MÁRIO FORTUNA OU HÁ MAIS MEDIDAS OU

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Mário Fortuna: “Ou há mais medidas ou vai haver mais desemprego e mais falências”

Praticamente a terminar o Verão, os empresários fazem contas à vida e o balanço não é nada favorável. O líder dos patrões açorianos, Mário Fortuna, traça nesta entrevista o retrato da situação em que muitos empresários estão a viver, o cenário para o futuro nos próximos tempos e deixa uma série de recados aos políticos.

Praticamente a terminar o Verão, que balanço é que faz da actividade empresarial, especialmente no sector do turismo?

Este Verão foi de enorme sofrimento para o sector do turismo, na generalidade das actividades.

Particularmente afectados foram os rent-a-car, os hotéis, as agências de viagens e a animação. São todas fortemente dependentes dos turistas externos que escassearam.

Menos afectados, mas mesmo assim com valores muito fracos, foram as actividades de restauração. É o que na gíria se diz ser “um ano para esquecer”.

Por meses, para muitas actividades, Maio e Junho foram de encerramento total, Julho abriu temeroso e Agosto deverá ficar-se por um terço ou menos do que era.

O Verão foi pior do que o pior dos Invernos. E é nesta época que as empresas fazem o negócio que suporta o resto do ano.

Por ilhas, as que mais dependiam do mercado externo foram as que mais sofreram – S. Miguel e Terceira (mais de 90% das dormidas). As mais pequenas sempre recuperaram alguma coisa com a procura interna, mas ficaram muito aquém do ano anterior.

O que correu bem e o que correu menos bem?

Do que correu bem: O tempo esteve bom, a vontade de retoma dos empresários foi enorme e a esperança era muita. As ilhas pequenas animaram-se um pouco.

Do que correu mal: O medo continuou a condicionar as viagens; várias declarações de “habeas corpus” mancharam a imagem dos Açores; a mensagem para os potenciais visitantes foi ambígua e incompleta afastando muitos; a procura ficou muito aquém de valores animadores; os cenários de controlo e de testagem no aeroporto de Ponta Delgada foram calamitosos.

Ao nível dos apoios oficiais, houve correcções no decorrer destes últimos meses. Foi o que esperavam ou esperavam mais?

As correcções já esperávamos porque o nosso diagnóstico apontava para que fossem inevitavelmente necessárias.

Ficaram foi muito aquém do que se pretendia. São demasiadas medidas, demasiado complexas e com intensidades que consideramos demasiado desadequadas das reais necessidades das empresas que se chegaram à frente para salvaguardar postos de trabalho e agora estão confrontadas com reaberturas quase compulsivas, mas sem clientes que as justifiquem.

Quando chegarmos ao final do ano e quando terminarem alguns dos apoios, nomeadamente ao nível do lay-off e das moratórias, o que é que vai acontecer?

Para alguns sectores ou vai haver mais medidas ou vai haver mais desemprego e muitas mais falências. Os indicadores já evidenciam que há menos empresas novas a serem constituídas e mais empresas a declarar insolvência.

Os bancos deverão estar disponíveis para prorrogar, mais uma vez, as moratórias, mas esta não é solução de fundo.

Carregar o endividamento quando os limites prudenciais já foram ultrapassados é como alimentar um abcesso que vai crescendo e minando o funcionamento do corpo.

As verbas para os Açores, decididas por Lisboa, se bem aplicadas, deveriam produzir um alívio.

Como é que é possível que a estatística oficial continue a dizer que baixou o desemprego nos meses da pandemia?

É uma questão de definição do que é um desempregado. Para se estar nesta categoria tem de se estar desempregado e a procurar emprego activamente nos 15 dias anteriores ao inquérito.

Se as pessoas estiveram confinadas e não puderam procurar emprego estão, tecnicamente, excluídas do mercado de trabalho e não contam como desempregadas.

Por esta razão, os activos do mercado de trabalho caíram em cerca de 7000 pessoas. Para além disso, de facto, o segundo trimestre apresenta menos 2400 pessoas empregadas quando comparado com igual período do ano anterior. Por esta razão a habitual taxa de desemprego aparece baixa. Mas há mesmo menos gente a trabalhar, claro!

Ao nível dos transportes, como interpreta as últimas medidas, nomeadamente a atribuição de milhões à Ryanair para continuar a operar em S. Miguel e Terceira?

O apoio que foi atribuído pela Turismo de Portugal é a continuidade do acordo inicial quando esta companhia iniciou a operação para a Terceira.

Não foram criadas as condições de procura para que se dispensasse este apoio que é, invariavelmente, para a criação de mercado, trefa que esta empresa faz muito mais eficientemente do que os demais programas que as autoridades regionais têm implementado.

O contrato programa para as ligações com Londres são mais uma iniciativa para a criação de mercado naquela origem. A Ryanair tem uma capacidade extraordinária de mobilizar passageiros para destinos e Londres é uma das suas bases principais. Faz sentido numa perspetiva de criação de mercado. Ter os Açores nas plataformas de informação e reservas da Ryanair vale muito. Poucas outras empresas poderiam oferecer um desempenho equivalente

E o papel da SATA, depois desta pandemia e das exigências da Comissão Europeia, qual será?

Sendo a posição final da Comissão uma incógnita, neste momento, importa saber qual deve ser a nossa posição sobre o assunto – queremos continuar a alimentar défices de exploração da ordem dos 50 milhões de euros por ano ou queremos uma empresa equilibrada e competitiva a servir-nos?

Acho que a resposta é óbvia.

A empresa tem de ser reestruturada para poder servir os Açores nas ligações internas e nas externas.

Se o custo for demasiado elevado em face de outras alternativas a empresa deve ser reduzida ao que é sustentável.

Penso que o que a Comissão Europeia vai exigir é a manifestação concreta desta sustentabilidade na empresa no seu todo e/ou nas suas partes componentes.

Estamos a poucos meses das eleições regionais. O que espera das propostas dos partidos na área empresarial e económica?

Temos um envelope grande para afectar a várias estratégias e actividades: 198 milhões para os danos do Lorenzo (verba que já nos tinha sido prometida pelo Governo da República); 835 milhões para mitigar o impacto da Covid-19; Cerca de 1359 milhões nos fundos da coesão; verbas adicionais do POSEI e; verbas adicionais de outros programas de aplicação directa.

Alguns partidos já manifestaram receptividade para a mudança de paradigmas que, de facto, possam mudar o nosso futuro num sentido de maior sustentabilidade. Outros mantêm-se apegados a ideias ultrapassadas que não produziram o desenvolvimento desejado no passado.

Esta é uma nova oportunidade que não podemos perder, outra vez.

Os cidadãos terão a palavra sobre o futuro.

Foi um dos principais dinamizadores da plataforma de cidadania que propôs alterações ao sistema eleitoral. Como vê a atitude do parlamento em suspender qualquer proposta legislativa no âmbito da reforma da autonomia, depois de três anos de CEVERA?

O progresso das sociedades depende muito da qualidade das suas instituições reflectido, em muito, no empenho dos cidadãos nos seus processos.

O Parlamento dos Açores e todo o edifício de organização política, baseada exclusivamente em partidos, está a revelar-se uma instituição má, a julgar pelo alheamento que criam na maioria dos cidadãos.

O desfecho dos trabalhos da CEVERA é a evidência completa de uma instituição doente e que serve mal a população.

É um exemplo que vem do parlamento, mas haverá outros que se evidenciam na desvalorização desta instituição nos processos políticos.

As disputas partidárias assumiram-se como um fim em si mesmas e não como processo para a melhoria da qualidade de vida económica, social e política da generalidade dos cidadãos ou mesmo para a melhoria da autonomia, nas suas várias valências.

O trabalho dessa Comissão acabou por alimentar apenas as clientelas que fingiram trabalhar para produzir alguma coisa para, no final, deixar tudo na mesma.

jornal@diariodosacores.pt

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