Maroiços do Pico UM CIENTISTA E UM ESCRITOR esgrimem

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Partilha-se o meu artigo de resposta, publicado hoje no jornal Diário Insular, àquele escrito pelo Dr. Manuel Tomás no mesmo jornal e com o título “Um Pico de honra”.

“A prova que prova a prova da prova”

Sim. Este é claramente um artigo de resposta ao Dr. Manuel Tomás.
Não vou andar aqui para trás e para a frente com um Fenício que ele inventou, que pelos vistos atezana a memória que criou do seu avô ao vê-lo descer um maroiço em Valverde.
Nenhuma memória é infalível e nenhuma imagem completa, mas mesmo que o não fossem, elas nunca seriam uma prova científica de nada. Isso resulta da necessidade de reprodutibilidade da informação científica. Talvez por isso é que as conversas que se têm sejam com quem for, se não forem capazes de serem verificadas com factos não têm qualquer validade. Mesmo o que está escrito tem que ser passível de verificação para que se constitua um facto ou uma prova. Isso parece-me básico.
Por outro lado, a ausência de prova nunca é prova de ausência, caso contrário o ser humano nunca procuraria entender o desconhecido ou investigaria alguma coisa. Não se investiga o que se sabe, mas apenas e tão só o que não se sabe. Há quem tente vasculhar o que vai na memória dos antepassados, ou fazer investigação com o “diz que se disse”. Não vejo mal nenhum, mas não me parece ser uma boa metodologia para explicar um processo construtivo específico com concepções arquitectónicas claras e exigências técnicas singulares. Quem fez os grandes maroiços do Pico, por favor que nos explique e mostre-nos as plantas de instalação das construções. Sim, porque essas construções exigiam planeamento. As plantas não podem ser de montes de pedra, têm que contemplar os corredores e as câmaras do seu interior, porque esses equilíbrios são difíceis de obter.
Perante a hipótese (não é o mesmo que certeza, mas com investigação pode tornar-se certo) que os maroiços possam ser construções pré-portuguesas, só há que investigar. A prova não é encontrar um esqueleto no seu interior, ressuscitá-lo e obrigá-lo a falar. Não se espere que se vá tão longe. As provas são os dados científicos. Dizer-se que não há provas é resultado de não se ter lido nada sobre o assunto. Haveria que ter cautela nisso pois a negação é muito pior do que a descrença, pode entroncar no desconhecimento ou na ignorância.
Se os trabalhos de investigadores da APIA e outras Universidades, como por exemplo, Universidade dos Açores, Universidade Católica, Universidade de Salamanca, Universidade de Louvain, Universidade Fernando Pessoa, Universidade do Porto, Universidade de Wales Trinity Saint David,Universidade de Austin, Institute of Earth Sciences Jaume Almera de Barcelona, Universidade de Berna, Universidade de Utrecht, Universidade da Coruña, Royal Holloway University of London, Universidade de Barcelona, Universidade de Brown e Universidade de Lisboa, não produziram provas de uma presença pré-portuguesa no Pico, capazes de arrasar com a memória do avô do Dr. Manuel Tomás, pois fique-se sabendo que nenhuma prova vinda dos confins do Universo servirá. Não se leram esses trabalhos? Se não, não se diga que não há provas, a não ser que se confunda prova com teste da avaliação, prova de degustação ou de vinhos com prova científica. São tudo coisas muito diferentes.
O Dr. Manuel Tomás insinua que as provas foram compradas. Aqui entramos noutro campeonato, que é o “das teorias da conspiração”. Isso resolve-se facilmente, pois o senhor Dr. Manuel Tomás terá que provar isso através de investigação policial ou investigação científica. Caso não o faça, isso poderá ser revelador de alguns aspectos do seu carácter. É claro que o que ele escreveu foi outra coisa, “uma figura de estilo”, onde compra verdelho para provar com o seu amigo Fenício invisível. Assim, a insinuação não é insinuação, mas uma brincadeirinha.
Nessa brincadeirinha fica-se na dúvida se o autor sabe mesmo distinguir prova de vinhos de prova científica, porque ao tentarmos embrulhar muito bem insinuações, o pacote é aquilo que fica à mostra.
É pena, independentemente da origem, estatuto de conservação ou cronologia, que ainda em 2019 se destruam maroiços para a construção civil. Penso que isso é crime, e quem o vê tem obrigação de o denunciar, porque é triste podermos ser comparados aos militantes do Daesh que destruíram Palmira.
Seria de facto importante um circuito dos maroiços no Pico, com informação fidedigna, mas temo pelo que se possa dizer, porque alguém pode sentir-se impelido a contar a um estrangeiro que por aí passe que “o avô do Dr. Manuel Tomás desceu aquele maroiço no século XIX e o seu neto no século XXI quando se dirigia a um jantar vínico com o seu amigo Fenício invisível. Repara-se até como são parecidas as idades: dois X e um I para cada um.”.
Parece que nada se fez com a informação recolhida no âmbito de investigações em torno dos maroiços. É normal, pois o Dr. Manuel Tomás tem-se debatido muito para que mesmo nada se faça. Enquanto uns não se preocupam que estejam conteúdos etnográficos nesses panfletos do roteiro, há outros que não querem que possam estar conteúdos científicos, mesmo que incompletos. Talvez porque a versão etnográfica está refém de apenas uma ou duas pessoas, numa lógica monopolista, mas a investigação científica não.
O panfleto poderia meter Fenícios? Até podia, se se deixar claro que não há ainda provas disso ou do seu contrário porque antes dos portugueses estarem em Portugal, estiveram galegos e moçárabes. Antes desses, romanos e lusitanos. Antes desses, fenícios e outras gentes…..Antes desses, qualquer coisa como neandertais e por aí fora. Para não me alongar muito o melhor é terminar com a Bíblia e dizer que tudo vem de “Adão e Eva”, cujo paraíso não foi claramente o Pico, apesar do Pico ser um bocado do paraíso atual.
Quanto à origem das cepas do verdelho do Pico, se calhar era uma história interessante para um historiador se entreter.
A fotografia é da autoria de Nera Stelliger.

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Comentários

Um comentário a “Maroiços do Pico UM CIENTISTA E UM ESCRITOR esgrimem”

  1. Avatar de Ana Franco
    Ana Franco

    No lançamento do meu livro -basalto, escolhi “um Pico de honra” pela qualidade ímpar do Vosso vinho e para honrar a alegria de ter o Vosso Picoense, Professor Urbano Bettencourt, a apresentar basalto.
    Ana Franco