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José Decq Mota
June 6 at 11:03pm ·
TEXTO BASE DA INTERVENÇÃO QUE FIZ NESTE LANÇAMENTO DO LIVRO DE CRISTINA SILVEIRA
Senhora Presidente da ALRAA
Estimados Autora e Editor da Obra que hoje é apresentada
Minhas Senhoras e meus Senhores
Estamos aqui para termos contacto com um livro, acabado de dar à estampa, que se intitula “As Estratégias de Hospitalidade na Atracção de Visitantes – O Caso do Peter Café Sport na Ilha Do Faial Açores”. Trata-se, no fundamental, da edição de uma Tese de Mestrado que a Autora, Cristina Silveira, elaborou no ano de 2012 e defendeu, com sucesso, na sua Universidade em 2013 e que, agora e no âmbito das comemorações dos 100 anos do Café Sport o José Henrique Azevedo decidiu editar.
A primeira questão que, na minha opinião, tem que ser referida, prende-se com o facto do papel desenvolvido pelo Peter Café Sport ser, justamente, objeto de estudo e de uma dissertação académica desenvolvida na área as dinâmicas locais de desenvolvimento.
Assim a Autora resolveu e bem estudar este caso muito singular e importante que é a existência, neste porto da Horta, desde 1918 do Café Sport, hoje conhecido por Peter Café Sport. Cristina Silveira, quando resolveu aprofundar o estudo deste caso, era já uma jornalista experimentada, com fortes ligações a esta sociedade e vastos conhecimentos da história e do presente desta ilha e deste Arquipélago.
Senhora Presidente
Minhas Senhoras e meus Senhores
Para se poder perceber, em profundidade, as razões que motivam casos e situações bem especificas nos processos de desenvolvimento local, temos que, tal como é feito nesta dissertação, perceber bem todo o enquadramento, prévio e contemporâneo, da época e do caso que se estuda. Assim sendo, permitam-me que deixe aqui um breve apontamento sobre a visão que tenho relativamente á ligação que há entre o porto da Horta e o desenvolvimento do Faial.
Efetivamente penso, desde há muito tempo, que o desenvolvimento do Faial esteve sempre muito ligado ao facto de, nesta ilha, haver uma baia natural definida a norte pala ponta da Espalamaca, a sul pelos montes Queimado e da Guia e estar virada a Leste, ficando a 5 milhas a ilha do Pico. Essa baia era o porto natural amplo que rareava nas nossas ilhas, pois dava abrigo no mar e tinha bom acesso por terra.
À volta dessa baia foi-se instalando, ao longo dos séculos, um centro urbano que progressivamente se foi transformando num porto procurado e movimentado. A partir do século XVIII, com o crescimento intenso do tráfego marítimo no Atlântico, o porto da Horta transformou-se num porto intermédio de grandes viagens à vela, que era procurado para reparações, para aguada e para descanso e num porto de escala para a frota baleeira americana.
A qualidade da baía da Horta não escondia a deficiente capacidade de respostas técnicas que esta ilha e o seu porto natural davam às necessidades de um tráfego marítimo crescente, que vinha das Américas do Norte e do Sul, que atravessava o Oceano Atlântico em todas as quadras do ano e que era praticado por veleiros, em geral, pequenos ou médios. Mas a importância, nesse tempo e com as condições então existentes, da escala intermédia na Horta era tanta, que não deixou de aparecer quem percebesse que a criação de condições de reparação e abastecimento de navios na Horta seria um negócio rentável e muito útil.
Foi assim que John Bass Dabney resolveu instalar-se na Horta em 1806, criando uma empresa prioritariamente virada para abastecimento de navios e reparações marítimas, importação e exportação. Tal decisão foi tomada por Dabney depois de uma demorada escala inopinada na Horta, para muitas reparações, no final do século XVIII, após o navio onde viajava ter sido apanhado na travessia por uma violenta tempestade. A Casa Dabney funcionou na Horta até 1892, criou boas condições de assistência a navios, promoveu a exportação sistemática de vinho verdelho do Pico, adquiria a navios baleeiros americanos óleo de baleia que posteriormente remetia, em navios próprios, e vendia nos EUA e outros destinos, importava e comercializava muitos bens de consumo até então pouco acessíveis. Os Dabney, das três gerações que viveram no Faial, foram também Cônsules Gerais dos EUA nos Açores e a sua atividade económica, portuária, social e diplomática consolidou e deu importância ao papel do porto da Horta, dinamizou a vida económica desta parte do Arquipélago, especialmente com a comercialização sistemática do vinho do Pico, atraiu o interesse de estrangeiros sobre esta e outras ilhas. Penso que com os Dabney se desenvolveu muito e consolidou o papel que esta ilha, com o seu porto natural, já tinha, mas de forma menos intensa, muito por ausência, até então, de capacidades de resposta.
Penso assim que o desenvolvimento portuário verificado no século XIX, dinamizado pelos Dabney, por Walter Bensaúde e outros, que transformou a Horta num porto de escala muito procurado, criou as condições básicas para que se pudessem afirmar posturas comerciais locais que associavam a vontade de vender à vontade de conhecer e de ajudar quem vinha e à vontade de divulgar a nossa terra no Mundo distante!
O trabalho de Cristina Silveira que, neste ano de comemoração dos 100 anos do Café Sport, é editado, constitui, ele próprio, uma verdadeira homenagem ao criador e continuadores desta invulgar empresa que comercializando, atrai fortemente os navegadores e divulga muitíssimo esta cidade porto existente no meio do mar.
O porto da Horta do início do séc. XX, inserido numa cidade onde a presença estrangeira continuava a ser grande e que estava, nessa altura, reforçada pelas Colónias Inglesa, Americana e Alemã que asseguravam a operação local das Empresas de Telegrafia por Cabo Submarino, mantinha movimento, nomeadamente gerado pelo abastecimento de carvão e por necessidade de escalas técnicas.
A ligação da Horta ao Mundo, existente desde o povoamento, mas muito intensificada e tornada marcante no séc. XIX, gerou mentalidades bem abertas que perceberam que o isolamento fortíssimo em que se vivia era quebrado quando se conseguia atrair e “conquistar” os que vinham de fora e se conseguia “absorver” o muito de novo que, sendo válido, era até então desconhecido ou quase desconhecido.
Sempre me habituei a ouvir que o Senhor Henrique Janeiro, fundador do Café Sport, que conheci e respeitava, tinha sido, em jovem, um entusiasmado desportista e tinha dado o seu contributo para que várias modalidades, trazidas por estrangeiros, se implantassem no nosso meio.
Conheci muito bem e tornei-me Amigo do José Azevedo, Peter, muito embora a diferença de idade entre nós seja de cerca de 20 anos. No final do Liceu, com uns 18 anos, era frequentador assíduo do Café Sport, onde cumprimentava sempre o Senhor Henrique, à direita depois de entrar e conversava, também sempre, ao fundo, onde estava o balcão, com o José Azevedo, Peter. Essa amizade assim começada, desenvolveu-se ao longo de toda a vida e afirmou-se em muitas e diversas circunstâncias. Os continuadores actuais, o José Henrique Azevedo e a sua Família, seguem o rumo dos antecessores, juntando uma boa e adequada avaliação das novas condições que vão surgindo e que indicam e motivam criativas inovações.
Sobre o tema central desta Tese da Cristina Silveira, que se centra nas “Estratégias de Hospitalidade na Atracção de Visitantes” quero referir, em forma de testemunho, que a hospitalidade que sempre marcou os procedimentos do fundador e continuadores, até hoje, do Peter Café Sport, é uma prática constante, aberta e convicta que muito contribuiu e contribui, no tempo dos Rebocadores Holandeses, da PanAm, da Base Naval Inglesa, dos Aventureiros, agora massivamente substituídos pela Náutica Internacional de Recreio, para a divulgação da Horta e valorização dos Açores.
Este nosso Porto da Horta e o muito que nele existe e funciona, nomeadamente o Café Sport, muito tem contribuído para a valorização dos Açores, facto que, infelizmente, nem sempre é plenamente reconhecido. Este trabalho de Cristina Silveira, centrado no caso concreto e singular do Peter Café Sport, é um importante contributo para conhecer bem o Faial.
Lendo esta obra, que tem como pilares importantes um inquérito feito a iatistas que escalaram a Horta e um conjunto de entrevistas feitas a cidadãos direta ou indiretamente ligados aos processos de desenvolvimento associados ao porto, percebemos com cristalina clareza que o Peter Café Sport foi pioneiro e foi essencial no desenvolvimento de um trabalho sistemático de divulgação que teve como resultado uma enorme promoção da Horta e dos Açores.
Recomendo, vivamente, a leitura desta obra de Cristina Silveira e agradeço-lhe, reconhecidamente, o ter-me convidado a estar hoje aqui a dizer estas breves palavras. Felicito igualmente o José Henrique Azevedo pela decisão de editar este meritório trabalho académico motivado pela accão do seu Avô, do seu Pai, dele próprio e, agora, dos seus filhos.
Senhora Presidente
Senhoras e Senhores
Termino dizendo que, como faialenses, temos razões para nos orgulharmos todos do contributo que damos para o desenvolvimento dos Açores e do conjunto do País, nomeadamente com o resultado da promoção do nosso porto junto da Náutica Internacional de Recreio. De entre todos o que se dedicaram a esse esforço destaca-se o Peter Café Sport, a quem felicito pelos 100 anos!
Disse
Muito Obrigado
José Decq Mota
(Intervenção que fiz na apresentação do livro “As Estratégias de Hospitalidade na Atracção de Visitantes – O Caso do Peter Café Sport na Ilha Do Faial Açores”, de Cristina Silveira, em 2/6/2018)
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