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RATZINGER E A SUA “VISÃO”
DOS FENÓMENOS DE FÁTIMA 1917
Desde que o Papa Emérito Bento XVI deixou esta dimensão terrena logo se alçaram as vozes evocativas da sua análise do pretenso “segredo de Fátima”, motor das crenças indiscutíveis de muitos, mas de escassa apurada reflexão de alguns (poucos). Da antologia “Fátima mais além da Fé”, em boa hora editada pela chancela Book Cover, de Francisco Melo, recordamos um dos epítomes centrais da corajosa e inovadora abordagem de José Augusto Mourão, dominicano e semiólogo, que teve tanto de poeta como de agitador incómodo nas questões centrais da Fé, com ênfase no culto popular fatimista promulgado pelos eventos de 1917 e as suas leituras institucionais adrede aprovadas. A análise do malogrado pensador católico precocemente desaparecido, centra-se exatamente na leitura heterodoxa do então responsável da Congregação da Doutrina da Fé, o cardeal ora desaparecido Josef Ratzinger. Este, ao invés das proclamações sumárias dos rodapé dos telejornais não se abalançou acriticamente no apelidado “segredo de Fátima”: ousou produzir uma avaliação antropológica de fecundas e desafiantes perspectivas e menos em interpelar os fenómenos na sua validação teológica afim ao “marianismo” subjacente e triunfante na sua tese da “aparição” (presença FÍSICA de uma entidade celeste – a Virgem Maria, mãe de Jesus Cristo, no espaço tridimensional da Cova da Iria em 1917). Não. A abordagem de Ratzinger, do intelectual que também e sobretudo o foi, não releva de propaganda ao presumido “segredo” – de que Lúcia dos Santos originalmente informou tratar-se de apenas “umas palavrinhas”… até ao seu crescimento por divino “fermento….- na conjuntura monacal do seu retiro forçado em Vigo e Pontevedra, por obra e graça dos seus dois doutrinadores jesuítas, os padres José Aparício e José Gonçalves. Enfim… Retira-se do essencial do texto de José Augusto Mourão sobre a interpretação de Josef Ratzinger, originalmente produzida em 2000, com o selo do também intelectual germânico. Demasiado profundo e rico em dimensões hermenêuticas a releitura do nosso compatriota dominicano é de uma dimensão inusitada e merece ser relido na antologia citada, compêndio de 20 autores europeus e norte-americanos, numa abordagem única no panorama desta área de avaliação. Em suma, o cardeal Ratzinger anuncia e propõe que a “aparição” de 1917 não se trata de uma realidade externa, via sentidos corporais, mas de de uma perceção interior, imaginativa: a imagem é captada pela vidente segundo as medidas e possibilidades do percipiente/vidente. Ou seja, aquilo que o poeta William Blake, bem a propósito citado por Augusto Mourão, propõe: “As the eye, such the object”, reflexo de um jogo natural entre o observador e o observado: ontem, as figuras centrais dos catecismos básicos das doutrinas que nos determinaram e confinaram; hoje, as representações da cultura popular donde emergem as representações ficcionais do “Outro” procedente e habitante de Espaços e de Tempos diversos que possivelmente se cruzam diante de nós espantadas criaturas face ao Desconhecido, mas que fatalmente nos condiciona a leituras imediatas – cada olhar outro diverso objeto – nestas epifanias que se renovam à medida das circunstâncias e dos “videntes”/testemunhas. Fica a sugestão de leitura via Book Cover: https://bookcover.pt/product/3849/
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- Pedro FerreiraEste é um dos seus livros que mais tempo me prendeu à poltrona a devorar página atrás de página. Sou mais adepto de algumas análises mais tangenciais em prejuízo de outras, mas tudo me leva a ter a certeza de que o “fenómeno” foi classificado da forma …See more
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Mário NevesÉ uma obra obrigatória para um conhecimento multidisciplinar dos fenómenos “marianos”.- Like
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- 23 h