mais uma bela e tocante crónica transmontana do Francisco Madruga

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F. MADRUGA NA FONTE DA GRICHINHA 2010

 

 

 

 

O CLAVICÓRDIO EM 2010

 

E EM 2015 NO MUSEU DA GRACIOSA

 

 

 

 

 

À VOLTA DOS LIVROS

O tempo das cerejas

Conheceu Alfândega da Fé nos finais dos anos 70 do século passado.

Numa noite estrelada de maio, recebeu uma chamada do Manuel João Araújo a pergunta-lhe por onde andava se estava muito ocupado nessa noite.

Respondeu-lhe que estava em Mirandela, completamente livre, apesar de ter que apanhar a camioneta para Chaves no dia seguinte, muito cedo.

Parecia assunto urgente.

– Então vou buscar-te, jantas cá em casa e depois levo-te cedo.

Á hora combinada, encontraram-se na rua de Santo António, em frente à padaria da Inês e do Acácio.

Passaram por casa da Celeste e do Gilberto e atrelaram a Fátima à viagem.

A estrada era como hoje. Curvas e contracurvas. A noite estava estralada, a lua refletia nas árvores projetando as sombras em redor. A viagem foi rápida e aproveitaram para conversar sobre a urgência do encontro.

Havia um grupo de jovens, que estudava em Moncorvo e que queria organizar-se para concorrer às eleições para a Associação de Estudantes.

Chegados a Alfândega da Fé, foram diretos à casa do Senhor Carlos Araújo.

Já os esperavam. A mesa posta, aguardava a chegada deles.

Feitas as apresentações o Carolino, o Luís, o Carlos, a Deolinda e a mãe.

Conversaram até o Manuel João pedir autorização para se ausentarem.

Na viagem de regresso, Manuel João pediu para não falhar ao compromisso assumido, eram jovens que, além de bons alunos, eram muito interventivos.

Na década de 80, voltou a passar várias vezes por Alfândega da Fé. Os Araújos, tinham no centro da Vila, o mais importante estabelecimento comercial, onde se vendia quase tudo.

Eletrodomésticos, mercearia, gás, móveis, papelaria e livros.

Quase nunca ficava em Alfândega da Fé aproveitava-se caminho para chegar a Vila Flor, Carrazeda de Ansiães e pernoitar em Mirandela.

Mais tarde, abriu a Ovimar que já oferecia algumas condições de dormida.

Ao entrar-se no estabelecimento, era quase sempre necessário esperar-se muito tempo para se ser atendido. A frequência era muita, não havia mãos a medir. Passava-se o tempo de espera, arrumar os livros, a fazer as devoluções, a ver as faltas e a fazer as contas. Quando havia uma aberta, o Senhor Araújo aparecia para conversar. Ia e vinha várias vezes, pedia os documentos.

– Vou ver onde anda o Carolino para passar o cheque.

– Onde vai ficar hoje?

– Devo ir ficar a Mirandela.

– Já temos cá uma residencial nova. Se quiser lá ficar, eu telefono.

– Não vale a pena.

– Então, antes de ir embora, passe lá por trás para carregar um cesto de cerejas para provar das nossas.

Alfândega da Fé sempre teve motivos para merecer uma visita mais demorada.

A Capela de S. Sebastião, o Edifício dos Paços do Concelho, a Capela do Espírito Santo, o Coreto, a Igreja Matriz, a Torre do Relógio, o Centro Cultural e mais recentemente os Lagos do Sabor e as inúmeras soluções de alojamento rural.

O Carolino sempre atento indicou um caminho alternativo para Vila Flor. Eucísia ficava à direita, passava-se em frente à Fonte da Gricha ou das feiticeiras e era sempre em frente até ao Vale da Vilariça.

Anos mais tarde, voltou a Alfândega da Fé e a Eucísia, para transportar um antiquíssimo clavicórdio, que depois de recuperado, foi oferecido por Chrys Chrystello ao Museu da Graciosa, nos Açores.

E tudo isto à VOLTA DOS LIVROS, dos Amigos e das cerejas.