locais não são boas notícias.
Está provado que numa sociedade com elevado custo de vida, sem os rendimentos correspondentes, as consequências são trágicas para o seu desenvolvimento, a começar para a classe jovem, que emigra, e a demografia, que se retrai.
Só com políticas públicas que promovam o crescimento económico é que se registam evoluções demográficas.
Quando as regiões crescem, a par com a concorrência, a população cresce. Quando definham, perdem população, naturalmente, porque os que querem ficar ficam aquém dos que querem partir.
O Instituto Nacional de Estatística acaba de publicar as últimas projecções demográficas do país, com sinais preocupantes para os Açores, onde se prevê que até ao final do século a nossa população pode passar para metade e com um índice elevado de envelhecimento.
Andam os políticos a dar subsídios a quem tem bebés como se um simples subsídio fosse uma solução estrutural.
Criem economia que o resto acerta-se.
O problema é que o tempo dos políticos não é o nosso tempo.
Preocupados com os ciclos eleitorais, os políticos, quando estão no poder, gostam de pintar a realidade como se vivêssemos no paraíso das maravilhas, como ainda agora ouvimos nos discursos pós-eleições.
O cidadão comum que vive no país real há-de pensar que existem dois mundos.
O pior é que vota neste.
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PEDANTISMO – Dizem que a política é muita ingrata.
É verdade, mas os políticos fazem por isso.
Especialmente quando eles manifestam ingratidão aos seus eleitores.
Aconteceu, outra vez, nas autárquicas nos Açores.
Alguns eleitos acham que o seu ego não corresponde à derrota que apanharam nas urnas.
Vai daí, apesar de terem sido eleitos, desiludem os que os elegeram ao não assumirem os seus lugares e vão à sua vida.
De lá nunca deviam ter saído.
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ELEFANTES – A classe política não pára de nos surpreender.
É fantástico ver altos dirigentes do PS-Açores, indefectíveis apoiantes do radical Pedro Nuno Santos, virem agora colarem-se descaradamente ao lado de José Luís Carneiro.
Pior, rebaixaram ainda mais a espinha ao declarar o apoio a António José Seguro, que o tinham traído com Costa.
Não são sapos, são elefantes tipo jumbo, sem direito a alívio gástrico…
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TRIUNFALISMOS – Registei alguns triunfalismos pacóvios nas leituras aos resultados das autárquicas.
É tão exagerado declarar que a derrota do Chega é o princípio do seu fim, como afirmar que o PS está de regresso, depois da estrondosa derrota de Maio passado.
Do mesmo modo, é um absurdo declarar como vitória moral ter a maioria dos votos, quando é sabido que não serviram para nada, porque não recuperaram Câmaras ou Juntas, bem pelo contrário. Derrota é derrota. Ponto.
O mesmo se diga do abuso que é aproveitar a vitória para dizer que é uma aprovação ao projecto da governação, quando esta está a definhar, com grandes índices de impopularidade e insatisfação em tantas áreas da vida açoriana.
Autárquicas são autárquicas e o mérito não está no governo ou nos partidos, mas sim nos candidatos, nas suas características pessoais, nos seus perfis profissionais e nos respectivos desempenhos.
Ao contrário das regionais ou nacionais, as eleições autárquicas são mais genuínas no voto e no sistema, confirmando que a atual Lei Eleitoral, decadente e desactualizada, precisa de ser alterada.
A baixa taxa de abstenção nas autárquicas é a prova inequívoca de que os cidadãos acreditam mais no Poder Local do que no reboliço intragável da política regional e nacional.
É só assistir aos plenários dos nossos parlamentos.
Osvaldo Cabral
Outubro 2025
(Açoriano Oriental, Diário Insular, Portuguese Times EUA, LusoPresse Montreal)