Views: 0
Conversas pandémicas XXXVIII – Os custos das Festas
No dia 29.12.2020, neste Jornal, na minha última crónica, escrevi:
«O Natal e o Ano Novo, são momentos para se ser muito rigoroso na implementação das medidas de contenção em curso, durante este período de estado de emergência.
Em momento algum deveremos baixar defesas nesta época. Deveremos manter as nossas “bolhas” familiares. Os almoços e jantares, por esta época deverão seguir todos os cuidados. O vírus contraído, de forma silenciosa, no jantar de amigos do dia 21, poderá ser transmitido aos que mais amamos no almoço do dia de Natal. E levar a um desfecho inaceitável daqui a poucas semanas.»
1. Sejamos claros: como colectivo, estivemos mal, muito mal, nestas Festas.
O que nos chega, através dos OCS são imagens de um país com o seu sistema de saúde à beira do colapso. Não há outra forma de o descrever. E, os números demonstram-no.
Com recursos extremamente limitados, próprios de um país pobre, Portugal apresenta um número de doentes em Unidades de Cuidados Intensivos superior ao de países com recursos muito superiores ao nosso.
A jusante, o número de mortos por COVID19 por milhão de habitantes, em Portugal, é superior ao de países como Israel ou a Noruega, e ao nível do da Alemanha, que, perante o acréscimo de mortalidade, adoptou medidas radicais para restrição de contactos entre a população.
Enquanto isso, iniciou-se a vacinação contra a COVID19 em Portugal, de forma muito mediática. O mediatismo não acelera um processo muito pouco célere, ao contrário do que podemos verificar em países como Israel.
Inevitavelmente há a destacar os Açores, onde a vacinação se iniciou pelo grupo onde mais vítimas encontramos, desta doença: os idosos, e em particular os idosos em lares. De destacar, pela sua Humanidade, e visão de Saúde Pública, a iniciativa do governo dos Açores.
2. Porque é que o confinamento geral (levado ao extremo com as cercas sanitárias, férreas, entre todos os concelhos) tem de ser a última das soluções?
Por que causa iatrogenia. Já o verificamos. Às mortes por COVID19 não podemos associar as mortes por doenças crónicas que deixam de ter acompanhamento, ou que carecem de atenção, por alguma descompensação, atenção que não é conseguida em tempo. Por isso, todas as medidas a adoptar para conter a disseminação do vírus têm de estar assentes num evidente custo-benefício. Sendo que, neste caso, quer o custo, quer o benefício, são em saúde, e vidas.
3. Medidas na Região Autónoma dos Açores
O Governo Regional dos Açores determinou a aplicação da renovação do estado de emergência determinado a nível nacional, implementando medidas restritivas para o território regional, de acordo com o nível de risco de transmissão verificado em cada concelho.
Assente na taxa de incidência da doença em cada concelho, e na tendência de crescimento do índice de risco de transmissão efetivo da doença (Rt) na Região Autónoma dos Açores, o governo tomou medidas de contenção, visando a diminuição do número de infetados. particularmente na ilha de S. Miguel. Medidas restritivas que levem ao decréscimo do número de infetados pelo vírus SARS-CoV-2, e a uma desaceleração do índice de risco de transmissão efetiva da doença (Rt).
O governo dos Açores elaborou um sistema de semáforos, associado ao nível de risco de transmissão verificado nos diferentes concelhos, de baixo risco, médio risco e alto risco. Os concelhos considerados de alto risco de transmissão (os que verifiquem mais de 100 novos casos por 100 mil habitantes), incluem actualmente os concelhos de Ponta Delgada, Ribeira Grande, Vila Franca do Campo e Lagoa. Como nas ilhas em que há mais do que um concelho, caso a situação de alto risco abranja 50% ou mais dos concelhos, as restrições são aplicadas a toda a ilha, em S. Miguel as restrições são aplicadas a toda a ilha. Desta forma, o governo determinou a obrigatoriedade de teletrabalho, nas atividades e funções em que tal seja possível, para os profissionais com mais de 60 anos e com doenças crónicas, o que exige que os responsáveis das empresas, e instituições, articulem com os serviços de Medicina do Trabalho, no sentido de tal se concretizar. Mas, foi determinada, também:
• a limitação de ajuntamentos em via pública de mais de 4 pessoas, exceto se forem do mesmo agregado familiar,
• o encerramento dos cafés e restaurantes às 15h00, sendo que durante esse período a capacidade por mesa é de 4 pessoas, salvo se do mesmo agregado familiar (a partir das 15h00, os cafés e restaurantes só podem funcionar em serviço de take away ou entrega ao domicílio),
• a implementação do ensino à distância para todos os níveis de ensino,
• a proibição de circulação na via pública entre as 23h00 e as 05h00, nos dias da semana, e a partir das 15h00 ao fim de semana,
• o encerramento do comércio local, e os centros comerciais, às 20h00 durante a semana, e às 15h00 ao fim de semana, com exceção das farmácias, clínicas, consultórios e bombas de gasolina.
Nos concelhos considerados de médio risco (entre 50 e 100 novos casos por 100 mil habitantes), as medidas serão menos restritivas, com o encerramento de cafés às 20H00 (excepto para efeitos de Take Away ou entrega ao domicílio), e a limitação até 6 pessoas, quer na via pública, como por mesa em restaurantes e bares.
Nos concelhos de baixo risco (menos de 50 novos casos por 100 mil habitantes, nos últimos 7 dias), são aplicadas medidas gerais de limitação de ajuntamentos e as medidas já em vigor na situação de calamidade.
A obrigatoriedade de utilização de máscara em espaços públicos, o controlo de temperatura corporal e a obrigatoriedade de testes de diagnóstico, mantêm-se.
Ao mesmo tempo a Vice-Presidência do Governo determinou o encerramento das respostas sociais sem alojamento da ilha de São Miguel, com o objetivo de evitar a circulação de pessoas e de assegurar a segurança e a saúde de todos os cidadãos, nomeadamente dos mais desprotegidos. Foram, pois, encerradas as creches e amas, jardins de infância, centro de atividades de tempos livres e centros de inclusão social, centros de atividades ocupacionais e centros de atendimento e acompanhamento social/pessoas com deficiência, transporte adaptado e centros de dia, no entanto mantendo a sua atividade de apoio e de proteção a este grupo de pessoas, sobretudo através dos seus serviços de apoio domiciliário.
Mario Freitas
Médico consultor (graduado) em Saúde Pública e Delegado de Saúde
(Diário dos Açores de 09/01/2021)
+2
17 comments
Like
Comment
Share