Views: 0
10.9. GEORGE ORWELL 1984 CRÓNICA 47 NOVº 2007
Como muitos o citam sem o lerem extraio um resumo adaptado sincreticamente por mim…
… a história passa-se no “futuro” ano de 1984 na Inglaterra, Pista de Pouso Número 1, megabloco da Oceânia, a congregação de países dos os oceanos. A transformação da realidade é o tema principal. Disfarçada de democracia, a Oceânia vive um totalitarismo desde que o IngSoc (Partido) chegou ao poder sob o omnipresente Grande Irmão (Big Brother). …o livro conta a história de Winston Smith, membro do partido externo, funcionário do Ministério da Verdade, cuja função é reescrever e alterar dados de acordo com o interesse do Partido. Nada diferente do que faz um qualquer jornalista ou historiador.
Winston questiona a opressão do Partido. Se alguém pensa diferente, comete crimideia, capturado pela Polícia do Pensamento é vaporizado. Desaparecia, pura e simplesmente como se nunca tivesse existido.
Winston é o cidadão comum vigiado pelas teletelas e pelas diretrizes do Partido. Todos sabiam que uma atitude suspeita poderia significar o fim, não era sair de um programa de TV com o bolso cheio de dinheiro, mas desaparecer de facto. Os vizinhos e os filhos eram incentivados a denunciar quem cometesse crimideia. Algo estava errado, Winston sentia-o e precisava extravasar. Comprou clandestinamente um bloco e um lápis (venda proibida), atualiza o diário usando o canto “cego” do apartamento, sem ser focado pela teletela. Um membro do Partido (mesmo externo) tinha teletela. A primeira frase que escreve é: Abaixo o Big Brother!
Antes da Terceira Guerra, Winston desfrutava uma vida normal com os pais, mas tinha dificuldade em lembrar o passado. A propaganda do Partido e duplipensamento tornavam a tarefa quase impossível, o futuro, presente e passado eram controlados pelo Partido. O seu trabalho era transformar a realidade. No MINIVER (Ministério da Verdade), alterava dados de tudo que contradissesse a verdade do Partido e incinerava os originais (Buraco da Memória). O Partido informa: a ração de chocolate aumenta para 20 g. Winston apagava os dados antigos quando a ração era de 30 g. A população agradece ao Grande Irmão o aumento.
O medo de comentar era um dos trunfos do Partido para o controlo da população. Havia os “Dois minutos de ódio”, em que os membros do partido veem propaganda do Grande Irmão e, direcionam o ódio contra os inimigos. A mulher de Winston separa-se por que o sexo é para procriação, o prazer era crime. Winston anota tudo, isso era proibido e muito perigoso. O que o revoltava era ver Jones, Aaronson e Rutherford, os últimos sobreviventes da Revolução, confessarem assassinatos e sabotagens, serem perdoados mas executados. Sabia que estavam na Eurásia (na época a inimiga), mas de súbito, a Lestásia passara a ser a inimiga. Bastante atual se se comparar o apoio dado a Saddam Hussein, Kadhafi, bin Laden antes de serem os inimigos eternos.
Revoltado, escreve “liberdade é escrever 2+2=4”, as fábricas têm placas 2+2 são cinco se o partido quiser.
Winston entrevista pessoas sobre a vida antes da guerra, mas os idosos não se lembram. Vê uma mulher e desconfia que seja espia da Polícia do Pensamento. No dia seguinte, encontra-a no Ministério e recebe um bilhete: “Eu te amo”. Os membros do Partido, dos sexos opostos, não deviam comunicar. Marcaram encontro num lugar secreto, e após beijá-lo, Júlia confessa-se atraída pelo rosto de Winston que ia contra o partido… O desejo dela era corromper o estado por dentro. Apaixonado, recupera peso e saúde.
O’Brien, membro do Partido Interno, percebe que Winston era diferente e convida-o, para despistar as teletelas, a ir ao seu apartamento ver a edição do dicionário de Novilíngua. O convite era incomum e fez Winston animar-se e leva Júlia ao encontro. Para espanto do casal, O’Brien desliga a teletela do luxuoso apartamento. Alguns membros do Partido Interno tinham permissão para se desconetar. Winston confessa acreditar na Fraternidade. Os planos eram regados a vinho, proibido aos do Partido Externo. Dias depois, Winston recebe a obra e devora-a. Ouve uma mulher cantar música prefabricada em máquinas de fazer versos. Nada distante da música atual. “Nós somos os mortos” filosofa Winston. A ignorância dos menos abastados não era perigo para o Partido. “Nós somos os mortos” repete a voz metálica da teletela escondida atrás de um quadro. Guardas irrompem no quarto e Winston vai preso para o Ministério do Amor. As celas tinham teletelas que vigiavam cada passo. Numa sala, O’Brien torna-se o seu torturador e explica o conceito do duplipensar, o funcionamento do Partido e questiona-o acerca das frases sobre liberdade. Torturado e drogado aceita o mundo de O’Brien e passa ao estágio seguinte aprender, entender e aceitar. Winston confessa que a Eurásia era inimiga e que nunca tinha visto a foto dos revolucionários.
Mas faltava a reintegração, ritual de passagem a concluir no Quarto 101, um inferno personalizado. Como Winston tem pavor de roedores, os torturadores colocam a máscara no rosto com abertura para uma gaiola de ratos famintos. A única forma de escapar é renegar o perigo maior ao Partido, o amor a outra pessoa acima do Grande Irmão. Winston, libertado, termina os dias sozinho. O seu rosto aparece na teletela confessando vários crimes, sendo libertado com a posição rebaixada para um trabalho ordinário num subcomité.
Trajetória de milhares de pessoas de regimes totalitários, como o checo Thomaz de “A Insustentável Leveza do Ser” de Milan Kundera[1]. Inspirado na opressão dos regimes totalitários das décadas de 1930 e 1940, o livro de Orwell critica o estalinismo e o nazismo e a nivelação da sociedade, tal como pretendem fazer em Portugal depois do 25 de abril. Uma redução do indivíduo a peça para servir o estado ou o mercado através do controlo total, incluindo o pensamento e a redução do idioma. Tudo isto acontece já e só vai piorar.
Júlia escapa do Quarto 101. O Partido separou-os e encontram-se ocasionalmente. Já não eram os mesmos. Tinham “crescido”. Winston sorri, completamente adaptado. Finalmente ama o Grande Irmão.”
O Big Brother está nas nossas vidas e aceitamo-lo sem pruridos. Sabe o que fazemos através dos cartões de crédito e débito, do cartão de cidadão, da passagem pelas portagens da autoestrada, pelo Metro e “Cartão Andante”, pelas câmaras nos centros comerciais. Não se admirem se qualquer dia com a nossa inconformidade e individualismo pudermos ser privados da pseudoliberdade por não termos cumprido as normas de higiene e de saúde que “eles” determinaram obrigatórias. Já não há espaço para seres pensantes e questionadores. Só espero que isto não acelere demasiado para os anos de vida que ainda tenho. Não se preocupem, sou assim e a fobia excessiva que tenho contra as bases de dados, é um sinal evidente da minha hipocondria e da necessidade absoluta que existe de me internarem como um perigo que sou para a sociedade uniforme e cinzenta que me querem impor. Ah! Se eu ao menos tivesse cá a cicuta, repetia-se o destino. Parecia que o mundo real lá fora estava a conspirar, mas a maior parte das pessoas nem se apercebia e vivia tranquila na morrinha da lufa diária pela sobrevivência, que a mais não podiam aspirar. …
Também isto constava das previsões de George Orwell[2].
Adquiri pés de galinha, os cabelos e pelos eriçaram-se como se tivesse visto um fantasma, isto, claro está, no caso de existirem. Comecei a olhar por sobre o ombro à cata de alguém que me espiolhe ou esquadrinhe as ideias, tão diversas do pensamento “aprovado e oficial”. Não me apetecia ser vaporizado pois tinha um legado que queria imune à ação de um qualquer ministério da verdade. A privacidade de há 10, 20 anos ou mais, seria impensável hoje. Tudo em nome da defesa dos valores sagrados da civilização ocidental. Da luta contra o terrorismo. Doutra qualquer peleja que os líderes hão de inventar. Como as armas químicas que o velhaco genocida do Saddam Hussein afinal não tinha. O mesmo que os EUA forjaram com Bin Laden. Desde há um século que “inventam” personalidades destas para fazerem o que lhes convém, lembremo-nos do Xá da Pérsia, ou do Panamá e mais as centenas de golpes falhados e os que fizeram ricochete…
[1] o caso do médico que vira pintor de paredes ao renegar as ordens do partido não é diferente dos que não se adaptam nas profissões no mundo livre
[2] (n. Eric Arthur Blair, Bengala, 1903-1950