O país continua à venda

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PÚBLICO, Manuel Carvalho
Editorial

O país continua à venda
A venda ao exterior de activos
valiosos da economia
portuguesa continua animada.
Só este mês a Altice desfez-se
de metade da sua rede de bra
óptica, vendida à Morgan Stanley
Infraestructures Partners, o grupo
Vasco de Mello e o seu parceiro
Arcus vão alienar 80% dos direitos
de voto na Brisa, a EDP fechou
negócio com um consórcio de
empresas francesas liderado pela
Engie que lhes permitirá controlar
seis barragens e, outra vez a Altice,
transferiu para um grupo do Bahrein
85% da gestora dos fundos de
pensões da TLP, Marconi e TDP.
Quem julgava que o m das
restrições da troika, o crescimento
económico dos últimos anos, o
regresso da conança ou o alívio da
dívida das empresas iriam permitir
uma nova vaga de ambição ao
capitalismo português desengane-se:
o país continua à venda.
Haverá quem, munindo-se da
cartilha dos mercados abertos e da
livre circulação de capitais, considere
esta situação normal. Poder-se-á
dizer que, entre o controlo francês ou
americano da bra óptica, ou entre o
controlo chinês ou francês das
barragens não há diferença de maior.
Não é descaso armar-se também
que as teorias dos centros de decisão
que, em tempos, faziam parte do
léxico corrente do empresariado
serviam apenas para proteger a gula
predatória ou a ineciência de uma
certa estirpe de negociantes da corte.
Mas depois da terrível destruição de
riqueza nacional na era da troika e
dos exemplos de incúria e dos abusos
que destruíram a PT, que
expurgaram a EDP de capital
nacional ou entregaram a banca
nacional ao capital espanhol ou
angolano seria de esperar uma leve
pausa para se respirar. Não é isso que
acontece.
Por muito que todos os Estados
europeus façam a apologia da
liberdade de negócios, na penumbra
todos se esforçam por proteger os
seus activos mais estratégicos e
valiosos. O Estado português deve
estar atento a essa sangria de recursos
e olhar para a Espanha ou para a
França como exemplo. Não se trata
de impor barreiras proteccionistas
em favor de tecido económico já de si
demasiado submisso ao patrocínio do
Estado. Nem de criar novas clientelas
de protegidos que um dia darão
origem a novos donos disto tudo.
Trata-se, sim, de exigir contrapartidas
duras. Que a exploração de recursos
nacionais pague impostos nacionais.
Que os quadros e demais
trabalhadores que gerem os negócios
se instalem em Portugal. Que haja
abertura para que empresários
portugueses tenham acesso a esses
negócios. Medidas que anal têm
uma única nalidade: evitar que
Portugal se torne ainda mais uma
banal plataforma de negócios gerida
e mantida a partir do exterior.