osvaldo cabral, as eleições

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MAIS DO MESMO NAS AUTÁRQUICAS?
À semelhança do que acontece no país, a grande incógnita das eleições de domingo, nos Açores, é saber até onde poderá ir o Chega.
Nas eleições para a Assembleia da República, em Maio passado, o Chega foi o único partido que cresceu em número de votos, ganhando 2 dos 19 concelhos e 25 das 156 freguesias, 12 das quais em Ponta Delgada, o que corresponde a metade do concelho, passando a segunda força política mais votada.
José Pacheco aposta a própria reputação com a sua candidatura a Ponta Delgada, depois de já ter concorrido na Lagoa, há quatro anos, com um resultado pífio.
Será que a zanga dos eleitores com os partidos tradicionais, manifestada nas eleições nacionais, terá correspondência nas autárquicas de domingo?
Tudo leva a crer que não, porque nas autárquicas nem sempre é o partido que está na primeira opção dos eleitores, mas sim o perfil dos candidatos e o grau de proximidade de cada um nas suas localidades.
O mais certo é que o Chega faça mossa nestas eleições, mas daí até ganhar Câmaras Municipais seria uma surpresa absoluta.
O fenómeno está testado em vários países da Europa, onde a extrema-direita ou os populistas têm obtido grandes resultados nas eleições nacionais, mas não consegue implantação ao nível do poder local, sobretudo nas grandes cidades ou nos maiores centros urbanos.
Porém, a história das eleições autárquicas nos Açores ensina-nos, pelo menos nos últimos 16 anos, que há sempre uma surpresa na noite eleitoral, com mudanças quase inesperadas, como já aconteceu com Vila do Porto, Ribeira Grande, Nordeste ou Praia da Vitória.
No próximo domingo é previsível que haja alguma surpresa, porque o cenário eleitoral este ano é muito diferente de há quatro anos, onde a fragmentação parece mais acentuada. É muito provável que, mesmo em autarquias bastiões, desapareçam as maiorias absolutas.
Uma coisa é certa, do modo como as forças políticas se têm apresentado nesta campanha, vai haver muitas leituras na noite eleitoral e praticamente todos vão dizer que venceram à sua maneira.
Ponta Delgada, Lagoa, Vila Franca, Angra do Heroísmo, Praia da Vitória e os dois municípios das Flores são, à partida, os concelhos mais interessantes de seguir na noite eleitoral, por razões diferentes e, também, devido aos resultados obtidos pelo Chega em Maio passado.
É claro que estas são eleições diferentes, mas é legítimo questionar se os eleitores zangados de Maio repetirão domingo o protesto contra o PSD e PS.
Enquanto em Ponta Delgada o Chega empurrou o PS para a terceira força política, ganhando uma dúzia de freguesias rurais, o PSD manteve-se em primeiro graças às freguesias citadinas.
O facto do PS concorrer em Ponta Delgada dividido entre a candidatura forçada de Isabel Rodrigues e a ex-socialista Sónia Nicolau, retira qualquer hipótese dos socialistas vencerem a “joia da coroa”, podendo mesmo obter um resultado humilhante.
O PS sempre foi a força de oposição tradicional ao PSD em Ponta Delgada, ficando apenas a 6 pontos percentuais nas autárquicas de 2021, com o BE em terceiro, mas desta vez haverá mudanças nestas posições, até porque o BE concorre coligado com o PS.
O concelho da Lagoa, que foi uma das surpresas na noite eleitoral das nacionais, com o resultado obtido pelo Chega, será outra incógnita em termos de comportamento do eleitorado, onde o Chega venceu em 4 das 5 freguesias.
Vila Franca, onde o Chega também venceu no concelho, é outro município a seguir com atenção, até porque não há um candidato incumbente.
De resto, para além de Vila Franca, há outras Câmaras Municipais onde se registarão mudanças ao nível da presidência, porque os actuais presidentes atingiram o limite de mandatos.
São os casos de Ribeira Grande, Angra do Heroísmo, Calheta, Velas, Santa Cruz das Flores, Lajes das Flores, Madalena e Corvo. Poderá não haver mudanças na cor política, mas não deixa de ser uma oportunidade para quem esteve na oposição nos últimos anos.
Nas eleições de 2021 o PSD conseguiu segurar os municípios que já detinha, em que a grande incógnita já era o resultado que o Chega poderia alcançar, depois de ter eleito dois deputados nas eleições regionais do ano anterior e que serviram para viabilizar o governo de Bolieiro.
Outra diferença de monta é que, naquele ano, o Chega apresentou apenas 8 candidaturas nos 19 concelhos, enquanto que este ano concorre a todos, embora com muitas listas de candidatos “importados” do Continente.
Finalmente, outra expectativa nestas eleições será o comportamento do PS, partido vencedor das últimas autárquicas em 2021, com 9 Câmaras Municipais contra 8 do PSD e respectiva coligação, mas que já se apresentava em queda livre, tendo perdido três municípios.
Os socialistas sempre tiveram, nestas últimas décadas, forte implantação no poder local, o que lhes poderá ajudar a segurar algumas câmaras no próximo domingo.
Se perder alguma e obtiver um mau resultado em Ponta Delgada, então será mais uma má notícia para a liderança de Francisco César, acusado pelos seus próprios pares de não ter sabido gerir o processo de candidatura de Ponta Delgada.
Não há previsão de nenhum descalabro eleitoral no próximo domingo, mas será interessante verificar o comportamento do eleitorado face a uma nova realidade regional.
Da parte da coligação de José Manuel Bolieiro, segurar as câmaras que já detém e, eventualmente, ganhar alguma ao PS, seria uma grande vitória eleitoral, considerando que a governação regional está numa fase de alguma impopularidade, a julgar pelo coro de críticas e descontentamentos pelo seu desempenho.
Aliás, a desastrada forma como geriu a privatização da SATA foi muito subtilmente atirada para depois de domingo. Mas convém ir dizendo que, a confirmar-se o desastre final do processo, há que retirar consequências no Governo Regional, com Duarte Freitas e Berta Cabral à cabeça.
Quanto à pré-campanha e campanha em geral, foram ambas atípicas, com pouca adesão popular e sem rasgo.
Tirando uns cartazes manhosos, promessas completamente absurdas e irrealistas, algumas a roçar o ridículo, à mistura com alguns candidatos cromos, se não fossem os debates na RTP-Açores e a cobertura da imprensa regional, os cidadãos nem saberiam quem são os candidatos.
A tensão eleitoral, este ano, foi mais elevada, atendendo à introdução de um discurso mais populista, com discussões intragáveis, como alguns debates televisivos, e muita demagogia à solta, onde até se prometeu dar dinheiro às pessoas para comprarem casa ou medicamentos, como se isto fosse uma função das autarquias. Alguns candidatos demonstraram um profundo desconhecimento sobre como funciona o poder local e outros fizeram propostas como se vivêssemos no Dubai e houvesse petróleo nos respectivos municípios, alguns deles falidos por via das contas ruinosas das suas empresas municipais.
Outra conclusão a retirar desta campanha eleitoral é o continuado declínio da qualidade dos candidatos, cada vez mais nivelado por baixo, como já se tinha notado, também, nas eleições regionais.
Tudo junto poderá contribuir para uma maior abstenção (45% em 2021), que apesar de tudo é das mais baixas em todas as eleições.
Quem estuda o comportamento das massas sabe que, em momentos de tensão, os extremismos tendem a ser mais fortes.
O que estamos a viver a nível mundial, as crises e as guerras, os “casos” e “casinhos” na política interna, o ambiente insultuoso e odioso ampliado nas redes sociais, tudo isto contribui para comportamentos mais extremados na sociedade, que foram visíveis nesta campanha e que podem reflectir-se nas urnas.
Como diz a ‘Rainha’ das Flores, Gabriela Silva, “com o mundo num caos, o poder local é uma espécie de oásis para os munícipes (…). Seria muito interessante que, após este período de combate, pudéssemos remar todos para o mesmo lado, colocando o interesse coletivo acima do individual.”
Também há alguns sinais positivos no processo eleitoral deste ano, como o aparecimento, cada vez maior, de muitos jovens e movimentos independentes, provando que o sistema eleitoral para as regionais e nacionais precisa de ser alterado.
A oligarquia partidária tem impedido, até agora, qualquer mudança no sistema, mas de susto em susto, em cada eleição, pode ser que acordem para a realidade.
Há uma espécie de ‘wokismo’ nos aparelhos dos partidos contra a cidadania e aqueles que pensam pela sua própria cabeça.
Preferem o rebanho partidário e a obediência cega ao líder todo poderoso.
Bem poderiam aprender com o Poder Local, onde o sistema é mais generoso para as populações e inspirador para o regime.
A Democracia agradece.
Outubro 2025
Osvaldo Cabral
(Açoriano Oriental, Diário Insular, Portuguese Times EUA, LusoPresse Montreal)

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