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Em 1923, 3 aldeias entraram em guerra e o conflito durou 7 anos. Tudo começou com a falta de escrúpulos de uma família nobre. Descubra a história de Alares.
Fonte: História desconhecida de Portugal: a Guerra Civil de Alares em 1923 | VortexMag
História desconhecida de Portugal: a Guerra Civil de Alares em 1923
Em 1923, 3 aldeias entraram em guerra e o conflito durou 7 anos. Tudo começou com a falta de escrúpulos de uma família nobre. Descubra a história de Alares.
Perto das imponentes escarpas do Tejo Internacional e numa região conhecida desde há muito como o “Celeiro da Beira Baixa”, emergem no meio da terra xistosa e seca, as ruínas silenciosas da antiga aldeia dos Alares, evocativas de imensas histórias de luta pela sobrevivência, de guerra pela posse e de precipitado abandono destas terras, numa região fronteiriça cada vez mais flagelada pelo fenómeno da desertificação humana e envelhecimento das populações.
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Esta antiga aldeia, em conjunto com as aldeias da Cobeira e Cegonhas (Velhas), tiveram a sua génese no início de 1800, pela mão dos povos de Malpica do Tejo e de Monforte da Beira. Numa tentativa de defenderem o produto das suas searas, das mãos impiedosas dos Invasores Franceses aquartelados em Castelo Branco, estes aldeões colonizadores começaram a cultivar, às escondidas, a região fértil e inculta compreendida entre o Rio Aravil e o Rio Tejo, já no limiar do Rosmaninhal, obtendo boas e proveitosas culturas, à custa de muito e suado trabalho e inúmeros sacrifícios.
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Os habitantes destes montes (chamados de Monteses) viviam em casas baixas construídas em xisto, com poucas janelas, sendo a porta de entrada a principal fonte de luz natural. Por dentro era habitual o uso do barro e das prateleiras de xisto para fazer armários, ainda hoje visíveis.
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Chega o Visconde
Em 1865, foi acolhido pelo humilde povo da Cobeira um foragido político – Visconde Morão, que apercebendo-se da inexistência de qualquer título de registo de propriedade ou aluguer da terra por parte daqueles gentios ignorantes, tomou toda aquela vasta área como sua, englobando as três aldeias numa propriedade única, sem qualquer protesto ou desafio por parte dos seus habitantes, que cedo se apressaram a pagar o foro anual ao seu novo proprietário.
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Já em 1920, começaram os problemas que iriam ser a génese da Guerra dos Montes e que culminaram com a destruição e abandono destas três aldeias. Após a morte do filho do Visconde, os seus 4 herdeiros comunicaram a estes três povos que deviam abandonar todas as casas, terras e haveres imediatamente, recorrendo então, o povo, à justiça do Governador Civil de Castelo Branco. Sem se entenderem entre si e receosos da descoberta da sua ilegítima apropriação, um dos herdeiros decide vender a sua parte aos 1200 habitantes das três aldeias.
Estes deixaram de pagar as rendas aos outros netos do Visconde, que decidem então vender a sua parte a 605 habitantes do Rosmaninhal.
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O Início da Guerra
Estava instalada a confusão e a guerra. Em 7 de Outubro de 1923, no dia seguinte ao acto desta escritura, os cerca de 3000 habitantes do Rosmaninhal invadiram os Alares, devastando as culturas, queimando celeiros e destruindo as alfaias e arados.
No dia seguinte foi a vez das Cegonhas e ao longo de todo o mês de Novembro sucederam-se os mais variados actos vandalismo, estragando e inutilizando tudo, havendo relatos da época em que o mel e o azeite escorreram pelas ruas e o gado foi esfolado vivo, entre outras barbaridades.
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Ao longo de vários anos sucederam-se esses actos de pilhagem, roubo e vandalismo puro, envolvendo a destruição de culturas, a morte indiscriminada de animais e ameaças de morte a homens, mulheres e crianças que culminou em Setembro de 1924 com uma oportuna intervenção do Governador Civil para repor a ordem, que já ameaçava com uma carnificina, tudo isto em prole do uso e posse destas terras.
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O desfecho
Esta célebre contenda só seria terminada em 1930 com a expropriação das terras por parte do Governo e a sua distribuição aos diferentes povos em parcelas equitativas (glebas) num sorteio justo e planeado.
Os habitantes dos Alares acabaram por fixar-se nas terras da Raiz – actual aldeia das Soalheiras, o povo das Cegonhas (Velhas) criaram um pouco mais longe as presentes Cegonhas e o povo da Cobeira distribui-se por estas, indo também alguns para Monforte, Malpica, Ladoeiro e Couto das Correias.
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Na Actualidade
Hoje não restam mais que algumas ruínas que emergem do solo, como que a fomentar uma memória comum sobre esta peculiar guerra. Entre paredes tombadas e fornos de pão escancarados ainda se avistam cinchos e cântaros abandonados, assim como as primitivas ruas do povo.
Em redor destas ruínas avistam-se algumas imponentes propriedades agrícolas, soberbamente restauradas e actualmente mais vocacionadas para a caça turística, ou não fosse esta uma região privilegiada para a caça grossa, sobretudo veados, avistáveis mesmo de dia e em grande número