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(Crónica transmitida hoje na Rádio Atlântida )
Já várias vezes afirmei, na imprensa e na rádio que nada ficará como dantes, no final da pandemia: haverá grandes alterações na atividade laboral, o processo produtivo em todos os setores sofrerá mudanças e as regras do mercado também serão modificadas. Basta analisar a situação decorrente do encerramento de empresas, a enorme perda de postos de trabalho, a quebra significativa do turismo e os seus efeitos nas infraestruturas hoteleiras, basta olhar em redor e ver a quantidade de portas fechadas nas principais artérias da cidade para compreendermos que não há dinheiro em circulação e portanto, quem não tem dinheiro não tem vícios.
Mesmo que se apele às compras no comércio tradicional, o consumismo de outrora nunca vai voltar a ser o que era, temos de nos convencer disso.
O Papa Francisco, numa mensagem enviada a um encontro virtual com jovens quadros de 115 países: cientistas, economistas, homens do saber, afirmou que “Passada esta crise sanitária que estamos vivendo, a pior reação seria cair ainda num febril consumismo e em novas formas de autoproteção egoísta. E acrescentou: política e economia devem estar ao serviço da vida, especialmente da vida humana.
A medida do desenvolvimento é a humanidade. Sem esta centralidade e orientação, ficaremos prisioneiros de um círculo alienante que somente perpetuará dinâmicas de degradação, exclusão, violência e polarização. – citei
Há um pensamento económico novo a afirmar-se que nada tem a ver com o sistema que nos trouxe até aqui, mas que muitos ainda, e infelizmente, pretendem recuperar.
Ou seja, por um lado, há cada vez mais quem defende que a economia deve orientar-se na preservação do meio ambiente, na proteção da natureza, na inclusão de todos os homens, sobretudo dos excluídos, fruto da economia sem coração, sem alma, que criou um enorme fosso entre ricos e pobres; por outro, instituições de grande peso económico e político como o conselho económico e social portiguês, continuam a defender um orçamento de estado expansionista, para relançar a economia, dentro das linhas tradicionais. Se é verdade que não se pode mudar tudo de um momento para o outro, está-se a perder tempo, porque esta crise pandémica deve constituir um momento de viragem para reorientar a atividade económica e o desenvolvimento da sociedade numa direção que promova a integração social e a solidariedade humana.
Sim solidariedade social, pois só ela promove o desenvolvimento humano de todos, sobretudo dos mais fracos, aproveitando o contributo coletivo e as capacidades que cada cidadão deve dar ao bem-comum.
O desenvolvimento económico constrói-se com pessoas. Infelizmente parece-me que aqui nos Açores, estas questões passam ao lado das preocupações dos políticos, dos empresários, dos trabalhadores e até do meio académico.
Defendo há muito que para deixarmos de estar na cauda da Europa, devemos saltar para a linha da frente com projetos empresariais que tenham na proteção ambiental e no turismo com ela conexo, na exploração e preservação da zona económica exclusiva e na investigação científica e tecnológica, as traves mestras do nosso processo de desenvolvimento.
Pelos vistos, nada disto acontece. Reina um conservadorismo e uma impreparação confrangedora na tomada de decisões que nos afastará cada vez mais do pelotão da frente.
A pandemia permite parar para pensar. É um conselho antigo que nunca deixou mal ninguém. Espero que o novo governo tenha a lucidez de apontar um novo caminho para uma nova e diferente economia.
José Gabriel Ávila
22nov2020
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