Escravos e Traficantes no Império Português

 

Lê? Escravos e Traficantes no Império Português
Escravos e Traficantes no Império Português

Título:Escravos e Traficantes no Império Português
O comércio negreiro português no Atlântico durante os séculos XV a XIX

Escravos e Traficantes no Império Português

Coleção: História Divulgativa

Nr de páginas:
+/- 376 + 16 Extratextos

ISBN:978-989-626-478-9

Formato:16 x 23,5 x 2,0

Encadernação: Brochada

Editora : A Esfera dos Livros

SOBRE O AUTOR
Arlindo Manuel Caldeira, licenciado em História, é investigador do Centro de História de Além-Mar (Universidade Nova de Lisboa). A sua principal área de pesquisa é a História de África (particularmente Angola e golfo da Guiné), sobre a qual tem publicado vários livros e dezenas de artigos.

“Escravos e Traficantes no Império Português, O comércio negreiro português no Atlântico durante os séculos XV a XIX”, por Arlindo Manuel Caldeira, A Esfera dos Livros, 2013, é um livro admirável, tem por detrás uma exaustiva pesquisa que assegura um retrato abrangente do tráfico de escravos, da sua origem até à sua abolição, no espaço do império português.
Numa escrita direta, o autor foge de evasivas ou subterfúgios para enquadrar a problemática do negócio dos escravos, explicando que a escravatura estava presente em todas as sociedades africanas antes da chegada dos portugueses, depois dos espanhóis, a seguir dos holandeses, franceses e britânicos. Os africanos não foram vítimas passivas do “infame comércio”. As elites locais participaram conscientemente do negócio, tirando proveito e auferindo lucros significativos. Os colonizadores portugueses nunca estiveram em condições de interferir diretamente nas guerras entre os povos locais. Arlindo Caldeira, se mais necessário fosse, cita os autores que visitaram estes locais e que possuíam conhecimentos seguros sobre as atividades económicas desenvolvidas pelos portugueses. Por exemplo, um importante autor, André Álvares de Almada, no final do século XVI, escreveu que os Mandingas do rio Gâmbia vendiam muitos escravos, “uns obtidos em guerras e juízos mas muitos outros em furtos”; na Guiné, os Bijagós, hábeis marinheiros, realizavam as suas incursões por mar para obterem escravos que depois vendiam aos portugueses. Feito este importante esclarecimento sobre matéria que ainda paira, qual fantasma traumático, sobre muitas consciências, traça um correto enquadramento das principais áreas de resgate: Arguim, os “rios da Guiné”, São Jorge da Mina, o reino do Congo e Angola. Dá para perceber que a rota estratégica para as Américas partia do golfo da Guiné e Angola foi o fornecedor crucial.
O historiador tem uma comunicação persuasiva, qualquer relato prende o menos iniciado nesta vertente da História. Por exemplo, o capítulo “A Difícil Travessia” é palpitante, clarifica o transporte dos escravos do interior do continente para a costa, descreve as mercadorias que serviam de moeda de troca: os escravos eram comprados com algodões indianos, bebidas alcoólicas, tecidos, argolas de metal, noz-de-cola, armas, cavalos. São invocados testemunhos sobre a amputação de uma mão aos escravos que morriam, como testemunho a dar ao patrão. Temos aqui todas as peripécias antes do embarque, no momento da partida, durante a viagem, a sobrecarga dos navios, as condições a bordo, a gravíssima questão da água, a alimentação e até a sexualidade a bordo.
E depois documenta-se o comércio propriamente dito, com os seus lucros e perdas. O autor desmonta uma ideia feita acerca da elevada rentabilidade do comércio negreiro, descreve a evolução da posição do Estado português durante os séculos XV a XIX. Passa em revista a natureza de mercadores, armadores e contratadores, são histórias emocionantes, é fácil perceber que o próprio Santo Ofício se envolvia em questões políticas, perseguia mercadores de escravos e a história de Manuel Batista Peres, um cristão-novo que fez fortuna em Cartagena das Índias, é elucidativa. Afinal, estes negociantes portugueses monopolizavam o comércio dos escravos em prejuízo dos comerciantes espanhóis, era necessário abatê-los. É uma escrita vibrante que toma conta do leitor, seguimos sem desvio de atenção a história de João de Oliveira que foi vendido como escravo e que se tornou senhor de escravos, acompanhamos os negócios de D. José I e família, clero e aristocracia em duas poderosas companhias, a do Grão-Pará e Maranhão e Pernambuco e Paraíba.
Na segunda parte da obra, dedicada a último século do tráfico de escravos, a prosa emocionante não afrouxa, somos envolvidos na evolução das mentalidades, percebe-se a exigência britânica no abolicionismo, verificamos como o tráfico resistiu muito para além das leis que o interditavam. O historiador escreve mesmo: “Estes últimos negreiros atlânticos canalizam para o Brasil quantidades de mão-de-obra escrava a um ritmo muito acima de qualquer período anterior, empenham recursos técnicos como nunca se vira até aí, obtêm lucros inimagináveis umas décadas antes… E, tudo isto, numa época em que o tráfico de escravos já estava a ser condenado pelos espíritos mais abertos em todo o mundo ocidental e a maior potência da época colocara no Atlântico o melhor da sua Marinha de guerra para impedir o trânsito dos navios negreiros”.
No século XVIII, as três maiores praças de comércios de escravos no Brasil eram Pernambuco, Baía e Rio de Janeiro. Estes três centros importadores cresceram ao longo desse século e viriam mesmo a tornar-se os principais centros importadores do século XIX. Em 1810, em consequência do tratado luso-britânico de Aliança e Amizade, Portugal aceitou restrições ao tráfico, que demorou algumas décadas a desaparecer. Neste particular, o autor descreve os últimos negreiros, caso de Francisco Félix de Sousa, o Conde de Ferreira e a lendária D. Ana Joaquina, mas regista igualmente D. Maria Correia, Ângelo Lisboa, Arsénio de Carpo e João Francisco de Azevedo Lisboa, conhecido por Azevedinho, entre outros. O Conde de Ferreira continua a ter o seu nome ligado à filantropia, o seu nome consta na fachada de uma rede de escolas e há mesmo no Porto um conhecido hospital psiquiátrico com o seu nome. Quando se abriu o seu testamento, foi uma verdadeira caixa de surpresas, o traficante de escravos e capitalista de sucesso convertia-se num generoso filantropo em hospitais, asilos e outras obras de assistência. O autor recorda também o barão de Água-Izé, tinha propriedades da ilha do Príncipe, investiu na produção de café e mais tarde na cultura do cacau. De premeio, negociava escravos para as suas feitorias em Moçâmedes e S. Tomé e Príncipe.
escravatura
Um livre de indiscutível importância, o essencial do tráfico de escravos fica aqui registado em todas as suas vicissitudes. Como o autor observa: “Para a História fica o poder dos números: entre 1450 e 1860 quase treze milhões de africanos foram traficados no lucrativo comércio de escravos do Atlântico. Perto de seis milhões desses escravizados foram transportados em navios com a bandeira de Portugal ou do Brasil”.

 

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