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SUMÁRIO EXECUTIVO
AVISO A BIDEN DE ASSASSÍNIO EM TEERÃO
A revelação do assassínio em Teerão de um alto dirigente da Al Qaeda, através de fuga de informação promovida por serviços secretos norte-americanos ou israelitas, é sinal de aviso a Joe Biden.
Abdullah Ahmed Abdullah foi morto a tiro em Agosto por agentes da Mossad ou mercenários estrangeiros a soldo de Israel em operação conjunta com os Estados Unidos, noticiou The New York Times na sexta-feira.
O atentado a tiro contra o líder da Al Qaeda, que custou também a vida à sua filha Miriam, viúva de Hamza bin Laden, ocorreu a 7 de Agosto quando ambos se deslocavam de automóvel num bairro do norte de Teerão.
A vingança serve-se fria
Essa sexta-feira marcava o aniversário dos atentados bombistas de 1998 contra as embaixadas dos Estados Unidos em Nairobi e Dar es Salam, que causaram 224 mortos, em que Abdullah esteve envolvido.
Conhecido pelo nom de guerre Abu Muhammad al Masri, Abdullah, nascido no Egipto em 1963, integrara o núcleo inicial da Al Qaeda na guerra contra a ocupação soviética do Afeganistão e, posteriormente, organizara acções terroristas na Somália e noutros países da África Oriental.
Em 2003, al Masri que se refugiara no Irão, foi detido pelas autoridades iranianas em Xiraz, no sudoeste do país, juntamente com outros membros da Al Qaeda.
Em data indeterminada passou a prisão domiciliária e, mais tarde, a liberdade vigiada, tendo assumido o nome de Habib Daoud, cidadão libanês, residente em Teerão.
Miriam, que usava o nome Mariam Daoud, casara em 2005, no Irão, com Hamza, um dos filhos de Osama bin Laden, que veio ser morto em operação anti-terrorista na região de fronteira entre Afeganistão e Paquistão em data não revelada, mas referenciável entre Janeiro de 2017 e Setembro de 2019, segundo declaração oficial da Casa Branca.
Com a morte de al Masri fecha-se praticamente o ciclo da primeira geração de militantes da al Qaeda, ignorando-se a sorte de Ayman al Zawahiri, o egípcio, actualmente com 69 anos, que sucedeu na liderança da organização após o assassínio de Osama em 2011.
Um favor interessado
A colaboração de Israel na captura ou eliminação de militantes da Al Qaeda procurados pela justiça norte-americana tem sido pontual e, nesta operação, a Mossad acedeu a colocar à disposição de Washington a sua rede de agentes, mercenários e infiltrados no Irão.
A prioridade para os serviços secretos israelitas é a sabotagem do programa militar nuclear do Irão e não a caça a elementos da Al Qaeda que Teerão alberga e mantém sob controlo para dissuasão contra possíveis ataques dos terroristas sunitas.
A revelação da colaboração da Mossad num atentado contra um alvo de escasso interesse para Israel, mas de grande valor simbólico para os Estados Unidos, surge como um sinal público para a administração Biden da identidade de interesses entre os dois estados.
Desencontro sobre o acordo
O presidente eleito pretende reverter a decisão de Donald Trump que, em Maio de 2018, apesar da oposição dos demais signatários — França, Reino Unido, Rússia, China, Alemanha, EU, Irão — denunciou o acordo de 2015 para suspensão por quinze anos do programa nuclear militar de Teerão.
A revisão das sanções impostas por Washington a Teerão e a empresas que mantenham negócios com o Irão implica, em primeiro lugar, que o Irão não viole os termos do acordo.
A Agência Internacional de Energia Atómica denunciou este mês, contudo, duas violações graves: a montagem de uma cascada de centrifugadoras em instalações subterrâneas na central de Natanz e a acumulação de urânio empobrecido acima do limite estipulado 2,4 toneladas.
Biden encontrará, por outro lado, forte resistência no Congresso e da parte dos aliados no Médio Oriente, sejam israelitas ou sauditas, para negociar um compromisso.
Em cima da mesa teriam de estar os interesses iranianos no Iraque, Síria, Líbano, Iémen, garantias mútuas de segurança no Golfo Pérsico e no Mar Cáspio, além de limites ao desenvolvimento por Teerão de mísseis de médio e longo alcance potencialmente portadores de ogivas nucleares.
A negociação está, além disso, condicionada pela campanha para a presidência da República Islâmica que culminará em Junho do próximo ano com a escolha do sucessor de Hassan Rouhani e a possibilidade da quarta eleição legislativa em Israel desde Abril de 2019.
A chantagem dos colonatos
Apesar da pública oposição de Biden, Benjamin Netanyahu prossegue a expansão dos colonatos israelitas, tendo sido aberto concurso este domingo para a construção de mais 1 257 residências em Givat Hamatos, numa zona de Jerusalém Oriental que cortará o acesso a Belém.
A presença, ilegal à luz do direito internacional, de cerca de 400 mil colonos na Cisjordânia, além dos 200 mil judeus israelitas residentes em Jerusalém Oriental, é facto incontornável e sucessivos governos jogam com autorizações de expansão residencial para obter concessões de Washington.
No estilo e nas concessões à expansão territorial Biden não será tão complacente e conivente com Netanyahu como Trump, mas à maioria dos decisores em Washington e Jerusalém importa que o presidente eleito assegure a continuidade de uma parceira estratégica.
Ao assinalar desde já que a aliança de segurança se funda na contenção do Irão, o mais perigoso inimigo de Israel, a revelação de um assassínio em Teerão serve o seu propósito.
barradas.joaocarlos@gmail.com
jornalista
assina esta coluna semanal à terça-feira no Jornal de Negócios

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