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Fascismos e autopunição

Posted: 24 Sep 2020 11:33 PM PDT

Miguel Guedes* | Jornal de Notícias | opinião

A recusa em aceitar a realidade é um ponto de partida para a mentira, uma espécie de “pole position” forçada para impedir, por todos os meios, que quem vem atrás passe para a frente, ultrapasse. Chama-se, vulgarmente, batota.

A pouco mais de um mês das eleições presidenciais norte-americanas, o cuidado que Trump coloca na tentativa de se eternizar no poder é sintomático do que fará na noite eleitoral, caso as perca. Os EUA assistem, pela primeira vez, ao contorcionismo de um presidente que não se compromete com uma transição pacífica caso seja derrotado por Joe Biden na noite de 3 de Novembro.

Caso único. É o próprio poder que, antecipadamente, acusa o seu próprio sistema de fraude eleitoral, condicionando-o a um caso de derrota conveniente. As acusações de fraude eleitoral e de ilegitimidade, até aqui privilégios dos oposicionistas em todo o Mundo perante os abusos dos poderes instalados, transferiram-se para o poder da Casa Branca.

Donald Trump, ambicioso por voltar a fazer crescer a América e liderar o Mundo, não consegue controlar uns papelinhos de voto para ganhar o álibi que lhe permita não aceitar a previsível derrota que, como as sondagens apontam, vem a caminho. Para reforçar a tese, recorre-se ao Supremo Tribunal onde, no mesmo dia em que não assegurava a transição pacífica, colocou um homem de mão para lhe garantir a eleição na secretaria.

Criar o problema e fazer do problema a solução. Uma mente tortuosa a entregar o país a um divisionismo entrincheirado de guerra civil, a silabar fascismo e a celebrar golpadas eleitorais do Terceiro Mundo ao espelho. Donald Trump, em caso de derrota, vai querer usar a violência nas ruas que agora semeia, autoriza ou menospreza.

Demasiados casos. Depois de Neto Moura nos tribunais, a realidade à distorção com Francisco Aguilar na Universidade de Lisboa ou com centenas de congressistas do Chega reunidos sem cumprir regras de saúde pública em Évora. O movimento de saída dos armários de muitos protofascistas é, como bem salientava Pacheco Pereira na “Circulatura do quadrado” na TVI, uma realidade com libido.

“Existe uma relação entre a extrema-direita e estas fantasias homoeróticas que foram importantes no nazismo. É uma obsessão fálica”, salientava. E de facto, todo este enredo de castração química, propostas de pena de morte ou subtracção dos ovários a mulheres que queiram abortar, transpira muita rejeição interior e autopunição. “A obsessão pela castração é fálica. Gosto das coisas que vêm dali, mas quero cortar”, acrescenta Pacheco Pereira. Está nos livros, está na vida.

Tão ou mais perigoso é que, há 30 anos, um professor continue a leccionar na Faculdade de Direito de Lisboa, defendendo temáticas como o julgamento do “socialismo de género e identitário” como se julgaram os crimes do Holocausto, versando o “ódio cristofóbico”, a “suástica que flutua orgulhosa no Ocidente”, tratando as mulheres por “canalhas” ou “desonestas”, enquanto está a ser julgado por violência doméstica num tribunal onde declarou “morte a todos os feministas”, entre outros dislates. Professor de Direito Penal. Puna-se.

*Músico e jurista

O autor escreve segundo a antiga ortografia

Mente criminosa – A outra face de Winston Churchill

Posted: 24 Sep 2020 11:06 PM PDT

Winston Churchill, Primeiro-Ministro do Reino Unido durante a Segunda Guerra Mundial e líder da Oposição conservadora no termo desse conflito, acreditava que era preciso utilizar a bomba atómica contra várias cidades da URSS para intimidar o Kremlin e manter em respeito «o comunismo».

O historiador britânico Richard Toye descobriu, nos arquivos do New York Times, vários textos sobre um memorando que Julius Ochs Adler, antigo oficial do Exército dos Estados Unidos que se tornara chefe de redacção do jornal após a guerra, havia escrito sobre uma entrevista que manteve com Churchill em Janeiro de 1951, portanto 6 anos após o fim do conflito e apenas 6 meses antes do regresso de Churchill ao posto de Primeiro-Ministro.

De acordo com Julius Ochs Adler, Churchill pensava que seria preciso usar a bomba atómica sobre pelo menos uma cidade soviética em cada 30.

Os bombardeamentos nucleares preconizados por este político britânico não diziam respeito apenas à União Soviética. Churchill achava que era preciso utilizar a bomba atómica igualmente contra a China, então governada por Mao Zedong.

Voltairenet.org | Tradução Alva

Ver igualmente:
— «La Seconde Guerre mondiale aurait pu prendre fin en 1943», par Viktor Litovkine, Réseau Voltaire, 30 mars 2005.
— «Si l’Armée rouge n’avait pas pris Berlin…», par Viktor Litovkine, Réseau Voltaire, 1er avril 2005.

Quem Está por Trás da Juíza que Processa Assange?

Posted: 24 Sep 2020 10:50 PM PDT

Manlio Dinucci*

Emma Arbuthnot é a Magistrada (Chief Magistrate) que, em Londres, instruiu o julgamento de extradição de Julian Assange para os Estados Unidos, onde aguarda uma condenação de 175 anos de prisão por “espionagem”, ou seja, por ter publicado, como jornalista investigador, provas dos crimes de guerra dos EUA, incluindo vídeos das mortes de civis no Iraque e no Afeganistão.

No processo, atribuído à Juíza Vanessa Baraitser, todos os pedidos de defesa foram rejeitados. Em 2018, depois das acusações de agressão sexual na Suécia caducarem, a Juíza Arbuthnot recusou-se a anular o mandado de prisão, para que Assange não pudesse obter asilo no Equador.

Arbuthnot rejeitou as conclusões do Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre a detenção arbitrária de Assange. Também não foram escutadas as do responsável da ONU contra a tortura: “Assange, detido em condições extremas de isolamento injustificado, mostra os sintomas típicos de uma exposição prolongada à tortura psicológica”.

Em 2020, enquanto milhares de detidos foram transferidos para prisão domiciliária como medida anticoronavírus, Assange foi deixado na prisão, exposto ao contágio em condições físicas comprometidas. No tribunal, Assange não pode consultar os advogados, mas é mantido isolado numa gaiola de vidro blindada e ameaçado de expulsão se abrir a boca. O que está por trás dessa persistência?

 

Arbuthnot tem o título de “Lady”, sendo consorte de Lord James Arbuthnot, um conhecido “falcão” Tory, anterior Ministro das Compras da Defesa, ligado ao complexo militar-industrial e aos serviços secretos. Lord Arbuthnot é, entre outras coisas, Presidente do Conselho Consultivo britânico da Thales, uma multinacional francesa especializada em sistemas militares aeroespaciais e membro da Montrose Associates, especializada em inteligência estratégica (cargos altamente pagos). Lord Arbuthnot faz parte da Henry Jackson Society (HJS), um influente think tank transatlântico ligado ao governo e aos serviços secretos dos EUA.

Em Julho passado, o Secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, falou numa mesa redonda do HJS em Londres: desde 2017, quando era Director da CIA, ele acusa o WikiLeaks, fundado por Assange, de ser “um serviço de espionagem inimigo”. A mesma campanha é conduzida pela Henry Jackson Society, acusando Assange de “semear dúvidas sobre a posição moral dos governos democráticos ocidentais, com o apoio de regimes autocráticos”. No conselho político da HJS, ao lado de Lord Arbuthnot, estava até recentemente, Priti Patel, a actual Secretária do Interior do Reino Unido, responsável pela ordem de extradição de Assange.

A campanha de extradição de Assange, dirigida por Lord Arbuthnot e outros personagens influentes, está essencialmente ligada a Lady Arbuthnot.

Foi nomeada pela Rainha como * Magistrada Chefe, em Setembro de 2016, depois do WikiLeaks ter publicado, em Março, os documentos mais comprometedores para os EUA. Entre estes, os emails da Secretária de Estado, Hillary Clinton, que revelam o verdadeiro propósito da guerra da NATO contra a Líbia: impedir que a Líbia usasse as suas reservas de ouro para criar uma moeda pan-africana alternativa ao dólar e ao franco CFA, a moeda imposta pela França às 14 antigas colónias.

O verdadeiro “crime” pelo qual Assange é julgado é o de ter aberto fissuras na parede de silêncio político-mediática que cobre os verdadeiros interesses das elites poderosas as quais, operando no “Estado profundo”, jogam a carta da guerra. É esse poder oculto que sujeita Julian Assange a um processo judicial, instruído por Lady Arbuthnot que, como tratamento ao acusado, recorda os da Santa Inquisição.

Se for extraditado para os EUA, Assange será submetido a “medidas administrativas especiais” muito mais duras do que as britânicas: ficará isolado numa pequena cela, não poderá contactar a família nem falar, nem mesmo por meio de advogados que, se levarem uma mensagem sua, serão incriminados. Por outras palavras, será condenado à morte.

Manlio Dinucci* | Voltairenet.org |Tradução Maria Luísa de Vasconcellos | Fonte Il Manifesto (Itália)

*Manlio Dinucci— Geógrafo e geopolítico. Últimas publicações : Laboratorio di geografia, Zanichelli 2014 ; Diario di viaggio, Zanichelli 2017 ; L’arte della guerra / Annali della strategia Usa/Nato 1990-2016, Zambon 2016; Guerra nucleare. Il giorno prima. Da Hiroshima a oggi: chi e come ci porta alla catastrofe, Zambon 2017; Diario di guerra. Escalation verso la catastrofe (2016 – 2018), Asterios Editores 2018.

N. da T.:
A hierarquia portuguesa dos Magistrados é a seguinte:
Juíz Conselheiro – Supremo Tribunal de Justiça
Juíz Desembargador – Tribunais das Relações
Juíz de Direito – Tribunais de 1ª Instância

O Ocidente deveria sentar-se sobre o seu traseiro, calar a boca e ouvir “os outros”!

Posted: 24 Sep 2020 10:02 PM PDT

Andre Vltchek [*]

Este é um artigo recente de Andre Vltchek (1962-2020), antes do seu falecimento em Istambul dia 22 de Setembro. Seu último ensaio publicado foi Guo Wengui – So Anti-Chinese that even US Establishment Cannot Stomach Him.

Vltchek foi escritor, realizador de cinema, fotógrafo, jornalista, analista político e um ardente anti-imperialista. A sua posição consequente e lúcida foi um exemplo do que deve ser um jornalismo combativo e de ideias, o qual se contrapõe ao jornalismo pasteurizado dos media corporativos que nos mentem & omitem diariamente. Tal como o co-fundador de resistir.info, Miguel Urbano Rodrigues, Andre Vltchek constitui um exemplo para todos nós.

Sempre nos disseram o que pensar; o que é correcto e o que é errado. Pelos sujeitos brancos que moram ou vieram da Europa e da América do Norte. Eles sabiam de tudo. Eles eram os mais qualificados.

Quando escrevo “branco”, não me refiro apenas à raça ou cor da pele. Para mim, “branco” é a sua cultura, aquela a que pertencem. Sim, a sua identidade.

Nós russos, cubanos, venezuelanos, chineses, iranianos, turcos não somos realmente “brancos”, mesmo que a cor da nossa pele seja essa. Não que estejamos ansiando por ser brancos, realmente! Temos nossa própria maneira de viver e pensar e a maior parte de nós está do lado dos oprimidos, dos ‘miseráveis do mundo’, intuitivamente. Durante séculos as nossas nações foram saqueadas e atacadas. Milhões de nosso povo desapareceram durante invasões, genocídios, como aqueles na África e em todas as outras partes do mundo ‘não-branco’.

Sempre fomos estudados; sempre fomos analisados, fomos descritos por aqueles confiantes escribas e repórteres vindos sobretudo do Reino Unido e da América do Norte. Eles sabem melhor quem somos e que tipo de sistemas políticos e culturais merecemos e deveríamos almejar. Estas pessoas sabem como falar. Seus sotaques são tão perfeitos, tão “científicos”. Se eles dizem alguma coisa, isso deve ser pura verdade, simplesmente porque são qualificados, pois dominam o mundo há séculos.

Nós, os Outros, espera-se que calemos e ouçamos, a fim de aprender quem realmente somos, com os mestres do universo. Porque aos seus olhos não somos ninguém, apenas pouco mais que animais. E os animais não falam; eles só ouvem, recebem ordens e servem. Eles também são abatidos obedientemente, quando “é necessário”.

Esperava-se que os decisores brancos do mundo soubessem acerca de nós, muito melhor do que sabemos acerca do nosso próprio povo e dos nossos países.

Deus proíba um de nós, indivíduos “não brancos”, ousar emitir publicamente algum julgamento, especialmente um julgamento negativo, sobre a Europa, América do Norte ou Austrália!

Bem, em primeiro lugar, ninguém nos ouviria, porque nada se espera de nós, não podemos julgar o Ocidente. Estamos aqui para nos sentarmos polidamente, submissamente, para ouvir e tomar notas.

Será que vê frequentemente um chinês num programa de televisão britânico ou americano, a apresentar análises comunistas do Ocidente? Será que já viu um socialista iraniano ou chavista venezuelano a criticar o capitalismo britânico ou canadiano? Isso seria impensável, não é?

E honestamente, olhe para os chamados meios de comunicação independentes ou “progressistas” nos Estados Unidos ou Canadá. A situação lá é basicamente a mesma dos principais jornais e estações de televisão, com algumas raras, muito raras, excepções.

Mais uma vez, os brancos, sobretudo os anglo-saxões, “conhecem o que é melhor”: seja a respeito dos recentes protestos anti-racistas nos Estados Unidos, seja a própria origem do COVID-19. Mesmo que não saibam nada, absolutamente nada, eles ainda são considerados os mais bem informados, os “peritos” mais qualificados. Só porque têm nomes, aparências e pronúncias adequadas. Só porque são brancos, arrumados e capazes de mentir de maneiras aceitáveis.

 

Há poucas horas assisti a uma gravação, um diálogo entre dois “experts”, o qual foi postado online por um media “independente” norte-americano. Eles discutiam o COVID-19.

O impressionante foi a arrogância e aqueles sorrisinhos sarcásticos do tipo “sabemos tudo e vocês não sabem nada”. Dois homens estavam claramente a demonstrar rancor degenerado pelo mundo. Ambos eram brancos. Mais uma vez, não era só a cor da pele, mas também a sua atitude; devido à sua cultura.

Nos 40 minutos durante os quais falaram, não houve referências à tremenda vitória da China sobre a pandemia. Nenhuma menção ao Vietname ou a Cuba. Eram eles a falar. Era acerca deles, acerca do seu mundo e definitivamente não acerca da verdade objectiva.

O mesmo media basicamente chutou-me para fora; deixou de reimprimir meus ensaios depois de as nossas opiniões começarem a divergir, sobre todos os tópicos importantes, como a revolta nos Estados Unidos, o COVID-19 e a China. Quando cessei de me comportar como um branco, fui expulso.

Não me cabia nem era meu direito falar do Ocidente, neste momento histórico crucial. Afinal, eu era apenas algum outro da Rússia, da China. Este era o momento de os governantes do mundo brilharem. Eles e só eles eram qualificados para definir as crises na sua própria sociedade. Suas publicações fecharam as portas para os Outros. Nem todos, mas a maior parte certamente sim.

Os Outros eram por vezes autorizados a criticar seus próprios países. De vez em quando era-lhes permitido criticar duramente seus companheiros das nações não brancas. Mas nunca, alguma vez, foram tolerados como os críticos eminentes do Ocidente dominante; dos brancos!

Também não lhes é permitido fazer julgamentos intelectuais importantes: no Ocidente, os chineses não são confiáveis para decidir se o seu país é comunista ou não! Tais decisões são feitas por eles em Montreal e Londres, e se você ousar contradizer trotskistas ocidentais ou anarco-sindicalistas, será silenciado, censurado e impedido de publicar. Não significa nada que a China tenha uma das maiores e mais antigas culturas da Terra. Se o Irão é um país socialista é decidido em Paris ou Nova York, não em Teerão. O que aconteceu na União Soviética entre as duas guerras mundiais não cabe aos russos decidir.

Espera-se que todas as grandes nações não ocidentais aprendam acerca de si mesmas com alguns diletantes britânicos, suíços e canadianos, cujo único direito à fama é que são brancos e fazem parte do Ocidente.

Uma vez, um motorista de táxi em Teerão queixou-se a mim:

“Brancos ocidentais vêm ao meu país pela primeira vez. Eles não sabem nada sobre o Irão. Mas, com 5 minutos de viagem, começam a dar-me um sermão sobre a minha própria nação”.

Nem é preciso dizer que os ocidentais brancos sempre têm permissão para criticar o mundo inteiro. Não importa se sabem muito ou pouco acerca dele. Em geral, não sabem nada, absolutamente nada, mas e daí? Frequentemente, eles até conseguem infiltrar-se em meios de comunicação e universidades em países independentes e ensinar aos revolucionários acerca da sua própria revolução. Ridículo? Bizarro? Sim, é, mas está a acontecer!

Agora, como o Ocidente está a entrar em colapso, chovem teorias da conspiração por toda parte. Invenções e especulações ridículas e idiotas são impressas, dia após dia. Mesmo alguns media internacionais sérios com sede no mundo não ocidental caem na armadilha. Eles estão a contratar exércitos inteiros de redactores britânicos, irlandeses e norte-americanos convencionais, só para impressionar seus leitores no Ocidente, aqueles que não estão habituados a receberem “sermões” de pessoas de outras cores e culturas.

O Ocidente, intelectual e moralmente confuso e corrupto, não foi capaz de analisar, de pensar racionalmente. É uma lavagem cerebral completa. Isso se aplica tanto aos redactores quanto aos leitores. Ele precisa, não pode viver sem “caras familiares”, sem linhas de pensamento familiares.

Apesar da sua confusão, insistem em falar. Exigem serem ouvidos.

São incapazes de aprender com os outros. Só sabem como ditar; como pregar.

Mas aquilo que dizem nada mais é que lixo incompreensível. É apenas um disparate racista, fantasmagórico e irracional.

Conversa política ocidental, tagarelice académica, degeneração mental alucinogénica de Hollywood, danos cerebrais da Disney desde a primeira infância, narrativas surreais dos media de massa – tudo isso está reduzindo a nossa raça humana a nada, a um zero intelectual.

O caos e a falta de lógica patológica estão a manter o status quo . Sob tais condições, nenhuma ideologia progressista poderia sobreviver. Portanto, este é o ambiente mais adequado para os meninos ocidentais brancos e sua ditadura global.

É hora de calar a boca da maior parte dos faladores ocidentais, parar de ouvir e, se possível, trancar alguns dos oradores mais dementes numa instituição mental!

Mais fácil dizer do que fazer! Mas não há outra maneira.

Francamente, estou farto desta situação. Trabalho por todo o mundo e posso comparar. É claro para mim que a maior parte dos brancos ocidentais perdeu o seu gume criativo. Seus pensadores, escritores e directores de cinema estão a produzir sobretudo lixo. Com algumas excepções, o mesmo pode ser dito acerca sua academia e jornalismo investigativo.

Um jornalista russo, chinês, venezuelano poderia ver o colapso das sociedades ocidentais com muito mais clareza do que os próprios ocidentais. Ele ou ela seriam, em geral, muito mais qualificados e educados, capaz de descrever a realidade e de criticar objectivamente.

No Ocidente, o nível de ignorância é realmente impressionante. O conhecimento não é uma exigência. Só papéis, diplomas e selos fornecidos pelo regime é que são.

O mundo precisa desesperadamente de ouvir os Outros. Pois é preciso que os Outros se envolvam, sejam eles mesmos, para impedir que meninos ocidentais brancos de assassinarem milhões e milhões de pessoas inocentes em todos os cantos do mundo, como têm feito durante vários séculos ininterruptamente. Pois precisa dos Outros para erigir novos conceitos, novas ideologias e novos princípios morais.

Os conceitos colonialistas, imperialistas e racistas da América do Norte e da Europa simplesmente não são suficientemente bons para o mundo.

Em pânico, os brancos estão ultimamente a gritar (depois que o Sr. Floyd foi assassinado pela polícia sádica e a rebelião irrompeu por todo o mundo): “Não se trata de raça!”

Mas observe uma coisa: são eles, a dizer a nós, mais uma vez, a dizer ao mundo o que é e o que não é! Você nunca ouviria tais declarações na África, Médio Oriente ou Ásia. Lá as pessoas sabem perfeitamente bem do que realmente se trata, se se trata de raça ou não!

Acabei de passar duas semanas nos Estados Unidos, analisando a profunda crise da sociedade estado-unidense. Visitei Washington, DC, Minneapolis, Nova York e Boston. Falei com muitas pessoas em todos esses lugares. O que testemunhei foi confusão e ignorância total sobre o resto do mundo. Os Estados Unidos, um país que brutaliza nosso planeta há décadas, é absolutamente incapaz de se ver no contexto do mundo inteiro. As pessoas, incluindo aquelas dos media, são escandalosamente ignorantes e provincianas.

E são egoístas.

Perguntei muitas vezes: “A vida dos negros importa por todo o mundo? Elas importam na República Democrática do Congo e na Papua Ocidental? ” Juro, nunca recebi uma resposta coerente.

Alguém tem de lhes dizer… Alguém tem de forçá-los a abrir os olhos.

Há poucos anos, fui convidado para ir ao sul da Califórnia para mostrar meu documentário da África (meu longa-metragem Ruanda Gambit , sobre genocídios desencadeados pelo Ocidente tanto no Ruanda como posteriormente na República Democrática do Congo), onde milhões de negros estão a morrer, a fim de que a grande maioria dos americanos brancos viva na opulência suína.

Mas antes de poder apresentar, fui avisado:

“Lembre-se, as pessoas aqui são sensíveis… Não mostre realidade demasiado brutal, pois pode perturbá-las…”

Ao ouvir isso, quase abandonei o evento. Só o meu respeito pelo organizador me fez permanecer.

Agora estou convencido: é tempo de forçá-los a assistir; a ver os rios de sangue desencadeados pela sua preguiça, egoísmo e ganância. É hora de forçá-los a ouvir gritos de agonia dos outros.

Nós podemos fazer isso: repórteres “não brancos” da Rússia, China, América Latina e alhures. Temos imagens e sons! É nosso povo, nossos irmãos e irmãs por todas as partes do mundo que estão a atravessar sofrimento inimaginável. E faremos isso. Já começámos a fazê-lo. Que se lixem as sensibilidades dos assassinos remotos que se disfarçam de companheiros vítimas do capitalismo, só porque têm de pagar empréstimos estudantis e hipotecas, ou trabalhar em dois empregos! Eles não sabem absolutamente nada sobre verdadeiros horrores e verdadeira miséria. Um dia, em breve, serão forçados a ver e a compreender.

Incesto intelectual no ocidente

Durante séculos, intelectuais, pessoas dos media e propagandistas ocidentais ouviram-se uns aos outros, reciclando pensamentos uns dos outros, “casando” uns com os outros de uma forma obsoleta e incestuosa. Em seguida, eles despejavam seus discursos, muitas vezes vigorosamente, goela abaixo de todos os africanos, asiáticos, em suma, “dos outros”.

Eles criaram uma narrativa horrível que é predominantemente bombástica, hipócrita, falsa e até mesmo francamente enganosa.

Durante anos e décadas tenho escrito livros pormenorizados, dando exemplos de todos os cantos do planeta, revelando esta concepção atroz. O mais completo deles chama-se Exposing Lies of the Empire e tem mais de 800 páginas. A segunda parcela virá em 2021.

Em algum ponto, por operar dentro de margens intelectuais extremamente estreitas, a cultura ocidental branca simplesmente ficou sem ideias e sem criatividade. Tornou-se impotente, egoísta e incapaz de oferecer qualquer coisa progressista e optimista à humanidade.

Mas continua a dar lições ao mundo, ‘educando’ ou, mais precisamente, fazendo lavagem cerebral a todas as outras raças e nacionalidades.

O mundo foi condicionado de modo que, sem os selos brancos de aprovação do Ocidente, nada poderia se mover, ou ter êxito, ou ser levado a sério.

Mas agora, no Ocidente, a cultura branca entrou em colapso total. Ela parou abruptamente de dar à luz grandes escritores, cineastas ou pensadores. A Ásia, Rússia e até mesmo partes da África como a Nigéria e a África do Sul estão a produzir autores muito melhores, enquanto o Irão, China e Argentina estão a gerar cineastas indubitavelmente superiores.

Mas é o Ocidente que está a distribuindo prémios para o seu próprio pessoal e traidores estrangeiros, fingindo que ainda tem o mandato para julgar, educar e inspirar o mundo. Seus prémios, assim como seus diplomas, nada mais são do que selos de aprovação dados a colaboradores; recompensas por servidão.

Nesta altura, os meninos ocidentais brancos sabem muito pouco. Eles estão em negação absoluta. Eles são ridiculamente sobrestimados. Na verdade, estão acabados. Eles são vazios, cínicos, super-masturbados e preguiçosos. Eles pedem toda espécie de direitos e privilégios, mas nada sabem sobre responsabilidades, trabalho árduo e entusiasmo.

A América do Norte e a Europa branca esperam que o resto do mundo seja obediente, submisso, trabalhe duro, apoiando os não razoáveis altos padrões de vida do Ocidente. Isto é verdade tanto para sua direita quanto para os chamados “progressistas” (isto é tudo o que realmente – uma vez que virtualmente já não existe uma verdadeira esquerda internacionalista remanescente nos países ocidentais).

Mas mesmo a pseudo “esquerda”, que é patética, defunta e realmente apaixonada pelo obsoleto, ainda ousa julgar e desdenhar daqueles grandes países nos quais Partidos Comunistas e governos internacionalistas agora orgulhosamente detêm o poder!

A única razão para tal arrogância grotesca é (sim, o que está a imaginar é certo) o facto de que os membros da pseudo-esquerda são brancos e vêm de países ocidentais. O que é obviamente bastante bom (para eles) para alimentar seus complexos grandiloquentes de superioridade.

Se tudo isso parecer perverso e incestuoso, esteja certo de que realmente é.

Claro, este monstruoso arranjo do mundo tem de acabar logo, muito em breve. E acabará! Faremos com que isto aconteça.

Durante décadas e séculos, meninos brancos ocidentais estiveram a julgar-nos, aos outros. Estiveram a analisar-nos, a dizer-nos o que fazer, como pensar e como viver.

Isso levou a um desastre absoluto: a genocídios, pilhagem e escravidão; a colapsos intelectuais e ambientais.

A moral da história é: o Ocidente Branco não tem absolutamente nenhum direito de controlar o mundo. Este facto está a tornar-se cada vez mais óbvio.

Ele não está qualificado para liderar o mundo. Existem sistemas políticos muito melhores do que o ocidental, pois existem culturas muito mais importantes.

A única razão pela qual o Ocidente ainda está no controle do planeta é por causa da sua violência, brutalidade, bem como de enganos.

A violência pode ser confrontada. De agora em diante, será. Pela Rússia, Irão, China, Venezuela e outros países valentes.

Os enganos também devem ser desafiados. Agora temos nossos meios de comunicação. E estamos a usá-los.

Não deveríamos ouvir mais mentiras. Elas têm prejudicado nossos países durante décadas e séculos.

Temos de falar. Somos obrigados a falar! Cada vez mais alto. Acerca das nossas nações, acerca do mundo e da demência do Ocidente.

Agora, o Ocidente deve ser forçado a ouvir nossas vozes.

Nosso povo não deve mais sofrer em silêncio.

Francamente, no Ocidente branco, eles não sabem nada ou muito pouco acerca de nós. Embora saibamos muito, ou deveria dizer demasiado sobre o Ocidente. Realmente, fomos forçados a saber, mas principalmente mentiras. A verdade fomos nós que a descobrimos, mas descobrimos por nós próprios e muitas vezes da maneira mais difícil.

O mundo oprimido está a despertar. Cada vez mais, exige que seu próprio povo escreva e fale. Acerca dos nossos países próprios e também acerca do Ocidente.

Não nos interessa o que o Ocidente branco pensa de nós. Já não nos importamos. Cada vez mais de nós cuspimos nos seus convites e nos incentivos para trair. Não precisamos dos seus certificados e dos seus diplomas.

Não precisamos do seu dinheiro: temos os nossos próprios meios de comunicação que começam a render devido a um trabalho árduo e excelente; na Rússia, China e noutros lugares. Temos as nossas editoras e estações de televisão. As nossas palavras estão espalhadas por toda a Internet e ondas de rádio.

Isto é um novo mundo e um grande despertar.

Agora vamos dizer-lhes, directamente na cara, sobre a sua luta fracassada contra o COVID-19 e sua democracia fracassada. Envergonharemos seu imperialismo, colonialismo, consumismo vazio e racismo endémico. E analisaremos suas revoltas, sua opressão, vazio emocional e consumismo estúpido, usando nossos próprios repórteres, poetas e pensadores.

Falaremos sobre socialismo e comunismo a partir das nossas próprias perspectivas, do nosso próprio jeito e quando quisermos! Não precisamos da permissão deles.

Não precisamos dos sorrisos sarcásticos do Ocidente. Não somos “brancos”. E mesmo que a cor da nossa pele possa ser, em alguns casos, pálida, estamos a lutar decididamente ao lado das nações oprimidas, contra o sinistro ‘clube’ que tem assassinado centenas de milhões de pessoas, assim como todo o entusiasmo, bondade e esperança neste planeta.

As coisas estão a mudar rapidamente. Os Outros estão subindo. A grande batalha dos dias modernos contra a escravatura e o colonialismo começou.

Nossa mensagem é clara: Imperialistas, colonialistas, colonos e supremacistas ocidentais, calem a boca, recuem e ouçam; tivemos de ouvi-los durante séculos! Sua narrativa é vazia. E vocês não podem enganar-nos mais. Em breve construiremos nosso próprio novo mundo: aqueles milhares de milhões que não eram ninguém no vosso mundo tornar-se-ão tudo no nosso.

Agora estamos a falar e, pela primeira vez na história moderna, não há nada que vocês possam fazer a respeito. Vocês simplesmente terão que se habituar com o som das nossas vozes!

09/Abril/2020

[*] Andre Vltchek (1963-2020): Filósofo, romancista, cineasta e jornalista investigativo. Cobriu guerras e conflitos em dezenas de países. Alguns dos seus livros mais recentes são New Capital of Indonesia , China Belt and Road Initiative , The Great October Socialist Revolution Fighting Against Western Imperialism , Revolutionary Optimism, Western Niilism , o romance revolucionário Aurora e um best-seller de não ficção política: Exposing Lies Of The Empire . Assista Rwanda Gambit , seu documentário inovador sobre Ruanda e a R.D. Congo e o seu filme/diálogo com Noam Chomsky On Western Terrorism . Vltchek faleceu em 22/Setembro/2020 em Istambul. O seu é andrevltchek.weebly.com , Patreon

O original encontra-se em uwidata.com/…

Este artigo encontra-se em https://resistir.info/

A «guerra contra o terror» dos EUA é a verdadeira causa da crise de refugiados na Europa

Posted: 24 Sep 2020 10:29 AM PDT

Patrick Cockburn *

Oito guerras promovidas directamente pelos EUA ou que têm a sua aprovação tácita (Afeganistão, Iraque, Síria, Iémen, Líbia, Somália, noroeste do Paquistão e Filipinas) provocaram 38 milhões de pessoas deslocadas e em fuga. Destes, 8 milhões em fuga para o exterior dos seus países, 27 milhões no interior dos seus países destruídos. Esta tragédia não terá fim enquanto essas guerras não terminarem, e não será superada sem um fim que devolva aos povos o pleno direito de reconstruírem livremente o que a agressão imperialista destruiu e destrói.

Refugiados desesperados amontoados em barcos casca-de-noz que acostam nas praias de cascalho da costa sul de Kent são facilmente retratados como invasores. Manifestantes anti-imigrantes exploravam esses temores no fim de semana passado, enquanto bloqueavam a estrada principal para o Porto de Dover para “proteger as fronteiras da Grã-Bretanha”. Entretanto, a ministra do Interior, Priti Patel, culpa os franceses por não fazerem o suficiente para conter o fluxo de refugiados através do Canal da Mancha.

Os refugiados atraem muita atenção nas altamente visíveis últimas etapas das suas viagens entre França e Grã-Bretanha. Mas há absurdamente pouco interesse em saber por que suportam eles tais sofrimentos, correndo o risco de detenção ou de morte.

Existe uma suposição instintiva no Ocidente de que é perfeitamente natural que as pessoas fujam dos seus próprios Estados falhados (fracasso supostamente causado por violência e corrupção autoinfligidas) para procurar refúgio em países melhor administrados, mais seguros e prósperos.

Mas o que estamos realmente a ver naqueles patéticos barcos de borracha semi-submersos às voltas para cá e para lá no Canal da Mancha é a extremidade estreita da cunha de um vasto êxodo de pessoas provocado pela intervenção militar dos Estados Unidos e seus aliados. Como resultado da sua “guerra global contra o terror”, lançada após os ataques da Al-Qaeda nos Estados Unidos em 11 de Setembro de 2001, nada menos que 37 milhões de pessoas foram deslocadas das suas casas, segundo um revelador relatório publicado esta semana pela Brown University.

 

O estudo, parte de um projecto chamado “Custos da Guerra”, representa a primeira vez que esse massivo movimento populacional impulsionado pela violência é calculado usando os dados mais recentes. Os seus autores concluem que “pelo menos 37 milhões de pessoas fugiram das suas casas nas oito mais violentas guerras que a tropa dos EUA lançou ou em que participou desde 2001”. Destes, pelo menos 8 milhões são refugiados que fugiram para o estrangeiro e 29 milhões são pessoas deslocadas internamente (IDPs) que fugiram no interior dos seus próprios países. As oito guerras examinadas pelo relatório são no Afeganistão, Iraque, Síria, Iémen, Líbia, Somália, noroeste do Paquistão e Filipinas.

Os autores do estudo dizem que a deslocação de pessoas em resultado dessas guerras pós-11 de Setembro é quase sem precedentes. Comparam os números dos últimos 19 anos com os de todo o século XX, concluindo que apenas a Segunda Guerra Mundial produziu uma maior fuga em massa. Poroutro lado, a deslocação pós-11 de Setembro excede a causada pela Revolução Russa (6 milhões), a Primeira Guerra Mundial (10 milhões), a Partição Índia-Paquistão (14 milhões), Bengala Oriental (10 milhões), a invasão soviética do Afeganistão (6,3 milhões) e a Guerra do Vietname (13 milhões).

Os refugiados são visíveis quando cruzam uma fronteira internacional, mas os deslocados internos são muito mais difíceis de rastrear, embora três vezes e meia mais numerosos. Podem deslocar-se várias vezes conforme os perigos que enfrentam diminuem e fluem. Por vezes regressam às suas casas, apenas para as encontrar destruídas ou que os meios de ganhar a vida desapareceram. Frequentemente têm de escolher entre o mau e o pior conforme as linhas de batalha mudam, forçando-os a uma existência nómada dentro do seu próprio país. Na Somália, o Conselho Norueguês de Refugiados afirma que “virtualmente todos os somalis foram deslocados por violência pelo menos uma vez na vida”. Na Síria, há 5,6 milhões de refugiados, mas também 6,2 milhões de deslocados internos com famílias desnutridas desempregadas lutando para sobreviver.

Algumas dessas guerras foram iniciadas como consequência directa do 11 de Setembro, principalmente no Afeganistão e no Iraque (embora Sadam Hussein nada tivesse a ver com a Al-Qaeda e a destruição do World Trade Center). Outras, como a guerra em curso no Iémen, foram desencadeadas pela Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e outros aliados em 2015. Mas em primeiro lugar isso não poderia ter acontecido, e ter já durado cinco anos devastadores, sem uma luz verde tácita de Washington. Com 80% da população do Iémen em extrema necessidade, a única razão de não haver mais refugiados é que eles estão retidos no interior do Iémen pelo bloqueio saudita.

Esta disposição de lançar guerras e mantê-las em andamento poderia ser menor se os líderes norte-americanos, britânicos e franceses tivessem que pagar um preço político pelas suas acções. Infelizmente, os eleitores nunca compreenderam que o afluxo de refugiados, ao qual tantos se opõem, é a consequência da vasta deslocação causada por essas guerras no estrangeiro pós-11 de Setembro.

A Síria ultrapassou o Afeganistão em 2013 como o país que produz mais refugiados no mundo. À medida que a violência e o colapso económico prosseguem, é mais provável que o número de sírios forçados a fugir das suas casas aumente do que diminua. Uma característica que as oito guerras pós-11 de Setembro têm em comum é que nenhuma delas terminou, apesar de anos de combates inconclusivos. É por isso que o número de deslocados é muito maior do que em conflitos extremamente violentos, mas muito mais curtos, no século XX. A natureza interminável desses conflitos actuais parece fazer parte da ordem natural das coisas, mas não é absolutamente o caso.

Potências estrangeiras fingem que estão a trabalhar incessantemente para acabar com essas guerras, mas só querem a paz nos seus próprios termos. Na Síria, por exemplo, o presidente Bashar al-Assad, com forte apoio da Rússia e do Irão, venceu militarmente a guerra em 2017/18. De qualquer forma, já ia longe o tempo em que os Estados Unidos e o Ocidente queriam realmente livrar-se de Assad, porque temiam a sua substituição pelo Ísis ou movimentos tipo Al-Qaeda.

Mas Washington e seus aliados também não queriam que Assad, Rússia e Irão obtivessem uma vitória total, e portanto mantiveram a panela em ebulição num conflito em que os sírios são a miserável carne para canhão. Semelhante calculismo cínico na negação de uma vitória total ao outro lado mantiveram as outras guerras em andamento, independentemente dos custos humanos.

Os Estados Unidos não são os únicos responsáveis ​​por esses conflitos e pela deslocação em massa de pessoas que causaram. A guerra na Líbia, desencadeada pela Grã-Bretanha e pela França com o apoio dos EUA em 2011, foi anunciada como uma forma de salvar o povo líbio de Muhammar Khadafi. Na realidade, entregou o país a senhores da guerra e gangsters assassinos, tornando a Líbia a porta através da qual os imigrantes do norte da África tentam chegar à Europa.

Mesmo líderes tão estúpidos como David Cameron, Nicolas Sarkozy e Hillary Clinton deveriam ter previsto as consequências politicamente desastrosas dessas guerras. Geraram uma inevitável vaga de refugiados e imigrantes que deu energia à extrema-direita xenófoba em toda a Europa e foi um factor decisivo no referendo do Brexit de 2016.

Na Grã-Bretanha, o desembarque de refugiados e imigrantes sob os White Cliffs está mais uma vez a tornar-se uma quente questão política. No outro lado da Europa, migrantes dormem à beira da estrada em Lesbos após o incêndio do acampamento onde viviam.

Essas vagas de migração – e a reação anti-imigração que tanto tem feito para envenenar a política europeia – não vão acabar enquanto houver 37 milhões de pessoas deslocadas por essas oito guerras.

Isso só acontecerá quando as próprias guerras chegarem ao fim, como há muito tempo deveria ter acontecido, e as vítimas dos conflitos pós-11 de Setembro deixarem de acreditar que qualquer país é melhor que o seu para viver.

Publicado em O Diário.info

Fonte: https://www.counterpunch.org/2020/09/15/americas-war-on-terror-is-the-true-cause-of-europes-refugee-crisis/

União Europeia não reconhece Lukashenko como Presidente da Bielorrússia

Posted: 24 Sep 2020 10:12 AM PDT

Bruxelas considera que Lukashenko não tem “qualquer legitimdiade democrática” e exige novas eleições. Mais de 300 pessoas foram detidas depois da tomade de posse do Presidente bielorrusso, no poder há 26 anos. Estados Unidos, Reino Unido e Canadá preparam sanções figuras do regime bielorrusso.

Depois de Aleksander Lukashenko tomar posse para um sexto mandato numa cerimónia relâmpago, sem qualquer aviso prévio, a União Europeia afirmou que o autocrata não tem qualquer legitimidade enquanto Presidente da Bielorrússia e que a sua tomada de posse, de quarta-feira, foi feita à revelia da vontade do povo bielorrusso, que há mais de seis semanas consecutivas exige novas eleições.

“A chamada ‘tomada de posse’ de 23 de Setembro de 2020 e o novo mandato reivindicado por Aleksander Lukashenko carecem de qualquer legitimidade democrática”, afirmou o Alto Representante da UE para a Política Externa, Josep Borrell, num comunicado divulgado esta quinta-feira em nome dos 27 Estados-membros.

“Esta ‘tomada de posse’ contradiz directamente a vontade de grande parte da população bielorrussa, expressa em numerosos protestos pacíficos sem precedentes desde as eleições [de 9 de Agosto], e apenas serve aprofundar ainda mais a crise política na Bielorrússia”, lê-se no mesmo documento.

 

Lukashenko tomou posse para um sexto mandato no país que governa com mão-de-ferro há 26 anos na quarta-feira, numa cerimónia que não foi divulgada e que contou com algumas centenas de apoiantes leais ao regime, sem qualquer representação diplomática.

Após a cerimónia, milhares de bielorrussos saíram às ruas para protestar e voltaram a enfrentar a repressão das forças de segurança. De acordo com o Governo bielorrusso, foram detidas 364 pessoas durante as manifestações de quarta-feira.

A UE, que no passado mês de Agosto recusou reconhecer os resultados das presidenciais, que deram 80% a Lukashenko, considerando-as fraudulentas, voltou a sublinhar a necessidade de um “diálogo nacional inclusivo” e defendeu a realização de novas presidenciais, com supervisão internacional da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE).

“A posição da União Europeia é clara: os cidadãos bielorrussos têm o direito de ser representados por aqueles que escolheram livremente através de novas eleições inclusivas, transparentes e credíveis”, reiterou Borrell.

No mesmo comunicado, o chefe da Diplomacia europeia referiu que a “UE está a rever as suas relações com a Bielorrússia”. Após as eleições, a relação entre Minsk e Bruxelas agudizou-se e a Comissão Europeia prometeu uma ajuda de 50 milhões para o combate à pandemia de covid-19 e três milhões para a ajudar a sociedade civil bielorrussa.

A líder da oposição, Svetlana Tikhanouskaia, reuniu-se na segunda-feira com os ministros dos Negócios Estrangeiros europeus e apelou a que Bruxelas corte o financiamento ao regime de Lukashenko, que na semana passada garantiu um empréstimo de 1,5 mil milhões de dólares de Moscovo, seu principal aliado.

“Pedi à Europa para não apoiar financeiramente o regime. Todo o dinheiro que Lukashenko consiga agora não irá para apoiar o povo bielorrusso, mas sim para mais repressão”, afirmou Tikhanouskaia, que viu os 27 Estados-membros falharem, na passada segunda-feira, a aplicação de sanções a figuras do regime, depois do veto de Chipre.

Para esta quinta-feira estava prevista uma reunião extraordinária do Conselho Europeu, em que a Bielorrússia era um dos temas em cima da mesa, mas o encontro foi adiado para 1 e 2 de Outubro, depois de o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, ter sido forçado a entrar em quarentena por ter estado em contacto com um funcionário infectado com covid-19.

Os ministros dos Negócios Estrangeiros da UE reúnem-se novamente no próximo dia 12 de Outubro para discutir a crise política na Bielorrússia, e o chefe da Diplomacia europeia mostrou-se confiante na aplicação das sanções nessa data.

Tal com como a UE, também o Reino Unido, os Estados Unidos e o Canadá não reconhecem legitimidade a Lukashenko. O ministro dos Negócios Estrangeiros britânico, Dominic Raab, afirmou esta quinta-feira que os três países estão a preparar sanções conjuntas aos “responsáveis pelas graves violações de direitos humanos” na Bielorrússia.

Pedro Bastos Reis | Público

EUA/Eleições | Trump: “Teremos de ver o que acontece”

Posted: 24 Sep 2020 09:59 AM PDT

Trump não se compromete com transição pacífica de poder se perder as eleições

As declarações, que não são propriamente inéditas, geraram críticas dos democratas mas também dos republicanos. “Isto é fascismo, vivo e de boa saúde no Partido Republicano”, classificou Julián Castro, que integrou a Administração Obama. “A transição pacífica de poder é fundamental para a democracia; sem isso, temos a Bielorrússia”, sugeriu o senador republicano Mitt Romney

Presidente dos EUA, Donald Trump, voltou esta quarta-feira a não se comprometer com uma transição pacífica de poder caso não consiga a sua recondução no cargo nas eleições de 3 de novembro. “Bom, teremos de ver o que acontece. Sabem que me tenho queixado veementemente dos boletins de voto. E os boletins de voto são um desastre”, declarou em conferência de imprensa.

Trump referia-se aos votos por correspondência, que serão um instrumento fundamental neste ato eleitoral devido à pandemia de covid-19. O atual inquilino da Casa Branca tem vindo a alegar, sem apresentar provas, que a votação postal conduzirá a fraude nas eleições. “Livrem-se dos boletins e terão [uma transição] muito… francamente, não haverá uma transferência. Haverá uma continuação. Os boletins estão fora de controlo”, reforçou.

A CNN recorda que Trump já anteriormente se tinha recusado a esclarecer se aceitaria os resultados das eleições e até ‘brincou’ com a possibilidade de se manter no cargo após os dois mandatos previstos na Constituição. Mas a sua recusa em garantir uma transição sem violência vai mais além, sublinha a estação de televisão, sobretudo tendo em conta a tensão que se vive em várias cidades americanas com a mobilização de forças federais para conter os protestos antirracistas.

 

Julián Castro, que fez parte da Administração Obama e integrou a corrida à nomeação democrata para as eleições de novembro, reagiu no Twitter às mais recentes declarações presidenciais. “No mesmo dia, Trump recusou uma transição pacífica de poder e apressou a confirmação de um juiz do Supremo Tribunal para lhe entregar uma eleição se os resultados forem contestados. Isto é fascismo, vivo e de boa saúde no Partido Republicano”, escreveu.

No entanto, as declarações de Trump também têm gerado desconforto no interior do Partido Republicano. O senador Mitt Romney escreveu no Twitter que “a transição pacífica de poder é fundamental para a democracia”. “Sem isso, temos a Bielorrússia. Qualquer sugestão de que um Presidente poderá não respeitar esta garantia constitucional é tanto impensável como inaceitável”, acrescentou.

“Não. Tenho de ver. Não, não vou dizer ‘sim’. Não vou dizer ‘não’. Também não o disse da última vez”, adiantou Trump, referindo-se à sua recusa em garantir que aceitaria os resultados das eleições de 2016, que acabou por vencer.

Anteriormente, o Presidente insinuou que o seu opositor, o democrata Joe Biden, só ganharia se as eleições fossem “viciadas” e sugeriu que os resultados poderiam ser contestados até no Supremo. As sondagens nacionais colocam Trump atrás de Biden mas, em certos estados, a folga (quando ela existe) é curta, antevendo-se uma disputa renhida.

Desde cedo, o Partido Democrata tem vindo a mostrar inquietação com a possível tentativa de Trump de se agarrar ao poder, servindo-se da sua autoridade como Presidente. A presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, chegou a sugerir que Trump poderia ter de ser “fumigado” do cargo se se recusar a aceitar os resultados eleitorais.

Expresso

Portugal | O Chega é excecional

Posted: 24 Sep 2020 09:01 AM PDT

Daniel Oliveira | TSF | opinião

Daniel Oliveira dispensa demorar-se “nesta forma estranha de eleger uma direção, que é apresentar três vezes a mesma lista e insinuar uma demissão caso ela não seja aprovada”, e no facto de, “além de haver quem queira castrar homens, haver quem queira tirar ovários a mulheres que abortem, o que quer dizer que a igualdade de género começa a fazer o seu caminho no Chega”.

O que mais prende a atenção do cronista é o “espetáculo de amadorismo que foi a organização” da convenção do Chega. Apesar de Daniel Oliveira defender “o regresso à normalidade possível”, com “eventos religiosos, políticos, culturais e económicos”, que devem “ser bem organizados”, o que aconteceu em Évora, aponta o jornalista, “foram cadeiras coladas umas às outras, sem qualquer distanciamento, como já não se vê em nenhum tipo de evento, mesmo com muito menos gente”.

As descrições do primeiro dia de congresso do partido da extrema-direita são consentâneas na versão do abandono das máscaras por parte da maioria dos congressistas, “incluindo o líder, que andou praticamente todo o dia sem máscara, num sítio fechado, com 500 pessoas” e da inexistência de “percursos marcados”. Assim, conclui Daniel Oliveira, o Chega “passou pela enorme vergonha de ter tido dos primeiros grandes eventos a receber uma visita da GNR, de tal forma eram as violações das regras sanitárias mais básicas”.

“Aquele congresso não tem a complexidade duma Festa do Avante! ou de uma peregrinação a Fátima. Estamos a falar de 500 pessoas, ou pouco mais, pré-inscritas, quase todas da mesma organização, que estão durante um dia e meio ou dois dias num espaço delimitado, com cadeiras para se sentarem.” Na perspetiva de Daniel Oliveira, é “difícil encontrar uma iniciativa mais simples para se organizar cumprindo as novas regras”. No entanto, as normas não foram respeitadas, “não sei se por desleixo deliberado ou por incompetência”, comenta o jornalista.

Daniel Oliveira considera “irónico” que tal incumprimento tenha acontecido “num partido que exigiu conhecer o parecer da DGS para a Festa do Avante!, que este fosse público, por causa da exceção que estava a ser feita ao PCP ou que quis o confinamento específico dos ciganos, porque ‘não cumpriam as regras e elas eram para todos e para todas’ – não obrigatoriamente para os delegados do Chega”.

 

Apesar da juventude do partido recentemente criado, esta era “uma iniciativa facílima de organizar” e Daniel Oliveira salienta que “não parecem faltar meios financeiros ao Chega”. É também de estranhar, prossegue o jornalista, que um “partido com apenas um deputado tenha tanto dinheiro para organizar tanta coisa”, mas esse é um “debate” para ser feito “brevemente”. “Como é que um partido com uma subvenção relativamente pequena consegue organizar e montar tendas enormes para 500 pessoas? Um dia descobriremos. Meios não lhes faltam, têm outdoors espalhados pelo país inteiro. O que lhes falta é capacidade de organização, e isso já foi visível por altura da recolha de assinaturas.”

Há ainda uma consideração que o cronista faz questão de sublinhar, por ser “justo” fazê-lo: “o cuidado de ter pessoal da saúde na convenção”. A ironia é logo explicada: “Qual António Costa em comissão de honra, a bastonária da Ordem dos Enfermeiros resolveu lá aparecer, fora do momento que era para os convidados, para dar, segundo ela, ‘um beijo ao André, como amiga’. Imagino que para agradecer, em nome dos profissionais de saúde, o desrespeito pela saúde pública que levou à intervenção da GNR.”

“Só espero que o beijo, pelo menos, tenha sido simbólico”, atira o jornalista. Mas as críticas não se limitam aos participantes; também a imprensa poderia ter dado exemplos melhores, avalia o cronista. Daniel Oliveira acrescenta que “o que não vimos foi a mesma vigilância da comunicação social que houve em relação à Festa do Avante!, um evento muitíssimo mais complexo, onde foram cumpridas as regras”. Não foi “seguramente por falta de cobertura, porque nunca se viu na História deste país um partido com um deputado ter direito a tanto tempo de antena”.

* Texto redigido por Catarina Maldonado Vasconcelos

Mais três mortes e 691 novos casos de Covid-19 em Portugal

Posted: 24 Sep 2020 06:33 AM PDT

Até ao momento, 46676 pessoas conseguiram recuperar, das quais 386 nas últimas 24 horas.

Estão confirmadas 1931 mortes devido à Covid-19 em Portugal, mais três do que no último boletim epidemiológico.

O número de pessoas infetadas pela doença até agora é de 71 156, mais 691 do que nas últimas 24 horas. Há, neste momento, 22549 casos ativos.

Até ao momento, 46676 pessoas conseguiram recuperar, das quais 386 nas últimas 24 horas.

Há 41696 pessoas em vigilância pelas autoridades de saúde.

TSF

LEIA AQUI TUDO SOBRE A COVID-19 — TSF

Portugal | Bloqueio central à transparência

Posted: 24 Sep 2020 05:57 AM PDT

Vítor Santos* | Jornal de Notícias | opinião

O PS e o PSD decidiram vedar aos portugueses a possibilidade de conhecerem integralmente o relatório da auditoria especial ao Novo Banco.

Os partidos do arco da governação estiverem à altura dos seus pergaminhos: conduzem o país desde 1974 e se há coisa que não podemos apontar-lhes é incoerência, uma vez que contribuem desde a primeira hora para a falta de transparência, sobretudo quando é necessário compreender para onde voa o dinheiro dos contribuintes.

Não é que restassem grandes esperanças em relação àquilo que falta conhecer sobre a gestão deste banco péssimo mal batizado como “bom”, mas era importante demonstrar vontade de dar a conhecer os segredos de sucessivos desvios, negócios a merecer, no mínimo, reparos e perdas de milhões.

A transparência ficou adiada outra vez, quando nem sequer existia o argumento da ilegalidade que seria divulgar o nome dos clientes, porque quando o documento chegou ao Parlamento já as referências aos titulares das contas estavam encriptadas. O que preocupa, então, os deputados? Cecília Meireles, que se absteve, não quis dar à instituição motivos para se vitimizar.

Segundo a deputada do CDS, o Novo Banco defende que poderão acontecer prejuízos por serem divulgadas perdas em ativos que estão em processo de venda. À falta do argumento do sigilo bancário – protegidos os nomes dos clientes, nunca estaria em causa -, lá apareceu este, como poderia ter aparecido outro qualquer. É caso para perguntar por onde andava este espírito tão zeloso na defesa dos interesses da instituição quando esta permitiu negócios que desaguaram em perdas de 225 milhões de euros com empresas de um só cliente, no caso, Luís Filipe Vieira.

É lamentável que os contornos destas operações ruinosas permaneçam na penumbra. Que a administração do Novo Banco assim as queira preservar, percebe-se. Mas o mesmo não é possível dizer em relação aos partidos, que continuam a atirar areia para os nossos olhos e os nossos impostos para um buraco cuja dimensão e origem continuam por esclarecer cabalmente.

*Editor-executivo

Apelo de Chomsky à Internacional Progressista

Posted: 24 Sep 2020 05:32 AM PDT

Em discurso notável, o intelectual dissidente adverte: há uma ameaça dupla contra o planeta e a democracia. O fascismo dos Trump, Bolsonaro e Modi, exibe as garras e pode vencer. Contra ele, não serve a volta ao “velho normal”. É hora de ousadia

Noam Chomsky | no Progressive International | Outras Palavras | Tradução de Simone Paz

Discurso de abertura do membro do Conselho durante a cúpula inaugural da Internacional Progressista, em setembro de 2020.

Estamos reunidos num momento extraordinário, um momento que é, de fato, único na história da humanidade, um momento de mau agouro e, ao mesmo tempo, repleto de esperança por um futuro melhor. A Internacional Progressista (IP) tem um papel crucial a desempenhar: determinar o rumo que a história vai tomar.

Nos encontramos num momento de confluência de crises de extraordinária gravidade, com o destino do experimento humano literalmente em risco. Nas próximas semanas, os problemas atingirão o ponto crítico nas duas maiores potências imperiais da era moderna.

A decadente Grã Bretanha, depois de ter declarado publicamente que rejeita o direito internacional, está à beira de um rompimento agudo com a Europa, a caminho de se tornar um satélite americano, ainda mais do que já é. Mas, é claro, o mais importante para o futuro é o que acontece na hegemonia global — diminuída por Trump, mas ainda com poder avassalador e vantagens incomparáveis. Seu destino, e com ele o destino do mundo, pode ser determinado em novembro.

Não é de estranhar que o resto do mundo esteja preocupado, quando não horrorizado. Seria difícil achar um comentarista mais sóbrio e respeitado do que Martin Wolf, do London Financial Times. Ele escreveu que o Ocidente está enfrentando uma crise grave e que, se Trump for reeleito, “será terminal (ou o fim)”. Palavras fortes, e isso que ele nem se refere às grandes crises que a humanidade enfrenta.

Wolf se refere à ordem global, uma questão crítica, embora não na escala de crises que nos ameaçam com consequências muito mais sérias, as crises que empurram os ponteiros do famoso Relógio do Juízo Final em direção à meia-noite — rumo à extinção.

O conceito de “terminal” de Wolf não é novo no discurso público. Há 75 anos vivemos à sombra dele, desde que soubemos, em um inesquecível dia de agosto, que a inteligência humana havia criado os meios que em breve produziriam a capacidade de destruição terminal. Isso já foi esmagador, mas ainda havia mais. Na época, não se sabia que a humanidade estava entrando em uma nova era geológica, o Antropoceno, em que as atividades humanas estão expropriando o meio ambiente de tal forma que agora também ele se aproxima da destruição terminal.

 

Os ponteiros do Relógio do Juízo Final foram estabelecidos pouco depois das bombas atômicas terem sido usadas num paroxismo de massacre desnecessário. Os ponteiros vêm oscilando desde então, à medida em que as circunstâncias globais tem evoluído. Para cada ano de Trump no poder, os ponteiros chegaram mais perto da meia-noite. No passado mês de janeiro, analistas pararam de falar em minutos, e passaram a utilizar os segundos: cem segundos para a meia-noite. Eles citaram as mesmas crises de antes: as crescentes ameaças de guerra nuclear e catástrofe ambiental, e a deterioração da democracia.

À primeira vista, essa última pode parecer fora de contexto, mas não está. A deterioração da democracia se encaixa nesse trio sombrio. A única esperança de escapar das duas ameaças de extinção é uma democracia vibrante na qual cidadãos interessados ​​e informados estejam totalmente envolvidos na deliberação, formulação de políticas e ação direta.

Isso foi em janeiro passado. Desde então, o presidente Trump ampliou as três ameaças, numa conquista nada trivial. Continuou a demolir o regime de controle de armas, que oferecia certa proteção contra a ameaça da guerra nuclear, enquanto pressiona o desenvolvimento de novas armas ainda mais mortais, para deleite da indústria militar. Em seu dedicado compromisso de destruir o meio ambiente que sustenta a vida, Trump abriu vastas novas áreas para perfuração, incluindo a última grande reserva natural. Enquanto isso, seus capangas estão sistematicamente desmantelando o sistema regulatório que de alguma maneira amenizava o impacto destrutivo dos combustíveis fósseis e protegia a população de produtos químicos tóxicos e poluição, uma maldição que agora é duplamente mortal durante uma grave epidemia respiratória.

Trump também liderou sua própria campanha para acabar com a democracia. Por lei, as nomeações presidenciais são sujeitas à confirmação do Senado. Trump foge desse inconveniente deixando as vagas abertas e, em vez disso, preenchendo os cargos com “nomeações temporárias” que atendem à sua vontade — e se não o fizerem com lealdade suficiente, são demitidos. Ele acabou com qualquer voz independente dentro do Executivo. Só permanecem os bajuladores. Há muito tempo, o Congresso estabeleceu Inspetores-Gerais para monitorar o desempenho do Poder Executivo. Eles começaram a desvendar o pântano de corrupção que Trump criou em Washington, mas o presidente cuidou rapidamente despediu-os para preservar sua imagem. Não sobrou quase ninguém para espiar o que estava acontecendo no Senado Republicano, já que Trump havia controlado todo mundo; com isso, só restam alguns lampejos de integridade, aterrorizados e imobilizados pela base popular que Trump articulou.

Este ataque à democracia é apenas o começo. O último passo de Trump será o de avisar que ele não pode deixar o cargo enquanto não estiver satisfeito com o resultado da eleição de novembro. A ameaça é levada muito a sério nos altos escalões. Para citar apenas alguns exemplos, dois comandantes militares aposentados, altamente respeitados, divulgaram uma carta aberta ao presidente do Estado-Maior Conjunto, General Milley, reforçando sua responsabilidade constitucional de enviar o exército para tirar à força um “presidente sem lei” que se recuse a deixar o cargo após derrota eleitoral, convocando em sua defesa os tipos de unidades paramilitares que despachou para Portland, Oregon, a fim de aterrorizar a população por causa da forte objeção das autoridades eleitas.

Muitas autoridades consideram o aviso realista, entre eles o Projeto de Integridade de Transição de alto nível, que acaba de relatar os resultados do “jogo de guerra” que vem conduzindo, sobre os possíveis resultados das eleições de novembro. Os membros do projeto são “alguns dos mais destacados republicanos, democratas, funcionários públicos, especialistas em mídia, pesquisadores e estrategistas”, explica o codiretor do projeto, que incluiu figuras proeminentes de ambos os partidos. Em qualquer cenário plausível além de uma clara vitória de Trump, os jogos levaram a uma espécie de guerra civil, com Trump escolhendo encerrar “o experimento americano”.

Novamente, palavras fortes, nunca antes ditas por vozes sóbrias do mainstream. O próprio fato de que tais pensamentos surjam já é bastante ameaçador. Eles não estão sozinhos. E dado o incomparável poder dos EUA, o que está em risco é muito mais do que a “experiência americana”.

Na frequentemente conturbada história da democracia parlamentar, nunca aconteceu nada parecido a isso. Nos anos recentes, Richard Nixon — longe de ser a pessoa mais encantadora da história presidencial — tinha boas razões para acreditar que havia perdido a eleição de 1960 apenas por causa da manipulação criminosa realizada por operativos democratas. Ele não contestou os resultados, privilegiando o bem-estar do país antes que sua ambição pessoal. Albert Gore fez o mesmo em 2000. Não é o que acontece hoje.

Trilhar novos caminhos no desprezo ao bem-estar do país não é suficiente para o megalomaníaco que domina o mundo. Trump também anunciou, mais uma vez, que pode desconsiderar a Constituição e “negociar” um terceiro mandato, se ele resolver que tem direito ao mesmo.

Alguns optam por rir de tudo isso como se se tratasse da brincadeira de um bufão. Sob iminente risco, como a história nos mostra.

A sobrevivência da liberdade não é garantida por “barreiras de pergaminho”, advertia James Madison. Palavras no papel não são suficientes. Ela depende da expectativa de boa fé e decência comum, que foram estilhaçadas por Trump, juntamente com seu parceiro de conspiração, o líder da maioria no Senado, Mitch McConnell, que transformou o “maior órgão deliberativo do mundo”, como ele se autodenomina, em uma piada patética. O Senado de McConnell se recusa até mesmo a considerar propostas legislativas. Sua prioridade é ser generoso com os ricos e empilhar o judiciário, de cima a baixo com jovens advogados de extrema direita que deveriam ser capazes de salvaguardar a agenda reacionária de Trump-McConnell por uma geração — sem importar o público deseja, nem o que o mundo precisa para sobreviver.

O infame serviço prestado aos ricos do partido Republicano Trump-McConnell é bastante notável, até mesmo para os padrões neoliberais de exaltação da ganância. Dois dos maiores especialistas em política tributária, os economistas Emmanuel Saez e Gabriel Zucman, ilustram a situação: eles mostram que em 2018, após a fraude fiscal que foi a única conquista legislativa de Trump-McConnell, “pela primeira vez nos últimos cem anos, bilionários pagaram menos [em impostos] do que trabalhadores do aço, professores e aposentados”, apagando “um século de história fiscal”. “Em 2018, pela primeira vez na história moderna dos Estados Unidos, o capital foi tributado menos do que o trabalho” — uma vitória verdadeiramente impressionante da guerra de classes, chamada de “liberdade” na doutrina hegemônica.

O Relógio do Juízo Final foi definido em janeiro passado, antes de que compreendêssemos a magnitude da pandemia. Cedo ou tarde, a humanidade se recuperará da pandemia, a um custo terrível. É um custo desnecessário. Vemos isso claramente a partir da experiência de países que tomaram medidas decisivas quando a China forneceu ao mundo as informações relevantes sobre o vírus em 10 de janeiro. Entre eles, alguns do Leste-Sudeste Asiático e da Oceania; enquanto isso, outros, se arrastando na retaguarda, geraram desastres absolutos — evidentemente, os EUA, seguidos pelo Brasil de Bolsonaro e pela Índia de Nahendra Modi.

Apesar da má-fé ou indiferença de alguns líderes políticos, no final das contas haverá algum tipo de recuperação da pandemia. Não iremos, no entanto, nos recuperar do derretimento dos glaciares polares; ou da alta de explosões de incêndios árticos, que liberam enormes quantidades de gases de efeito estufa na atmosfera; ou de outros de nossos passos, na marcha rumo à catástrofe.

Quando os cientistas mais proeminentes, especialistas em clima, nos alertam para “entrar em pânico já!”, eles não estão sendo alarmistas. Não temos tempo a perder. Poucos estão fazendo o suficiente e, pior ainda, o mundo é amaldiçoado por líderes que não apenas se recusam a tomar medidas suficientes, mas estão deliberadamente acelerando a corrida para o desastre. A nocividade da Casa Branca está de longe na liderança dessa monstruosa criminalidade.

Não são apenas os governos. O mesmo vale para as indústrias de combustíveis fósseis, os grandes bancos que as financiam e outras indústrias que lucram com ações que colocam a “sobrevivência da humanidade” em sério risco, nas palavras de um memorando interno que vazou do maior banco da América.

A humanidade não sobreviverá por muito tempo a essa crueldade institucional. Os meios para administrar a crise estão disponíveis. Mas não por muito tempo. Uma das principais tarefas da Internacional Progressista é garantir que todos entremos em pânico agora — e que possamos agir de acordo.

As crises que enfrentamos neste momento único da história humana são, naturalmente, internacionais. A catástrofe ambiental, a guerra nuclear e a pandemia não têm fronteiras. E de uma forma menos clara, o mesmo se aplica ao o terceiro dos demônios que perseguem a terra e conduzem o ponteiro dos segundos do relógio do Juízo Final para a meia-noite: a deterioração da democracia. O caráter internacional dessa praga fica evidente quando examinamos suas origens.

As circunstâncias variam, mas existem algumas raízes em comum. Grande parte da perversidade se remonta ao ataque neoliberal à população mundial, em vigor há 40 anos.

O caráter básico do ataque foi capturado nos pronunciamentos iniciais de suas figuras mais proeminentes. Ronald Reagan declarou em seu discurso inaugural que o governo é o problema, não a solução — o que ele queria dizer é que as decisões devem ser transferidas dos governos, que estão pelo menos parcialmente sob controle público, para o poder privado, que é completamente inexplicável ao público, e cuja única responsabilidade é o auto-enriquecimento, como proclamou o economista-chefe Milton Friedman. A outra foi Margaret Thatcher, que nos ensinou que não existe sociedade, apenas um mercado no qual as pessoas são lançadas para sobreviver da melhor maneira possível, sem organizações que as capacitem a se defender contra sua devastação.

Inconscientemente, sem dúvida, Thatcher estava parafraseando Marx, que condenou os governantes autocráticos da sua época por transformarem a população em um “saco de batatas”, indefeso contra o poder concentrado.

Com consistência admirável, os governos Reagan e Thatcher agiram imediatamente para destruir o movimento trabalhista, principal obstáculo ao severo governo de classe dos senhores da economia. Ao fazer isso, eles adotavam os princípios centrais do neoliberalismo desde seus primeiros dias no período entre guerras, em Viena, onde o fundador e santo padroeiro do movimento, Ludwig von Mises, mal conseguiu controlar sua alegria quando o governo protofascista destruiu violentamente o excelente sistema social da democracia austríaca e os desprezíveis sindicatos que estavam interferindo na economia, ao defender os direitos dos trabalhadores. Como von Mises já explicava em seu clássico Liberalismo (1927), cinco anos depois que Mussolini iniciou seu brutal regime, “não se podia negar que o fascismo e movimentos semelhantes que visam o estabelecimento de ditaduras estão cheios das melhores intenções e que sua intervenção salvou, naquele momento, a civilização europeia. O mérito que o fascismo conquistou para si continuará a viver eternamente na história” — mesmo sendo apenas temporário, como nos garantiu. Os camisas-negras irão para casa após terem realizado seu bom trabalho.

Os mesmos princípios inspiraram um apoio neoliberal entusiástico à horrível ditadura de Pinochet. Alguns anos depois, eles foram postos em prática na arena global de uma forma diferente, sob a liderança dos Estados Unidos e do Reino Unido.

As consequências eram previsíveis. Uma delas foi a forte concentração de riqueza em contraste com a estagnação de grande parte da população, refletida na esfera política pelo enfraquecimento da democracia. O impacto nos Estados Unidos mostra com muita clareza o que podemos esperar quando as leis dos negócios são virtualmente incontestáveis. Após 40 anos, 0,1% da população detém 20% da riqueza, o dobro do que tinham quando Reagan foi eleito. A remuneração dos CEOs disparou, atraindo a riqueza da administração geral junto com ela. Os salários reais dos trabalhadores comuns do sexo masculino diminuíram. A maioria da população sobrevive de salário em salário, quase sem reservas. As instituições financeiras, em grande parte predatórias, explodiram em escala. Houverepetidos acidentes com os perpetradores sendo resgatados pelo contribuinte amigável, embora isso seja o mínimo do subsídio estatal implícito que recebem. Os “mercados livres” levaram à monopolização, com redução da concorrência e inovação, à medida que os fortes engoliam os fracos. A globalização neoliberal desindustrializou o país por meio de acordos de investimento e comércio chamados erroneamente de “acordos de livre comércio”. Ao adotar a doutrina neoliberal de “imposto é roubo”, Reagan abriu as portas para paraísos fiscais e empresas de fachada, antes proibidos de funcionar graças a leis de fiscalização eficazes. Isso criou uma enorme indústria de evasão fiscal que facilitou o roubo em massa pelos mais ricos e pelo setor corporativo da população em geral. Não foi uma mudança pequena. O escopo é estimado em dezenas de trilhões de dólares.

E assim continua, à medida em que a doutrina neoliberal se consolida.

Como o ataque estava apenas começando a tomar forma, em 1978, o presidente do United Auto Workers, Doug Fraser, demitiu-se de um comitê de gestão trabalhista que foi criado pelo governo Carter, escandalizado com o fato dos líderes empresariais terem “optado por travar uma guerra de classes unilateral neste país — uma guerra contra os trabalhadores, os desempregados, os pobres, as minorias, os muito jovens e os muito velhos, e até mesmo muitos na classe média de nossa sociedade”, e por terem “quebrado e descartado o pacto frágil e não-escrito que existia anteriormente, durante um período de crescimento e progresso” — no período de colaboração de classes sob o capitalismo organizado.

Sua compreensão de como o mundo funciona foi um tanto tardia — na verdade, tarde demais para se defender da amarga guerra de classes lançada por líderes empresariais que logo receberam total autonomia de governos cúmplices. As consequências disso em grande parte do planeta não são nenhuma surpresa: raiva generalizada, ressentimento, desprezo pelas instituições políticas, enquanto as principais instituições econômicas são ocultadas pela propaganda eficaz. Tudo isso proporciona um território fértil para demagogos que fingem ser seus salvadores enquanto te apunhalam pelas costas, enquanto desviam a culpa para bodes expiatórios: imigrantes, negros, a China, ou quem quer que se encaixe em preconceitos de longa data.

Retornando às grandes crises que enfrentamos neste momento histórico, todas são globais e duas Internacionais estão se formando para enfrentá-las. Uma está sendo inaugurada hoje: a Internacional Progressista. A outra está tomando forma sob a liderança da Casa Branca de Trump, uma Internacional Reacionária que compreende os Estados mais reacionários do mundo.

No hemisfério ocidental, essa Internacional Reacionária inclui o Brasil de Bolsonaro e alguns outros. No Oriente Médio, os principais membros são as ditaduras familiares do Golfo; a ditadura egípcia de al-Sisi, talvez a pior da amarga história do Egito; e Israel, que há muito descartou suas origens social-democratas e se deslocou para a direita — no efeito já previsto da ocupação prolongada e brutal. Os acordos atuais entre Israel e as ditaduras árabes, formalizando relações tácitas de longa data, são um passo significativo para solidificar a base da Internacional Reacionária no Oriente Médio. Os palestinos são humilhados e espancados, destino próprio de quem não tem poder e não rasteja devidamente aos pés dos mestres naturais.

Ao Leste, um candidato natural é a Índia, onde o primeiro-ministro Modi está destruindo a democracia secular do país e transformando-o em um estado nacionalista hindu e racista, enquanto acaba com a Caxemira. O contingente europeu inclui a “democracia iliberal” de Orban na Hungria e elementos semelhantes em outros lugares. A Internacional também tem forte apoio das instituições econômicas globais dominantes.

As duas internacionais compreendem boa parte do mundo, uma a nível de estados, a outra, a nível de movimentos populares. Cada uma representa proeminentemente forças sociais muito mais amplas, com imagens do mundo muito conflitantes, que devem emergir da atual pandemia. Uma força está trabalhando incansavelmente para construir uma versão mais dura do sistema global neoliberal do qual se beneficiariam enormemente, com vigilância e controle mais intensos. O outro, anseia por um mundo de justiça e paz, com energias e recursos direcionados para atender às necessidades humanas, e não às demandas de uma pequena minoria. É uma espécie de luta de classes em escala global, com muitas facetas e interações complexas.

Não é exagerado concluir que o destino do experimento humano depende do resultado dessa luta.

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Os governos, mais uma vez, aos pés das multinacionais farmacêuticas

Posted: 24 Sep 2020 04:58 AM PDT

Vacinas contra a Covid-19

– Que se tomem as medidas necessárias para fortalecer a investigação pública, garantir a sua independência do capital privado e criar uma indústria farmacêutica pública capaz de fabricar os medicamentos considerados como essenciais pela OMS, entre eles, as vacinas.

Ángeles Maestro e Eloy Navarro [*]

Desde há algum tempo que se está a evidenciar a distorção que o capitalismo introduz no conhecimento científico e, em especial, na chamada ” medicina com base na evidência ” [1] . Poderosos interesses económicos decidem o que se investiga, o que se fabrica e o que não se fabrica, privando a humanidade de avanços que o seu próprio desenvolvimento poderia oferecer. A determinação exercida pelo objetivo prioritário do lucro empresarial, que se paga com milhões de mortes prematuras e doenças evitáveis, afeta de forma decisiva a produção de medicamentos [2] . Como tem sido repetidamente denunciado, até se inventam novas patologias – ou seja, sinalizam-se doenças inexistentes – para se poderem prescrever certos medicamentos, especialmente nas doenças mentais [3] .

É bem sabido que uma das consequências esperadas da pandemia é o colossal negócio para as multinacionais farmacêuticas derivado da compra de milhões de doses de vacinas.

Agora, gigantes empresariais que exibem, anualmente, margens de lucro muito superiores às da banca, nem mesmo terão de correr riscos com os seus investimentos –, o dinheiro público dos Estados da UE, incluindo o espanhol, compra adiantadamente milhões de doses antecipadamente de vacina; e faz isso antes de terem sido demonstradas a sua validade, eficácia e segurança.

Em meados de junho, o ministro da Saúde anunciava a adesão da Espanha ao Acordo de Compra Antecipada de Vacinas [4] contra a COVID 19. Com este acordo, a UE decidiu investir grande parte dos 2.700 milhões de euros do Instrumento de Apoio a Emergências para ” contribuir para a implantação da vacina “. Ou seja, acertou-se o financiamento antecipado da produção da vacina.

A corrida entre as grandes farmacêuticas foi vencida, até agora, pela britânica AstraZeneka, que recebeu 1.200 milhões de euros da UE por 300 milhões de doses.

É significativo que o acordo de financiamento e o desembolso do dinheiro tenham ocorrido quando a fase III ainda não havia sido concluída, enquanto choviam as críticas à apresentação da vacina russa, exatamente nas mesmas condições. Acaba de ser anunciado que o ensaio clínico desenvolvido pela AstraZeneca foi suspenso devido a graves efeitos secundários.

A AstraZeneka, como outras multinacionais, já conseguiu assegurar-se não só de indemnizações dos governos da UE aos quais fornecerá a vacina, caso as empresas sejam condenadas a pagar por possíveis efeitos secundários da mesma [5] , mas também está a tentar ficar totalmente isenta de responsabilidade civil.

Perante uma situação grave, em que é mais do que provável que, como já aconteceu em outras ocasiões, se aproveitem a angústia e o medo da população perante a enfermidade e a morte – inoculadas em grandes doses pelos média – para que o poderoso lóbi do medicamento consiga fabulosos lucros, a Coordenadora Antiprivatização da Saúde, num comunicado recente [6] :

1.º – Denuncia que o resultado da investigação biomédica realizada com fundos públicos do Estado espanhol, que se reduziu em 25% nos últimos dez anos, é sistematicamente transferido para empresas privadas [7] . Desta forma, e mais uma vez, o desmantelamento ou a parasitação do setor público, deixa a saúde sem instrumentos próprios e favorece o colossal negócio das empresas privadas.

2.º – Afirma que o dinheiro público pago a multinacionais farmacêuticas para vacinas ainda não testadas e em detrimento de instituições públicas, implicará cortes noutros serviços, especialmente graves em tempos de uma crise sanitária, social e económica como a que estamos a viver.

3.º – Refere que, quando se adotam decisões contra natura como a que estamos a analisar, costuma acontecer que anos depois se descubra que as empresas beneficiadas subornaram aqueles que estavam envolvidos em tais deliberações.

4.º – Lembra que, como depois se soube, os membros do comité de especialistas da OMS sobre a gripe A foram financiados pelas multinacionais Roche e Glaxo, fabricantes, respetivamente, do Tamiflu e da Relenza. Dessa forma, ocultou-se que esses fármacos eram ineficazes contra o vírus H1N1 e, além disso, tinham importantes efeitos secundários não declarados. A OMS exortou os governos a investirem nestes medicamentos cerca de 5.000 milhões de euros em 2009, justamente quando se iniciavam os drásticos cortes nos serviços públicos devido ao rebentar da crise.

No Estado espanhol, as enormes quantidades de ambos os medicamentos comprados pela ministra da Saúde, Trinidad Jimenz – para o tratamento de supostos 12 milhões de casos – caducaram nos armazéns [8] , segundo um relatório de 2017. Além disso, foram gastos cerca de 300 milhões de euros em vacinas contra uma epidemia que nunca existiu.

Os laboratórios envolvidos faturaram 700.000 milhões de dólares por ano.

Por tudo isto, como aponta a Coordenadora Antiprivatização da Saúde, é preciso exigir que:

1.º – Se constitua de imediato um comité científico com reconhecida independência da indústria farmacêutica para avaliar a validade, eficácia e segurança das vacinas disponíveis, inclusive as produzidas por instituições públicas de outros países.

2.º – Se tomem as medidas necessárias para fortalecer a investigação pública, garantir a sua independência do capital privado e criar uma indústria farmacêutica pública capaz de fabricar os medicamentos considerados como essenciais pela OMS, entre eles, as vacinas.

Notas:

[1] rebelion.org/la-distorsion-de-la-medicina-basada-en-la-evidencia/ .
[2] Gotzsche, Peter.C, (2014) Medicamentos que matam e crime organizado, www.researchgate.net/…
[3] www.eldiario.es/…
[4] www.boe.es/diario_boe/txt.php? id = BOE-A-2020-9132
[5] www.publico.es/… .
[6] www.casestatal.org/…
[7] saludporderecho.org/… .
[8] Relatório oficial publicado em 2017, www.aemps.gob.es/…

21/Setembro/2020

[*] Médicos e membros da Coordenadora Antiprivatização da Saúde Pública (CAS)

O original encontra-se em blogs.publico.es/… e a tradução em
pelosocialismo.blogs.sapo.pt/vacinas-contra-a-covid-19-os-governos-106695

Este artigo encontra-se em https://resistir.info/

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