crédito ambiental esgotado

é
Antigamente, que tanto pode ser no tempo dos nossos pais como no tempos dos pais deles, a vida era diferente. Uma constatação óbvia e parva, dirá a maioria senão todos o que começaram a ler este texto. Pois é! A vida era diferente, éramos mais poupados, mais conscientes do valor dos bens adquiridos e da necessidade de os preservar, a própria indústria fazia gala nos seus produtos “para a vida toda”.
Entretanto, o mundo mudou e os nossos hábitos “evoluíram”, somos mais exigentes, mais refinados na escolha, reclamamos protegidos por leis e associações de defesa do consumidor, mas, em boa verdade, nada disso trava o síndrome de novas aquisições que apoquenta o mundo dito civilizado onde somos compelidos a trocar o usado pelo novo. Esta “doença” dos tempos modernos tem um nome: Gear Aquisition Syndrome ou GAS, que servindo inicialmente para descrever comportamentos de aquisição compulsiva no setor tecnológico, aplica-se à sociedade s.l., dominada, como está, pela vertigem do consumo sem limites.
Se no passado a indústria fazia questão de fabricar produtos capazes de durar uma vida, hoje parece que funcionam por ciclos de média ou curta durabilidade.
Escrevo sobre este assunto por duas razões, uma de interesse próprio: a minha televisão avariou ao fim de menos de quatro anos de bom convívio cá em casa. Fomos felizes nos bons e nos maus momentos (ah, Benfica, Benfica!) até à imagem final. Chamados de urgência, os clínicos da coisa fizeram o diagnóstico e atiraram com um orçamento que quase me fez finar, e que não me deixa outra opção que não seja comprar um novo televisor. Com tudo o que de mau isso significa para a nossa pegada ambiental e para a minha economia doméstica; e a segunda e mais importante razão pelo comunicado dos ambientalistas da Zero que alertam para o facto de, no dia 7 de maio, os portugueses terem esgotado o seu plafond de crédito ambiental, seis dias mais cedo do que no ano passado. Ou seja, já estamos a consumir recursos do planeta que só deveríamos usar apenas a partir de 1 de janeiro de 2023. E aqui coloca-se a grande questão: como travar o despesismo ambiental e reduzir a nossa pegada ecológica?
Podemos pensar em múltiplas soluções, mas algumas até serão bem simples: reduzir o desperdício alimentar, reutilizar as águas domésticas, alterar hábitos de transporte regular, reduzir o GAS de forma urgente, reunir on-line ao invés de viajar, isto na perspetiva do cidadão e das empresas, já que, na perspetiva governativa, devemos exigir políticas adequadas, da agricultura aos transportes, das pescas à energia, e com caráter de urgência. Para isso servem também as verbas da ‘bazuca’.
(Paulo Simões – Açoriano Oriental de 08/05/2022)
May be a black-and-white image of 1 person, beard and indoor
1 share
Like

Comment
Share
0 comments