isolamento profilático e as ofensas à memória das vítimas da falta de liberdade

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Aplausos!…

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Filomeno Moreira to Açores Global

EDITORIAL

Dura lex…

De que serve uma Direção-Geral da Saúde quando lhe falta respaldo legal para fazer valer as recomendações que considera pertinentes fazer em defesa da saúde de todos nós? A resposta é óbvia.
Uma pandemia é assunto para colocar os políticos em segundo plano e deixar agir quem detém o conhecimento científico sobre a matéria. Aos políticos, num cenário como o que vivemos, cabe o papel de ouvir, fazer perguntas e seguir as recomendações de quem sabe, de quem estuda, de quem passou uma vida a lidar com vírus e quadros pandémicos.
O problema, ou um dos problemas, é justamente a inabilidade e falta de sentido de Estado dos líderes mundiais em acatarem como boas as recomendações da comunidade científica. Os cientistas preocupam-se com a ciência e com as melhores soluções para combater um vírus sobre o qual muito pouco se sabe ainda. Aos políticos caberia o papel de adaptar essas recomendações, dar corpo legal e tratar da sua exequibilidade. Contudo, a verdade científica nem sempre é compaginável com a vontade e agenda política ditadas por questões eleitoralistas, popularidade, e por lobbies diversos que não têm na defesa da saúde pública o seu principal motivo de atuação.
E isto leva-nos a Portugal, onde a DGS recomenda, mas não manda. E não manda, porque o atual quadro legal não o permite. Até aqui tudo mais ou menos bem, afinal ninguém estava preparado para uma pandemia como a que estamos a viver. O que espanta é que passados sete meses desde que se começou a perceber o que aí vinha nada fosse feito em matéria legislativa para poder dar voz legal às diretivas emanadas pela DGS e entidades de saúde regionais. Veja-se a figura do habeas corpus nos Açores , veja-se a questão do uso obrigatório de máscaras na Madeira, veja-se a recusa de cidadãos em fazer os testes à Covid-19.
Ora, sendo tudo ilegal, o que nos resta enquanto os partidos não decidirem chamar a si o papel que devem desempenhar em sede própria e produzir legislação adequada?
Resta-nos o civismo, a cultura do respeito pelo próximo, o dever até de cuidar de todos enquanto sociedade. O mesmo é dizer que estamos condenados a ser contaminados, infetados e deixados ao livre arbítrio do destino. Basta seguir as discussões em diversos fóruns online e debates televisivos para se perceber isso. Afirmar que o uso obrigatório de máscaras ou que o isolamento profilático são medidas castradoras das liberdades individuais é ofender a memória de todos os que efetivamente se viram privados dos seus direitos, liberdade e garantias nos tempos da ditadura! É ofender todos os que ainda hoje vivem sob o jugo de regimes autoritários ou ditatoriais, onde, aí sim, é preciso pedir licença para respirar. A lei é para ser cumprida, mas a Lei é “um ser vivo” que cresce, evolui, adapta-se. Esgrimir o argumentário legal para justificar o incumprimento de normas cujo objetivo único é a proteção de todos é não querer compreender a natureza do que está em jogo.
(Paulo Simões)
in, Açoriano Oriental, 02 de Agosto / 2020