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Faz hoje exactamente 4 anos – 4 anos! – que escrevi isto.
Nada mudou…
AUTONOMIA DE HOTEL
“Por estes dias, os partidos estão reunidos à porta fechada,
num hotel de Ponta Delgada, a discutir como será a reforma
autonómica.
O facto de todos terem acedido ao convite do líder do PS, Vasco
Cordeiro, é um bom sinal para a tentativa de se alcançar o consenso necessário a tantas alterações que se impõem.
Mas é preciso que os partidos sejam mais humildes nesta discussão.
É que a reforma da Autonomia é tão importante que não pode
ser confinada a quatro paredes de um hotel.
Se a pretensão dos partidos é, mais uma vez, transformar um
desígnio das nossas vidas a uma mera negociação entre profissionais da política, então temos todos os ingredientes para tudo culminar numa grande borrasca.
Os partidos não se podem julgar donos da Autonomia, nem tão
pouco porem os seus aparelhos a substituírem a reflexão democrática que se impõe na sociedade açoriana.
É isto que tem afastado os cidadãos da política, a descredibilizar a política e a olhar cada vez mais para a classe política como um “acessório” que vive longe da realidade das pessoas.
Esta discussão tem que atravessar toda a sociedade e envolver o máximo da cidadania possível.
Tem que sair dos muros dos hotéis, das paredes dos partidos, dos corredores dos palácios, dos gabinetes do parlamento e do formalismo bacoco que os políticos gostam de impor nesses momentos, teimando em não sair do mofo tradicional que exalámos há anos.
O povo está farto de formalismos.
As eleições presidenciais de domingo foram a demonstração
disso mesmo.
Há seis anos atrás, Vasco Cordeiro, que ainda nem era Presidente do Governo, alertava para contrariarmos “a tentação, a que se assiste a nível nacional, de tentar reduzir a Autonomia à sua vertente constitucional ou estatutária, quando ela é muito mais do que estes aspectos formais”.
Pois o que vale lá para fora, também se aplica cá dentro.
Ponham os formalismos de lado e tratem de avançar para o terreno, junto das populações, procurando saber o que elas pensam desta reforma autonómica.
É preciso um referendo regional?
Pois que se faça. Que se ouçam os eleitores.
O mais provável é que não queiram ouvir o que o eleitorado tem
para dizer.
Há coragem, por exemplo, para saber se a população quer este
número de deputados?
Há coragem para saber se o eleitorado açoriano prefere este sistema de votar em partidos em vez de pessoas?
Já temos maturidade suficiente para elegermos listas abertas,
com a ordem dos eleitos a ser escolhida pelos eleitores e não pelos aparelhos dos partidos.
Está na hora de melhorarmos a proporcionalidade nesta região,
mesmo que isto custe o carmo e a trindade para algumas ilhas habituadas a privilégios de representação sem correspondência com a sua dimensão.
Mais: já é tempo de abrirmos à sociedade a possibilidade de
candidaturas de cidadãos independentes, quebrando este monopólio abafador dos partidos.
Como disse, em tempos, o constitucionalista Jorge Miranda, em
Ponta Delgada, a existência de candidatos a actos eleitorais por
grupos de cidadãos seria, até, uma forma de “elevar os partidos, de aumentar a qualidade dos seus candidatos, a sua responsabilidade, em vez de porem, às vezes, cinzentões que não têm nenhuma qualidade e capacidade de serem deputados da região ou do país”.
Sabemos que é uma questão delicada, mas ela não pode ser empurrada permanentemente para outras calendas, nem ficar fechada, por compromissos e cedências internas, entre as paredes de um hotel.
A realidade é que, durante anos, um quarto da população dos
Açores elegeu quase metade dos deputados.
A redução de deputados em número igual por ilha também não
é solução.
A realidade é esta: a Assembleia da República já teve 250 deputados, reduziu para 230 e já estipulou que poderá vir até aos 180.
A Madeira já teve 68 e, à semelhança de outros parlamentos
insulares, também reduziu.
Nós, nos Açores, somos uns iluminados e podres de ricos: somos os únicos que não só não reduzimos, como até aumentámos!
O nosso sistema eleitoral está desactualizado, desproporcional e não tem nada a ver com os tempos de hoje.”