Osvaldo José Vieira Cabral · Os cobradores estão a bater à porta

Os cobradores estão a bater à porta
É delirante ouvir alguns políticos, com enormes responsabilidades no passado, falarem de endividamento público.
De repente, passaram uma esponja pela memória e querem, à viva força, que nós, cidadãos, também façamos o mesmo exercício.
Foi um dos cavalos de batalha em todas as minhas crónicas ao longo da última década: chamar a atenção para o aumento galopante da dívida bruta, à semelhança dos alertas da Secção Regional dos Açores do Tribunal de Contas.
Ninguém se preocupou. Agora estão todos preocupados com o endividamento proposto no Orçamento Regional do próximo ano – que é mau para todos nós, contribuintes – mas não é nenhuma originalidade.
Nós tivemos um recorde de dívida acumulada entre 2008 e 2017, com os Açores a aumentarem a sua dívida 3,15 vezes mais, passando de 563,7 milhões para 1.690,4 milhões de euros.
É um ritmo médio anual de 115,4 milhões.
O maior volume desta dívida foi para pagar a fornecedores e os buracos ruinosos das empresas públicas, nunca para crescimento da nossa economia anémica.
Tem-se falado tanto, agora, da SATA, mas houve outras empresas, até com passivo maior, que se revelaram um autêntico cancro para as nossas finanças públicas.
Só a Saudaçor, essa invenção desastrosa, de que nunca mais ninguém falou dela, deixou-nos um calote de mais de 600 milhões de euros.
Há-de haver muito boa gente por aí que julga que nada disto é para pagar, mas a verdade é que os cobradores batem-nos à porta todos os meses ou anos, como acontece agora com a SATA ou a Sinaga.
Há tanta gente preocupada com o património da fábrica de açúcar, o que é legítimo, mas ninguém se preocupa com os mais de 800 mil euros que deve a fornecedores e com os 35 milhões de euros de prejuízos ao longo dos anos.
Só em meia dúzia de anos, de 2015 a 2020, o Governo Regional transferiu para a Sinaga quase 9 milhões de euros.
Uma empresa, recorde-se, que custou à região, num negócio obscuro, 8oo mil euros!
Amanhã, 18 de Novembro, mais um cobrador vai bater-nos à porta para cobrar empréstimos.
Na verdade, são dois cobradores: a Bankinter SA e o Banco BPI.
Vêm cobrar um dos muitos empréstimos concedidos à SATA, cujo prazo termina agora.
Como a SATA não tem dinheiro, nem tão pouco sabe o seu futuro, porque tarda, incompreensivelmente, a decisão de Bruxelas sobre a reestruturação, foi acordado com aquelas instituições uma prorrogação dos respetivos prazos de vigência.
O Governo Regional já concordou com a prorrogação e estendeu a manutenção das garantias, que é como quem diz, para pagarmos um dia destes.
São “apenas” cerca de 50 milhões de euros… por agora.
Portanto, senhores políticos, quando falarem de dívidas e endividamentos, ao menos benzam-se antes.
Novembro 2021
Osvaldo Cabral
(Diário dos Açores, Diário Insular, Multimedia RTP-Açores, Portuguese Times EUA, LusoPresse Montrea
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